O racismo e o sistema de justiça criminal

Confira a apresentação de Ana Luiza Pinheiro Flauzina à obra "A nova segregação: racismo e encarceramento em massa", de Michelle Alexander, que consta na lista dos cem melhores livros do século.

Por Ana Luiza Pinheiro Flauzina

A Diáspora Negra é, acima de tudo, uma sensação. As teorias, as imagens e o que quer que tente captar essa dispersão de corpos provocada pela sentença da escravidão são esforços de dar inteligibilidade a algo que é, em seu âmago, sentimento. Pessoalmente, foi a dor que me apresentou a esse movimento pulsante de jeitos, de sentidos, de horizontes.

Havia chegado aos Estados Unidos havia menos de um mês, levando na bagagem um misto mal dosado de insegurança e expectativas. Como parte da programação daquele primeiro semestre, estava prevista uma visita a um estabelecimento prisional, da qual tomei parte com certa desconfiança. Hoje, me recordo apenas tangencialmente da longa viagem até o presídio, da palestra do agente penitenciário, que nos recebeu com performance de guia turístico, e da frieza das instalações. Apesar de a neblina embaçar minha memória, há algo que permanece muito vivo na minha sensibilidade: a impressão de ter me encontrado naquele lugar. Aquele depósito estéril de corpos negros me fez sentir em casa por um breve momento. Foi na prisão que experimentei o primeiro ponto de contato real entre Brasil e Estados Unidos.

A leitura do texto de Michelle Alexander evocou esse momento. Ao desnudar o que considera um novo sistema de castas, estruturado a partir do encarceramento em massa nos Estados Unidos, a obra não só permite acessar as entranhas da falácia da democracia estadunidense como espelha dilemas muito familiares vivenciados ao sul da linha do Equador. Diante do grande fôlego do trabalho e de sua latitude argumentativa, destaco alguns aspectos que dialogam de forma íntima com as dinâmicas das relações raciais no Brasil. O maior mérito do livro é, sem dúvida, reposicionar o racismo em sua relação com o sistema de justiça criminal. A perspectiva de Alexander foge às análises convencionais, invertendo a retórica que torna o racismo um subproduto das práticas do controle penal. De forma clara e direta, a autora nos mostra que o sistema de justiça criminal é, em verdade, um dos produtos diletos do racismo.

Assim, temos a oportunidade de visualizar o encarceramento em massa no lastro da narrativa histórica dos Estados Unidos, que tem o controle e a submissão da população negra como seu principal mote. Entende-se que há uma produção simbólica, um sentido atrelado à raça, que vai se sofisticando e se sedimentando no tempo. Ao se falar em escravidão, na segregação racial e na prisão, pensa-se fundamentalmente no corpo negro. É a corporeidade negra, portanto, o dado constante na retórica do terror, transmutando-se apenas as estruturas formais de controle. Sem alterações substantivas, a antinegritude vige como a métrica basilar das dinâmicas políticas e sociais do país.1

É a partir dessa premissa que o estudo nos convida a olhar para a edificação de um programa de criminalização de homens negros nos Estados Unidos, que tem na Guerra às Drogas o principal suporte de sua atuação. Forjado durante o governo de Ronald Reagan, na década de 1980, esse projeto consolidou-se como um mecanismo de dominação sem precedentes. Alexander exibe estatísticas pormenorizadas, casos reveladores, leis obscenas. Somos apresentados a uma realidade familiar de militarização e abusos da polícia, segregação espacial, fragilidade das defensorias públicas. Os seriados de TV de “lei e ordem”, que projetam a eficiência do sistema de justiça criminal estadunidense, vão sendo desmentidos a cada nova denúncia, e em seu lugar vai se desenhando a brutalidade de um aparato de controle que se alimenta diuturnamente de carne negra.

