A pandemia de covid-19 acelerou e pôs a nu uma série de tendências de exploração e dominação do capitalismo contemporâneo digitalizado. É sobre esse tema que a nova edição da Margem Esquerda se dedica. O primeiro texto do dossiê de capa, escrito pela socióloga Mariana G. Valente e por João Alexandre Peschanski, faz um panorama da "colonização da internet" por grandes corporações e apresenta formas de resistência e alternativas ao sistema dominante. O cientista político Sergio Amadeu analisa a acumulação de capital no contexto de digitalização da economia e de consolidação de um mercado global de dados. Em seu texto, o cientista social Rafael Grohmann apresenta linhas mestras de pesquisa sobre plataformização e ação coletiva no mundo do trabalho. A comunicadora social Amanda Chevtchouk discute o papel dos algoritmos, os mecanismos de base do funcionamento da internet dominada por grandes empresas, na moldagem de interesses e na constituição ideológica dos usuários da rede.
O Número traz ainda três ensaios de fôlego que aprofundam as temáticas do dossiê. Ludmila Abílio parte do breque dos APPs durante a pandemia da covid-19 para analisar o fenômeno da uberização do trabalho no capitalismo contemporâneo, salientando o que há de novo e o que há de velho nas armadilhas do autogerenciamento e do governo da “viração”. Na sequência, Jodi Dean oferece um espantoso panorama das tendências “neofeudalizantes” do capitalismo contemporâneo digitalizado e financeirizado. Por fim, Evgeny Morozov examina as formas pelas quais o Big Tech e o neoliberalismo minam a democracia, e se pergunta sobre as potencialidades de se pensar em um “socialismo digital” para o século XXI.
O entrevistado desse Número é ninguém menos que o ex-presidente uruguaio Pepe Mujica, que conversou com Emir Sader e Felipe Queiroz. Em diálogo com a entrevista, uma segunda trinca de artigos se debruça sobre a conjuntura latino-americana: a pensadora argentina Beatriz Rajland faz um panorama afiado da dinâmica política do continente, Maria Kubik Mano se debruça sobre o saldo eleitoral brasileiro de 2020 sob a perspectiva de gênero; e o historiador chileno-brasileiro Horacio Gutiérrez nos brinda com uma reconstrução do imaginário político da revolta chilena por meio dos grafites e das intervenções artísticas de rua. Fechando a seção, Taylisi Leite faz uma Introdução à obra de Roswitha Scholz e Fabio Mascaro Querido analisa a literatura do paraense Edyr Augusto sob as lentes da crítica cultural marxista.
Em homenagem aos 150 anos da comuna de paris, o sociólogo franco-brasileiro Michael Löwy recupera e comenta um precioso manifesto do comitê central da União das Mulheres escrito em 1871; e nosso editor de poesia Flávio Wolf de Aguiar traduz e apresenta a poética de Clovis Hugues em seu Hino à Comuna. Ainda no rol das homenagens, José Paulo Netto escreve sobre o cantor Carlos do Carmo, fadista comunista que nos deixou no início de 2021. E por ocasião dos 50 anos de morte de György Lukács, Arlenice Almeida traduz e apresenta um texto inédito do filósofo húngaro sobre estética e política.
A edição conta também com resenha de Marcelo Braz sobre Marx: uma biografia, de José Paulo Netto e seção notas de leitura de Maria De Lourdes Rollemberg e Jones Manoel. O ensaio visual que atravessa as páginas da revista, de capa a capa, é de Guto Lacaz, com curadoria e comentário de Francisco Klinger Carvalho, editor de arte da revista.