Por que a esquerda não entende o identitarismo?

A luta que parte de uma identidade fantasmagórica dada pelo modo de gestão não é, não foi e nunca será equivalente ao identitarismo.

Por Douglas Barros

1 – O identitarismo se tornou o bode expiatório de uma parte da esquerda que atribui às lutas antirracista, feminista e LGBTQIAPN+ a culpa pelo avanço da direita.

2 – Confundindo identidade com prática governamental de gestão identitária da diferença, a esquerda, impotente diante do capitalismo de crise atual, reforça sua fragmentação.

3 – Ao não levar em consideração que a forja da identidade se organiza no processo de administração do capital, a partir do que sobrou da escravidão colonial, essa esquerda não visualiza o fato de que grupos foram identitarizados a partir da exclusão, opressão e desigualdade próprias à sociedade de classes do capitalismo.

4 – O identitarismo é um fenômeno de gestão no capitalismo pós-fordista. Entretanto, as lutas contra a opressão e a desigualdade não podem ser reduzidas a ele.

5 – Como técnica de gestão, a fragmentação das demandas particulares de grupos de “pertencimento” tem efetivado uma verdadeira judicialização administrativa que reduz política a técnica de governo e visa dissuadir a insurgência dos excluídos.

6 – O identitarismo é justamente o esvaziamento da potencialidade das identidades dissonantes, é a tentativa governamental de administrar identidades que demonstram a verdade de um “universal” marcado pela exclusão da diferença.

7 – Esse falso universal convoca o silenciamento da luta efetivamente política. É um universal ultra-identitário, para lembrar Achille Mbembe, já que para se pôr teve que negar a diferença e instrumentalizá-la como inferioridade. O caso do Vini Jr. é um exemplo fundamental desse silenciamento em nome da universalidade do futebol.

8 – A luta que parte de uma identidade fantasmagórica dada pelo modo de gestão não é, não foi e nunca será equivalente ao identitarismo.  


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O que é identitarismo?

Na interpretação original do psicanalista Douglas Barros, o termo nomeia sobretudo uma forma de gestão da vida social contemporânea que engole esquerda e direita. Com um olhar da periferia do capitalismo sobre a colonização, Douglas revisita, pelo prisma da identidade, o surgimento e desmonte do sujeito, do Estado e do capitalismo modernos para jogar luz sobre os impasses da política contemporânea.

O livro de Douglas Barros tem prefácio de Rita von Hunty, orelha de Deivison Faustino, quarta capa de Christian Dunker e Maíra Moreira Marcondes e capa de Mateus Rodrigues.

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Douglas Rodrigues Barros é psicanalista e doutor em ética e filosofia política pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Professor filiado ao Laboratório de experiências coloniais comparadas, ligado ao Instituto de História da Universidade Federal Fluminense (UFF). Professor na pós-graduação em filosofia da Unifai. Investiga principalmente a filosofia alemã conjuntamente com o pensamento diaspórico de matriz africana e suas principais contribuições teóricas no campo da arte e da política. Escritor com três romances publicados, também é autor dos livros Lugar de negro, lugar de branco? Esboço para uma crítica à metafísica racial (Hedra) e Hegel e o sentido do político (lavrapalavra).

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