O perfil racializado do sistema é exposto na participação efetiva do Legislativo, com a imposição de sentenças mínimas diferentes para drogas com a mesma composição química, como o crack e a cocaína; na legitimação da seletividade policial na revista de “suspeitos”; na alta discricionariedade conferida à Promotoria de Justiça, que sela infindáveis acordos perversos. Percebe-se que, num sistema vocacionado para incriminar a qualquer custo, o terror racial negocia a liberdade de forma restritiva para quem, no dizer de Abdias do Nascimento, deve cumprir pena fundamentalmente pelo “delito de ser negro”.2

Um dos aspectos mais instigantes levantados pela autora é o da participação direta do Judiciário na instituição do encarceramento em massa. O posicionamento austero da Suprema Corte indica uma forte adesão à plataforma de contenção e controle das comunidades negras. Das paradas e revistas policiais, passando pela negociação de acordos de transação penal, até o sentenciamento, a Corte firmou precedentes que validam a discriminação e, assim, servem de sustentáculo à política de Guerra às Drogas. A Corte, é importante registrar, tem endossado inclusive os efeitos pós-condenação, que acabam por inviabilizar a integração social dos ex-encarcerados. Nesse tocante, o aval judicial estende-se, em muitos estados, a discriminações no acesso ao mercado de trabalho, perda do direito ao voto, da carteira de motorista e mesmo de acesso a benefícios sociais.

O que se apreende da leitura é o caráter determinante da chancela do Judiciário para a difusão de uma leitura extremamente distorcida da atuação do sistema de justiça criminal nos Estados Unidos. Num momento histórico em que as declarações abertas de racismo são rechaçadas, prevalecendo a retórica da “neutralidade racial”, a Justiça confere ao sistema uma aparência de solidez e isonomia. Trata-se da confirmação do caráter legalista do racismo estadunidense, em que a vida negra vai sendo minada por dentro das amarras do sistema.

O foco projetado no Judiciário mostra a premência de atentar para essa variável na análise das entranhas do controle penal no Brasil. Deve-se registrar que, aqui, os dilemas das comunidades negras estão conectados a uma guerra que sangra nos corpos de sua juventude e na intensificação vertiginosa do encarceramento, que ocorre sem maiores censuras.

Ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos, a precariedade das estruturas do sistema de justiça criminal brasileiro não deixa dúvidas sobre a ilegalidade de suas práticas. As denúncias diuturnas de prisões flagrantemente arbitrárias, de torturas sistemáticas dentro e fora do cárcere, da corrupção e da extorsão como dados da atividade policial, de grupos de extermínio atuantes com a chancela do Estado, de cabeças rolando em massacres prisionais gerados pela omissão institucional, bem como de tantos outros vilipêndios que integram a rotina da segurança pública no país, compõem um quadro que só pode ser explicado pela intensa naturalização social do racismo, com o profundo desprezo à vida negra.

Assim, se é impossível blindar o sistema da constatação de seu apetite flagrantemente genocida pelo acesso real aos corpos, é preciso garantir a aparência da democracia nos gabinetes. A seara do Judiciário quer, portanto, projetar-se como o norte civilizatório, limitador da barbárie que se processa apesar de sua atuação, nunca em razão dela. Entretanto, como nos mostra Alexander, essa esfera do poder também está fortemente comprometida na consolidação do racismo e das práticas que desencadeiam o extermínio e o encarceramento desenfreado nos trópicos.

Em estudo recente, Salo de Carvalho aponta para algumas dessas dimensões. Lembra, por exemplo, que o Supremo Tribunal Federal (STF) levou quinze anos para declarar a inconstitucionalidade do dispositivo da Lei dos Crimes Hediondos que determinava o cumprimento da pena em regime integralmente fechado.3 É nesse período, sublinha o autor, que a “curva do encarceramento nacional passa a ser constantemente ascendente”.4 No que tange à política de drogas, o STF omite-se em delimitar de forma clara os critérios de diferenciação entre consumo e tráfico previstos na Lei n. 11.343/06. Essa zona cinzenta na aplicabilidade da lei, diretamente sustentada pela falta de diretrizes do tribunal, tem sido instrumentalizada para a reprodução da seletividade e as alarmantes taxas de encarceramento que, no Brasil, têm as mulheres negras como alvo principal na última década.5

Além do nítido envolvimento do Judiciário nacional com as práticas de encarceramento, há que se considerar seu papel nos processos de extermínio da juventude negra em curso. Importante lembrar que o histórico registro das execuções sumárias perpetradas pelas polícias como autos de resistência6 era, até muito recentemente, confirmado pelo imediato pedido de arquivamento do caso pelo Ministério Público e pela chancela judicial. Nesse ciclo bem orquestrado, milhares de vidas foram reclamadas sem qualquer censura ou responsabilização dos agentes que praticaram os homicídios. Nesse processo, apesar de a atuação brutal da polícia ser noticiada como responsável pela produção em série de mortes, é na assepsia dos tribunais de justiça que as certidões de óbito são sacramentadas.

