Os primeiros sinais da força narrativa de Leonardo Padura

Com "Febre de cavalos", o leitor identificará os primeiros sinais da força narrativa que o mundo enxergaria anos depois em Padura, seja com a série dedicada ao detetive Mario Conde, seja com seu best-seller sobre os últimos anos de Trótski.

Por Rita Palmeira

Publicado originalmente em 1988, Febre de cavalos é o romance de estreia de Leonardo Padura. Aos muitos leitores que o escritor conquistou no Brasil, sobretudo depois de O homem que amava os cachorros, não causará surpresa o que sobressai destas páginas. Estão lá a Cuba que é sua obsessão, o amor, os laços de amizade e o gosto pelo beisebol.

Andrés mora com sua mãe em Havana, onde se divide entre o curso pré-universitário, a expectativa de perder a virgindade, o esporte, a escolha profissional. Ou seja, preocupações de qualquer jovem de dezessete anos – até porque a Cuba retratada no romance é a do início dos anos 1980, antes, portanto, do colapso da União Soviética, que mergulharia a ilha caribenha em uma crise sem precedentes.

De volta de uma temporada na Escola no Campo – programa cubano que levava jovens para plantio e colheita –, o protagonista vê a vida transformada pela chegada de uma vizinha mais velha por quem ele logo se encanta, Cristina. Para além da mulher de seus sonhos, ele tem que lidar com a namorada, Adela, com quem ansiava perder a virgindade, e com a mãe, Consuelo.

É em torno dessas três mulheres e da descoberta do sexo que gira a trama da tocante narrativa de juventude de Padura. Nesse período de iniciação sexual, Andrés tem de aceitar que a mãe, tão devotada a ele depois da morte prematura da filha Kátia e da partida do marido para os Estados Unidos, é uma mulher; que Adela é tão inexperiente quanto ele; e que Cristina é tão livre que jamais será sua.

Em meio a toda essa angústia, Andrés percorre uma Havana nova a seus olhos, num processo de amadurecimento do protagonista que volta para casa (no que faz lembrar O apanhador no campo de centeio, de Salinger, referência já admitida pelo autor cubano). Febre de cavalos é, contudo, mais que isso (ou apenas isto): é uma história de amor ou da descoberta do amor, com a singeleza e o frescor que acompanham esse momento inaugural na vida de qualquer indivíduo.

Com Febre de cavalos, o leitor identificará os primeiros sinais da força narrativa que o mundo enxergaria anos depois em Padura, seja com a série dedicada ao detetive Mario Conde, seja com seu best-seller sobre os últimos anos de Trótski.

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Andrés é um rapaz de dezessete anos que, após concluir o programa Escola no Campo, retorna para casa e conhece Cristina, uma vizinha sedutora mais velha que ele. A partir da relação deles, ambígua e conturbada, a história de Andrés – inclusive com sua namorada e sua mãe – vai se definindo.
 
Fã e jogador de beisebol, o rapaz sofre um acidente durante um jogo decisivo; ainda frustrado, passa por uma experiência que o marca para sempre. Cada um dos âmbitos da juventude de Andrés é integrado ao enredo, em meio a suspense, intriga, dor e alegria, e contribui para revelar a formação e as transformações do adolescente e certas particularidades do cotidiano em Cuba.  

Escrito em 1982, Febre de cavalos é o romance de estreia de Leonardo Padura e será lançado pela primeira vez no Brasil. A partir dele, porém, já é possível notar o esboço de personagens importantes que Padura desenvolve nos futuros romances. Aliás, segundo o autor diz em nota presente na edição, com o tempo ele mesmo identificou em Andrés experiências bem parecidas com as do futuro investigador Mario Conde.

“Quarenta anos depois, Leonardo Padura volta à cena do crime. Mais exatamente a 1984, quando finalizou este primeiro romance, no qual o leitor ouve ecos de Salinger, Truman Capote, Fernando del Paso, García Márquez e, claro, Hemingway – ou melhor, Nick Adams, o voluntarioso alter ego do ‘Papa’ enquanto jovem. O protagonista é Andrés, estudante e beisebolista que se apaixona pela ambígua e vertiginosa Cristina. Trata-se de uma história de amor na juventude, de maneira sutil atrelada a outro famoso alter ego, o detetive Mario Conde. Febre de cavalos capta o nascimento do intimista estilo Padura: ‘Lembra? Você se sente invencível’, sugere o narrador. Este coming of age é ainda um retrato da sociedade cubana dos anos 1980, e desde então ‘não perdi o assombro juvenil nem a intenção de espreitar a realidade do país pelos olhos da minha geração’, diz o autor no prefácio. Para Padura, nem toda história de amor é só uma história de amor.”
– Ronaldo Bressane
 

Febre de cavalos, de Leonardo Padura, tem tradução de Monica Stahel, texto de orelha de Rita Palmeira, quarta-capa de Ronaldo Bressane, capa de Ronaldo Alves e apoio do Ministerio de Cultura y Deporte de España.

Disponível em nossa loja virtual e e-book à venda nas principais lojas do ramo:


Amanhã (28/02), às 15h, não perca a live “Amor e revolução“, que marca o lançamento de Febre de cavalos, com debate entre Joana Salém e Ronaldo Bressane e mediação de Julia Salazar (@sofalodelivro), na TV Boitempo:

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Rita Palmeira é crítica literária e editora. Doutora em Literatura Brasileira pela USP e mestre em Teoria e História Literária pela Unicamp, escreve sobre livros de ficção e edita livros de não ficção.

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