Michael Heinrich e a revisão de discursos sacralizados

Sem recorrer ao “supertrunfo” da dialética, Michael Heinrich nos introduz à crítica da economia política, programa que, ao minar a autoevidência das ciências econômicas, aprofunda a teoria do conhecimento com uma pesquisa das relações sociais capitalistas.

Por Guilherme Leite Gonçalves

Nova leitura de Marx? Michael Heinrich não nos oferece mais uma introdução a O capital. Por óbvio, sua pretensão é apresentar o projeto marxiano de investigação do capitalismo e orientar primeiras – e tantas outras – aproximações. Algo, aliás, essencial: a maior obra de Marx não é simples. São três volumes com a profundidade conceitual adequada ao tamanho do impacto que provocou no conhecimento humano. Só não se assusta com O capital quem tem pré-compreensões automáticas, para o bem ou para o mal. Heinrich se incomoda com todas, sobretudo com as introduções concebidas pelo “marxismo enquanto visão de mundo”. Nelas, se multiplicam citações ao “materialismo dialético” para, ao fim e ao cabo, dizer que, embora a relação entre classes seja contraditória, a história é linear e teleológica.

Michael Heinrich elabora outra introdução. Em seu centro, está a oposição à leitura de Engels, ou melhor, ao engelsianismo, a assim chamada interpretação historicista, que associa cada fragmento de O capital a uma etapa determinada do desenvolvimento social. Heinrich desafia radicalmente essa perspectiva ao sustentar que o objetivo de Marx é uma apresentação teórica do capitalismo com base em categorias históricas. O que isso significa?

Em primeiro lugar, a análise da ordem capitalista é delimitada em sua “média ideal”, apreendendo as estruturas gerais sem se ater a processos particulares. Uma macroapresentação? Sem dúvida. A introdução de Heinrich se descola do conteúdo concreto da luta de classes e trabalha com o conceito de fetichismo. Marx, com isso, não é idealizado, mas tratado como um crítico da socialização mediada pelo valor. Isso nos leva a O capital sem economicismos: ele só é soma de dinheiro porque é sociedade. Mas também nos leva do Livro I ao Livro III. A introdução de Heinrich não para nos primeiros capítulos sobre a produção de mercadoria. Nesse sentido, ela inova e nos permite chegar plenamente à teoria do valor, isto é, até suas formas monetárias mais avançadas. É, assim, uma introdução atual, necessária para entender a crescente relevância das finanças no mundo.

Engana-se, porém, quem espera encontrar apenas uma teoria objetiva da sociedade. Heinrich leva o subtítulo de O capital a sério. Sem recorrer ao “supertrunfo” da dialética, o autor nos introduz à crítica da economia política, programa que, ao minar a autoevidência das ciências econômicas, aprofunda a teoria do conhecimento com uma pesquisa das relações sociais capitalistas. Se Marx promoveu uma revolução científica, cheia de intenções políticas revolucionárias, Introdução a O capital de Karl Marx a consagra. E mais: instiga a revisão de discursos sacralizados.

Uma leitura obrigatória em nosso tempo de crise
PAUL LEBLANC
La Roche College; autor de From Marx to Gramsci

A melhor introdução a O capital que já li”
MICHAEL PERELMAN
Universidade do Estado da California, Chico;
autor de The Invisible Handcuffs of Capitalism

Uma reinterpretação fundamental da teoria de Marx”
JOHN MILIOS
Universidade Técnica Nacional de Atenas, Grécia


Veja o lançamento de Introdução a O capital de Karl Marx, com Michael Heinrich, na TV Boitempo:


Um dos maiores estudiosos da obra de Karl Marx no mundo, Michael Heinrich traz em Introdução a O capital de Karl Marx uma rigorosa aproximação aos três livros de O capital. O autor compreende a crítica da economia política como o núcleo da intervenção teórica de Marx. Pela leitura de Heinrich, Marx não é idealizado, mas tratado como um crítico da socialização mediada pelo valor.
 
A introdução de Heinrich não para, como comumente se vê, nos primeiros capítulos de O capital, sobre a produção de mercadoria, ou mesmo ao fim do Livro I. Ele nos permite acessar plenamente a teoria do valor e chegar até suas formas monetárias mais desdobradas e concretas. Isso torna esta introdução atual e necessária para entender o capitalismo. Sem simplificações baratas, aborda o que há de atual e o que há de obsoleto na obra-prima de Karl Marx.

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Guilherme Leite Gonçalves é professor associado da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e docente permanente no Programa de Pós-Graduação em Sociologia do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP-UERJ) e no Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD-UERJ). 

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