A anuência do Judiciário é, portanto, decisiva para a conformação da cultura punitiva de caráter racista que parece se incrementar cada vez mais, ao norte e ao sul do Equador. Ao fim e ao cabo, a consolidação de formas de operar tão brutais dos sistemas de justiça criminal só se justifica pela existência de uma perspectiva que exclui a dor negra do horizonte ético. Seja no lastro da democracia estadunidense, que incorpora as práticas discriminatórias de forma legalista, seja pelas vias mal-acabadas de uma institucionalidade que chancela a barbárie, como no caso brasileiro, o que se percebe é que os corpos negros são geridos por políticas de Estado que os tomam como fungíveis, descartáveis.7 É essa a realidade que o trabalho de Alexander ajuda tão bem a iluminar.

Se a obra é relevante por expor a ferida aberta da movimentação abusiva do sistema de justiça criminal nos Estados Unidos, torna-se ainda mais importante ao implicar a militância negra na manutenção desse estado de coisas. De forma franca e corajosa, a autora questiona o papel que as políticas de ações afirmativas têm cumprido na falta de adesão das principais entidades de direitos civis ao enfrentamento do encarceramento em massa no país.

Alexander pondera que as batalhas por justiça racial nos Estados Unidos estiveram historicamente conectadas a iniciativas de organização popular e mobilização da opinião pública. Entretanto, especialmente depois da cruzada que se inaugurou com o caso Brown versus Board of Education [Conselho de Educação] e dos esforços para a implementação da Lei dos Direitos Civis de 1965, a judicialização dos casos passou a ser vista como o centro da luta.

O empoderamento de advogados como protagonistas dos pleitos por igualdade teve como consequência a desradicalização do movimento. Desde então, observa-se uma postura tímida das entidades de direitos civis no combate ao encarceramento em massa, ligada, de acordo com a autora, ao litígio em torno das ações afirmativas. Essas, sustenta Alexander, converteram-se numa espécie de “suborno racial” para as elites negras dos Estados Unidos, produzindo uma “diversidade racial cosmética” que não altera as estruturas de poder. Ao contrário, a apropriação distorcida das políticas tem contribuído para o enfraquecimento da consciência racial, consolidando um falacioso “mito do progresso negro”. Nessa dinâmica, o reclame da vida da massa negra é garantido com a condescendência de segmentos expressivos da militância elitizada.

A postura crítica da autora em relação ao papel das políticas de ação afirmativa nos Estados Unidos merece ser analisada à luz do contexto brasileiro. Isso porque, dada a intensa resistência à implantação de tais políticas no Brasil, é previsível a apropriação oportunista do argumento de Alexander com o objetivo de descredenciar os esforços de inclusão em curso.

Nesse tocante, cabe situar que as políticas de ação afirmativas são estabelecidas com sinais invertidos nos dois países em questão. Enquanto nos Estados Unidos se estabelecem ações afirmativas como forma de responder ao racismo abertamente declarado, inaugurando-se um novo momento social e político que tem por base a noção da “neutralidade racial”, no Brasil as políticas vêm ajudar a romper o mito da democracia racial, que historicamente nega a própria existência de racismo no país.

Aqui, é importante pontuar que a mudança da narrativa sobre as relações raciais no Brasil fomentada pela implementação das ações afirmativas se deu, em grande medida, porque essas pautaram uma discussão não circunscrita à denúncia do sofrimento negro, politizando diretamente os privilégios da branquitude. Foi em nome da defesa de seus privilégios, portanto, que as elites se expuseram, quebrando o silêncio histórico em torno da questão racial no país.

A leitura do texto de Alexander nos indica que as ações afirmativas têm custado exatamente esse silenciamento pervertido à disputa das relações raciais nos Estados Unidos. A recente noção de “neutralidade racial”, evocada como forma de censurar a politização do racismo, é o mesmo remédio historicamente amargado no contexto brasileiro. No que tange à capacidade de mobilização social, portanto, as ações afirmativas têm um significado específico no Brasil, consolidando-se como o desafio mais contundente à retórica da democracia racial da última década.

