Como conversar com crianças sobre invisibilidade social e solidariedade

Guilherme Boulos apresenta o sensível "O que você vê?", obra do premiado autor e artista gráfico Alexandre Rampazo.

Foto: Filipe Araújo/AFP

Por Guilherme Boulos

Pois é, existem duas formas de ver o mundo: com os olhos da cara ou com os olhos do coração. Uma nos diz o que temos à frente, a outra sente. Quando ficamos felizes com a felicidade de alguém ou sofremos com a dor de outra pessoa, estamos olhando com os olhos do coração. Um dia, nos meus tempos de escola, uma colega de classe foi atropelada depois de sair da aula e quebrou a perna. Quase toda a turma chorou. Eram os olhos do coração. Quando não somos capazes de ver com esses olhos, o nome disso é indiferença.

O que você vê fala disso. Atualmente, no Brasil, mais de 200 mil pessoas vivem nas ruas, sem abrigo nem acolhimento. Elas quase se tornam parte da paisagem, porque fomos tratando esse absurdo humano como se fosse normal. No dia a dia, nós nos preocupamos e brigamos pelas menores coisas, mas não ligamos para um semelhante jogado na calçada. Ele fica quase invisível.

Só que as coisas sempre podem mudar, e as mudanças dependem de nós. Elas passam por recuperarmos os olhos do coração. Você consegue imaginar, num dia de frio, cansado, com fome, você não ter uma casa para onde voltar? Um banho quente, uma cama, carinho? Se conseguirmos ver na criança sem-teto um irmão e na senhora idosa que pede esmola uma avó, vamos vencendo a indiferença.

E aí nasce o mais bonito dos sentimentos humanos: a solidariedade. Ela surge quando vemos com os olhos do coração e quando, a partir disso, fazemos algo para mudar a realidade: um olhar, um prato de comida, uma oportunidade e, principalmente, lutar por uma sociedade em que ninguém seja sem-teto nem invisível. Por isso, pergunte-se sempre: o que você vê?


O que pode haver por trás de uma confusão de gente caminhando de um lado para o outro, com histórias e percursos diferentes? O que você vê? Que história contar sobre alguém que você só observa? Podemos analisar as pessoas sem pré-julgamentos? É só com os olhos que enxergamos? E nossa imaginação? É possível enxergar de olhos fechados? E ver de olhos fechados é sonhar?
 
O que você vê, do premiado autor e ilustrador Alexandre Rampazo, traz a beleza de ser e estar no mundo, cada um à própria maneira. Delicadamente explorando o ponto de vista de quem observa, mas não pode ser observado, a obra incentiva os pequenos leitores – e também os adultos – a exercitarem o poder de observação, inclusive de quem acaba invisibilizado. 


Arte: Cris Vector

Aproveitamos para demonstrar todo nosso apoio ao Padre Julio Lancelotti e a todos que lutam por uma sociedade em que ninguém seja sem-teto nem invisível.

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