Lênin e a síntese dialética entre o conhecer, o organizar e o revolucionar

Por Anderson Deo

A célebre frase leniniana “a análise concreta da situação concreta” talvez seja a mais brilhante síntese categorial sobre a teoria social revolucionária inaugurada por Marx. A “análise concreta” que supera toda e qualquer forma de empirismo, investigando a “situação concreta” a partir de suas múltiplas determinações, que compreende a relação entre aparência e essência dos fenômenos sociais, desvela, portanto, sua “concreticidade histórica”, reproduzida ao nível de “consciência da historicidade” em sua totalidade.

Em O desenvolvimento do capitalismo na Rússia, tais características analíticas saltam aos olhos do leitor. Ao debater criticamente com o importante núcleo intelectual dos populistas russos, Lênin aponta para os equívocos na tática e estratégia de sua formulação e proposição políticas, derivadas de uma leitura que idealizava o campesinato como força revolucionária autônoma, cuja organização social seria capaz de promover um salto histórico, que superaria os vestígios feudais e o decadente capitalismo russo em processo de constituição, avançando para uma forma social futura inspirada nos princípios das comunas agrárias daquele país.

Lênin volta sua análise à formação social da Rússia e às transformações ocorridas a partir das reformas de 1861, identificando as especificidades da forma particular de desenvolvimento que o modo de produção capitalista estava então reproduzindo ao penetrar num país que viria a se caracterizar como um dos elos débeis da cadeia imperialista.

Esforço analítico realizado durante o período em que esteve confinado na Sibéria, o texto que o leitor tem em mãos é fundamental sob vários aspectos. Entre os quais, evidencia que a “questão agrária” passou a ocupar, então, lugar de destaque nas formulações do movimento revolucionário. Outra questão importante diz respeito à elaboração da obra leniniana em seu processo de formulação, uma vez que podemos identificar conexões fundamentais com textos posteriores, de períodos diversos, que devem ser analisados em seus contextos históricos, mas que possuem um núcleo constitutivo que os unifica e que identifica de forma incontornável e extremamente atual a práxis revolucionária de Lênin: a postura diante da realidade histórica fundada na síntese dialética entre o conhecer, o organizar e o revolucionar.

“O grande significado teórico do Desenvolvimento transcende a pletora de informações históricas, econômicas, sociais, culturais etc. que oferece acerca da evolução do capitalismo na Rússia. Nesta obra, a mais “russa” de todas as produzidas por lênin – e, consideradas as condições sob as quais a redigiu, verdadeiro tour de force para um intelectual que não completara trinta anos –, encontramos um procedimento metodológico exemplar: o processo cognitivo, operado por um sujeito qualificado teoricamente (mesmo que ainda jovem), e comandado pelas exigências postas pela irredutível objetividade do objeto.”
— José Paulo Netto

“Mesmo sua maior obra de investigação científica (O desenvolvimento do capitalismo na Rússia) foi empreendida por inspiração política. Lênin queria deixar patente que a revolução nacional russa era uma revolução atrasada, porém especificamente burguesa. Como tal, ela estava sujeita a determinadas regras, tinha um sentido inequívoco e seguiria certos caminhos mais ou menos previsíveis, cuja natureza e implicações políticas cabiam aos socialistas conhecer com rigor, para que pudessem agir revolucionariamente.”
— Florestan Fernandes

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Sétimo volume da coleção Arsenal Lênin, O desenvolvimento do capitalismo na Rússia traz uma análise rigorosa da economia e da estrutura social da Rússia no período posterior à reforma de 1861, que aboliu a servidão do campesinato. Escrito de 1896 a 1899, Lênin iniciou o livro na prisão e o concluiu na aldeia de Chúchenskoie, durante seu exílio. Indispensável e monumental, a obra é uma das mais significativas produzidas por Lênin, baseada em farta pesquisa e documentação histórica – o autor consultou mais de 500 fontes, entre livros, monografias, relatórios, atas, revistas, estatísticas etc. Partindo de uma perspectiva marxista, Lênin esmiúça o desenvolvimento do mercado interno russo que acontece com a reforma e a divisão social do trabalho que se seguiu.

O desenvolvimento do capitalismo na Rússia tem tradução direto do russo por Paula Vaz de Almeida, apresentação de José Paulo Netto, texto de orelha de Anderson Deo, capa de Maikon Nery e apoio da Fundação Maurício Grabois.

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Para discutir o legado do líder bolchevique, teremos uma live imperdível com José Paulo Netto e Marcela Magalhães na segunda-feira, 22/01 às 16h, na TV Boitempo. A conversa celebra o lançamento de O desenvolvimento do capitalismo na Rússia:

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E para quem estiver em São Paulo, teremos o lançamento de O desenvolvimento do capitalismo na Rússia com a preseça de Jones Manoel, Valério Arcary e Paula Vaz de Almeida na Tapera Taperá, dia 19/01 às 19h:

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Anderson Deo é livre-docente em Teoria Política Moderna e Contemporânea pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP/Marília).