“A lua é a favor da Palestina”: Adelaide Ivánova traduz Summer Farah
Foto: hosny salah (Pixabay).
Por Summer Farah
Tradução e comentário: Adelaide Ivánova
No dia 29 de outubro de 2000, uma criança Palestina chamada Faris Odeh, então com 14 anos, ficou frente a frente a um tanque israelense em Gaza e contra ele jogou uma pedra. Era a Segunda Intifada contra a ocupação israelense.
Odeh começou a faltar à escola para atirar pedras em tanques israelenses, apesar de seus pais fazerem tudo o que podiam para impedi-lo. Sua mãe, Anam Odeh, mais tarde lembrou: “ele tinha medo de que, se fosse filmado pela TV, seu pai o visse, então ele fugia das câmeras. Um dia, depois que eu o arrastei para longe dos confrontos, sete dias seguidos, eu disse a ele: ‘Ok, você quer atirar pedras? Tudo bem. Mas pelo menos se esconda atrás de alguma coisa! Por que você tem que estar bem na frente?’ E ele disse: ‘Porque eu não tenho medo'”.
Dez dias depois, em 8 de novembro de 2000, Faris estava morto. Tinha ido novamente atirar pedras contra as tropas da ocupação israelense, quando foi baleado no pescoço. Os soldados israelenseses deixaram o menino sangrando, no chão. Ele foi baleado tão perto do tanque que seus amigos não conseguiram socorrê-lo, e só conseguiram chegar perto do corpo uma hora depois. Ele foi declarado morto na chegada ao hospital.
Passaram-se 24 anos do assassinato do menino Faris pelo estado de Israel. 24 anos depois do assassinato dessa criança, Israel segue matando crianças na Palestina — e agora também no Líbano. Segundo relatórios da ONU, desde que iniciaram os ataques no Líbano, em 2024, Israel conseguiu matar uma criança por dia. Isso, somado às incontáveis mortes de crianças na Palestina desde outubro de 2023, provavelmente faz de Israel a quarta causa de morte violenta de crianças no mundo. Para chegar a essa estimativa, levou-se em conta dados de 2021 do Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME), depoimentos dos médicos em Gaza, publicados no New York Times em 2024, e dados do Gabinete Central de Estatísticas da Palestina, reunidos pela ilustradora Mouna Chalabi neste gráfico, publicado pelo coletivo Vozes Judaicas Pela Paz:
Esta tradução do poema de Summer Farah, poeta palestina nascida nos EUA, é dedicada a cada criança brasileira morta pela polícia militar, pelo latifúndio e pela mineração, para cada criança palestina morta pelo governo de Israel. Faris Odeh, presente!
A lua é a favor da Palestina, Summer Farah (trad. Adelaide Ivánova)
Em 11 de abril de 2019, Israel envia uma sonda espacial para a lua. A sonda explode no impacto.
NASCIDA do Espaço Sagrado, a lua é irmã
da pedra. conhece cada defesa suave
destruindo o Solo ocupado. Solo
Sagrado. ela sussurra histórias de como construímos
nossas casas/colocando pedras umas sobre as outras, delicadamente,
dabke * duras no solo
enviando histórias de como as crianças veem se pedras,
também, flutuam no mar morto.
israel envia uma sonda espacial para a lua, a sonda explode no impacto.
OUÇA. a lua é a favor da Palestina.
lua lembra quando ela era parte da terra / lembra quando a terra era uma / crateras cheias de água esperando para serem chamadas de sagradas / um povo que sabe o que sempre foi, cuidando de pomares com raízes retorcidas mais velhas que o nível do mar / orações cantadas participam dos cafés da manhã com pão e queijo / gargantas intactas / chamando nossas filhas / ya ‘amar ya ‘amar ya banat al ‘amar / pedindo de nós beleza / força
a terra sagrada envia histórias de crianças / agarrando pedras com tanta força que suas linhas de vida se tornam anéis de granito.
Crianças arranhando o império / criminalizadas. o que é uma mancha para um império? máquinas de morte feitas pelo homem despencam na superfície da lua / arranham pela conquista.
ó solo sagrado. aqueles que nos separaram não serão perdoados.
não há mancha em sua luz. em elogio às crianças que se juntaram às estrelas
ela revida.
Você pode ouvir esse poema sendo lindo pela própria Summer Farah, aqui.
Nota
* Dabke (em árabe دبکة) é uma dança popular do Oriente Médio, especificamente Palestina, Líbano e Síria.
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Adelaide Ivánova é pernambucana, poeta e organizadora comunitária da campanha Deutsche Wohnen und Co. Enteignen, que luta pela expropriação de grandes empresas do aluguel em Berlim, onde mora desde 2011. Publicou, entre outros livros, Asma (Nós, 2024), Chifre (Macondo, 2021) e o martelo (Douda Correria, 2015; Garupa, 2017). Este último, livro de poesia documental que investiga a re-traumatização causada por um processo judicial por estupro, venceu em 2018 o prêmio Rio de Literatura na categoria poesia. Mantém a newsletter vodca barata.
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