O fim do capitalismo como alternativa ao fim do mundo

Alexandre Araújo Costa comenta a publicação de "Enfrentando o Antropoceno", de Ian Angus, destacando como a obra é fundamental para pensarmos e agirmos para que o fim do capitalismo seja uma alternativa ao fim do mundo.

Por Alexandre Araújo Costa

Enfrentando o Antropoceno foi publicado originalmente em 2016. Nos seis anos seguintes, só a queima de combustíveis fósseis levou à emissão de mais de 200 bilhões de toneladas de CO2, acumulando mais de 14 ppm desse gás na atmosfera e intensificando o efeito estufa. De lá para cá, eventos extremos se multiplicaram, incluindo ondas de calor, secas severas, incêndios, ciclones e tempestades. No momento, vários recordes de temperatura – alguns deles estabelecidos justamente em 2016, por ocasião do mais recente Mega El Niño – estão sendo quebrados mundo afora, incluindo a temperatura média global.

Entre a publicação em inglês e de sua tradução para o português, iniciativa de grande importância da Boitempo, avançou-se na quantificação das nove chamadas “fronteiras planetárias” e constatou-se que ultrapassamos os limites seguros em seis delas: clima, biodiversidade, ciclos biogeoquímicos, mudança no uso do solo, uso de água doce e novas entidades (poluentes). Entre uma e outra, a maior pandemia em um século deixou quase 7 milhões de mortos, e governos da extrema direita negacionistas e exterministas emergiram nos dois países mais populosos a oeste de Greenwich.

Ao longo desses anos, o livro, ao contrário do que tamanhas mudanças poderiam sugerir, ganhou mais relevância, justamente porque se tornou mais forte e eloquente seu apelo. A profunda crise ecológica em que estamos mergulhados muda e mudará tudo, incluindo a sociedade e a geopolítica, com desafios que mal poderiam ser imaginados algumas décadas atrás.

Ao contrário de um cenário estático e imutável e fonte inesgotável de riquezas, o meio natural, desestabilizado e pressionado para além de seus limites de autorregulagem e autorrestauração, precisa entrar – centralmente – na equação da política. Ian Angus demonstra como a essência predatória do sistema econômico capitalista declara guerra, em nome do crescimento econômico infinito, do lucro e da acumulação desenfreada de riquezas contra o sistema Terra, contra Gaia/Pachamama, e mostra de que maneira a lógica desse sistema precisa ser combatida em seu todo: “Os socialistas não podem ser tribunos do povo se não forem também tribunos do meio ambiente”. Em outras palavras, devem se assumir ecossocialistas.

De essencial leitura, da apresentação de Bellamy-Foster ao apêndice, Enfrentando o Antropoceno pauta e clama por uma conexão viva entre ciência e política, entre o pensamento ecológico e o ideário de esquerda, não temendo expor quão grandes são os desafios postos, tampouco curvando-se ao niilismo, ao derrotismo, ao imobilismo ou ao sectarismo. É uma contribuição fundamental para pensar e – por que não? – agir para o fim do capitalismo como alternativa ao fim do mundo.


Quando começou o Antropoceno? Apesar de o termo se popularizar apenas em meados dos anos 2000, a discussão sobre a presença do homem no mundo e sua intervenção na natureza não é nova. Lançado originalmente em 2016, Enfrentando o Antropoceno, do canadense Ian Angus, é um estudo sobre o impacto do homem na Terra.

A obra se inicia debatendo a chamada Grande Aceleração, período posterior à Segunda Guerra Mundial apontado como ponto de inflexão na história terrestre, no qual as atividades humanas tornaram-se a força geológica primária que impacta o meio ambiente e seu futuro. Multidisciplinar, o livro analisa não apenas as mais recentes descobertas científicas sobre as causas e as consequências físicas da transição do Antropoceno, mas também as tendências sociais e econômicas que fundamentam a crise, como a queima de combustíveis fósseis e a atuação do capitalismo nos últimos cem anos.

Angus faz uma reflexão sobre as alternativas de mudanças em meio ao desenfreado aumento de temperatura, clima extremo, elevação dos oceanos e extinção em massa de espécies. Para o autor, a sobrevivência no Antropoceno exige uma mudança social radical, substituindo o capitalismo fóssil por uma nova civilização ecossocialista: “Ian Angus demonstra como a essência predatória do sistema econômico capitalista declara guerra, em nome do crescimento econômico infinito, do lucro e da acumulação desenfreada de riquezas contra o sistema Terra, contra Gaia/Pachamama e mostra de que maneira a lógica desse sistema precisa ser combatida em seu todo”, escreve Alexandre Araújo no texto de orelha.

Enfrentando o Antropoceno, de Ian Angus, tem Glenda Vicenzi e Pedro Davoglio, apresentação de John Bellamy Foster, texto de orelha de Alexandre Araújo Costa e capa de Maikon Nery, sobre O fígado, de Leda Catunda.

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Alexandre Araújo Costa é bacharel e mestre em Física pela Universidade Federal do Ceará, PhD em Ciências Atmosféricas pela Colorado State University, com pós-doutorado pela Yale University. Professor Titular da Universidade Estadual do Ceará, foi um dos autores principais do 1º Relatório de Avaliação do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas. Integrou a equipe do governo de transição do então presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva no Grupo de Trabalho de Meio Ambiente.

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