Apesar das diferenças de fundo entre o processo de implementação das políticas de ação afirmativa nos dois países, as críticas formuladas por Alexander ressoam com preocupações já levantadas por pesquisadores e militantes no contexto brasileiro. Nesse tocante, Edson Lopes Cardoso lembra que é possível promover políticas públicas de igualdade racial sem que se enfrente o racismo verdadeiramente.8 Com isso, o autor chama atenção, assim como Alexander, para o fato de que as ações afirmativas são uma disputa por aportes epistemológicos, por fazeres políticos diferenciados que imprimam uma nova digital no cenário social do país. Se a presença de pessoas negras nas estruturas de poder é um dado da justiça racial, ela não indica, em si, a desmobilização dos aportes do racismo profundamente arraigados nas equações políticas hegemônicas.

Diante dessa dura constatação, a autora nos provoca a pensar que, apesar de sua importância, as políticas de ação afirmativa não devem ser tomadas como a medida central para calcular avanços em termos de igualdade racial, devendo-se levar em conta o direito à liberdade e à vida como parâmetros fundamentais.

Esse lembrete parece encapsular o centro nervoso dos conflitos raciais na Diáspora. Afinal, nessa complexa teia política, as pautas de “inclusão” coabitam com as demandas históricas por controle e expropriação do segmento negro. É essa equação que torna possível a eleição do presidente negro conviver em harmonia com a obscenidade do encarceramento em massa nos Estados Unidos, assim como o pacote de políticas de promoção de igualdade racial no Brasil caminhar ao lado de taxas de homicídio de jovens negros no país. Ao fim e ao cabo, o grande item inegociável da agenda das elites é o direito de decretação da morte física e social da massa vulnerável, sendo o racismo a pedra angular dessa sentença executada diuturnamente nas Américas.9

Como se pode perceber, A nova segregação: racismo e encarceramento em massa é trabalho que incita reflexões profundas. Ao retratar a situação-abismo impressa pela Guerra às Drogas nas comunidades negras dos Estados Unidos, a obra presta o enorme serviço de deslocar o racismo estadunidense desse lugar quase acessório que tem ocupado na percepção internacional. A narrativa nos permite compreender que a realidade brutal do encarceramento nada tem a ver com a miragem ilusória da experiência negra opulenta no país. Quebra-se o engodo de que os negros estadunidenses são a “carne de segunda” mais bem tratada do mundo; de que sua humilhação se redime pelo consumo; de que se alimentam com abundância e regozijo dos restos da mesa farta do poder.

A obra rompe com a publicidade que camufla a miséria, e ficamos apenas com a dureza das constatações do que é real: a verdade de que o racismo extorque por onde passa, cobra vidas a rodo, trucida potenciais e sonhos sem remorso. Esse espelho sem rachaduras aproxima realidades na Diáspora – aqui sintetizada como dor – que carregam mais semelhanças do que diferenças. Enganam-se, entretanto, os que acreditam que isso é tudo o que somos, que os limites da vida nos transformam em agonia pura, que as lágrimas são as águas que calam mais fundo no repertório da nossa sobrevivência. Se o presídio foi o primeiro reflexo do Brasil que enxerguei a contragosto em solo estadunidense, a melodia da resistência foi o que me ensinou o sentido da Diáspora profunda, que irmana os que são destinados a tombar a sós. Foi um inusitado show de Gilberto Gil no Texas, que saboreei outros gostos dessa irmandade. Lembro-me de um acorde. De uma transição genial de Gil, que nos embalava num forró nostálgico de Luiz Gonzaga e, sem pausas, peso ou ruído, nos levou a um reggae encantado de Bob Marley. Naquele desenho efêmero e generoso, Austin, Kingston e Recife eram negras, eram fortes, eram comunhão.

A mesma comunhão de que nos fala Michelle Alexander ao convocar para um enfrentamento firme e não apologético do racismo nos Estados Unidos, ecoando os mesmos sons das trincheiras brasileiras. Acompanhando a melodia que a autora nos convida a entoar, resta-nos encarar com lucidez as encruzilhadas da Diáspora da dor, cientes de que a resistência negra é força inesgotável que nos faz ser o que somos: fortes apesar da dureza dos grilhões, altivos apesar das marcas das chibatas, conectados apesar das profundezas dos oceanos.


Publicada originalmente em 2010, A nova segregação vendeu mais de 600 mil exemplares e permaneceu na lista de mais vendidos do The New York Times por mais de 150 semanas. O livro desafiou a noção de que o governo Obama assinalava o advento de uma nova era pós-racial e teve um efeito explosivo na imprensa e no debate público estadunidense, acumulando prêmios e inspirando toda uma geração de movimentos sociais antirracistas.

A edição brasileira tem tradução de Pedro Davoglio, apresentação de Ana Luiza Pinheiro Flauzina, orelha de Alessandra Devulsky, revisão técnica e notas de Silvio Luiz de Almeida. Ao analisar o sistema prisional dos EUA, Alexander fornece uma das mais eloquentes exposições de como opera o racismo estrutural e institucionalizado nas sociedades ocidentais contemporâneas.

Para a autora, o encarceramento em massa se organiza por meio de uma lógica abrangente e bem disfarçada de controle social racializado e funciona de maneira semelhante ao sistema “Jim Crow” de segregação, abolido formalmente nos anos 1960 após o movimento por direitos civis nos Estados Unidos. Não é à toa que este país possui atualmente a maior população carcerária do mundo (com o Brasil pouco atrás, em 4º lugar, depois da China e da Rússia).


Notas
1 A esse respeito, ver João Vargas, “Desidentificação: a lógica de exclusão antinegra no Brasil”, em Osmundo Pinho e João Vargas (orgs.), Antinegritude: o impossível sujeito negro na formação social brasileira (Cruz das Almas, EDUFRB, 2016), p. 13-30.
2 Elisa Larkin Nascimento, Abdias do Nascimento (Brasília, Senado Federal, 2014, col. Grandes Vultos que Honraram o Senado), p. 287.
3 Salo de Carvalho, “O encarceramento seletivo da juventude negra brasileira: a decisiva contribuição do poder judiciário”, Revista da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n. 67, jul.-dez. 2015, p. 623-52.
4 Idem.
5 Ibidem, p. 632-3.
6 Como reação às pressões sociais, uma resolução conjunta do Conselho Superior da Polícia Federal e do Conselho Nacional dos Chefes da Polícia Civil, publicada em 4 de janeiro de 2016 no Diário Oficial da União, aboliu o uso dos termos “auto de resistência” e “resistência seguida de morte” dos boletins de ocorrência e inquéritos policiais em todo o território nacional. Apesar de determinar o estabelecimento de novos parâmetros para a investigação de homicídios praticados por policiais, na prática não houve mudança substantiva na forma de processar os fatos. Para uma abordagem mais aprofundada sobre os autos de resistência, ver Michel Misse, Autos de resistência: uma análise dos homicídios cometidos por policiais na cidade do Rio de Janeiro (2001-2011). Relatório de pesquisa, jan. 2011. Disponível em: <www.pm.es. gov.br/download/policiainterativa/PesquisaAutoResistencia.pdf>.
7 Frank Wilderson III, “Gramsci’s Black Marx: Whither the Slave in Civil Society?”, Social Identities, v. 9, n. 2, 2003, p. 225-40.
8 Sobre esse e outros temas relacionados às demandas políticas da população negra no Brasil, ver Edson Lopes Cardoso, Negro, não: a opinião do jornal “Irohin” (Brasília, Brado Negro, 2015).
9 Para uma discussão aprofundada sobre as estruturas da necropolítica que assola as comunidades negras, ver Achille Mbembe, “Necropolitics”, Public Culture, v. 15, n. 1, 2003, p. 11-40.


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Ana Luiza Pinheiro Flauzina é professora adjunta da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (Faced-UFBA), doutora em direito pelo College of Law da American University de Washington e pós-doutora pelo African and African Diaspora Studies Department da Universidade do Texas em Austin. Entre outros livros, é autora de Corpo negro caído no chão: o sistema penal e o projeto genocida do Estado brasileiro (Rio de Janeiro, Contraponto, 2008).

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