O marxismo crítico-revolucionário de Karl Korsch
As contribuições de Karl Korsch podem ser sintetizadas na luta implacável para preservar a essência do marxismo em seu caráter crítico e revolucionário, combatendo todo tipo de dogmatismo, determinismo e recuos em suas proposições políticas radicais.
Por Gabriel Teles
Karl Korsch pode ser considerado, sem dúvidas, um dos mais importantes marxistas da primeira metade do século XX. Sua vida e obra são expressões de uma pulsão para a revolução e uma obstinada defesa de um marxismo não dogmático, crítico e revolucionário. Korsch foi um daqueles intelectuais marxistas que, em sua plenitude, realizou aquilo que Karl Marx havia formulado em sua juventude: “Embora a construção do futuro e sua consolidação definitiva não seja assunto nosso, é ainda mais claro, no presente, o que devemos realizar. Refiro-me à crítica desapiedada do existente, desapiedada tanto no sentido de não temer os próprios resultados quanto no sentido de que não se pode temer os conflitos com aqueles que detêm o poder”.1
Tamanha importância, no entanto, não é acompanhada por um maior conhecimento de sua obra. Korsch, no interior das discussões do marxismo, é bastante citado, mas pouco lido e debatido. É de fácil verificação tal constatação. Basta um simples exercício de busca bibliográfica sobre Karl Korsch e veremos que, quase sempre, há poucos estudos sobre o autor. O que se tem, em abundância, são menções pontuais e restritas, articulando-o a outros autores, tais como Gramsci e Lukács, numa chave analítica que ficou conhecida como “marxismo ocidental”, termo cunhado pelo próprio Korsch, mas transformado em construto por Merleau-Ponty e popularizado por Perry Anderson. O problema, não obstante, persiste. Mesmo considerado, junto com aqueles dois autores, precursor do marxismo ocidental, Karl Korsch é o menos debatido: gastam-se dezenas de páginas com Gramsci e Lukács, mas pouco desenvolvida é a discussão sobre a reflexão korschiana.
Tal cenário se agrava ao constatar que até mesmo esses poucos estudos focalizam, quase sempre, tão somente uma obra de Korsch, Marxismo e Filosofia, desconsiderando todo o restante de sua produção anterior e posterior, rica em diversas análises e contribuições para a compreensão crítica da sociedade capitalista.
Esse conjunto de constatações nos leva à seguinte pergunta: como explicar, em suas múltiplas determinações, o status periférico do pensamento de Korsch ou o silêncio sobre a sua obra?
A intenção deste texto, evidentemente, não é responder essa questão em sua totalidade, mas focalizar em um aspecto fundamental de seu pensamento, que dá inteligibilidade e explica um dos motivos da existência tanto dos não-leitores quanto dos maus-leitores da obra necessária e atual de Karl Korsch. Por esse ângulo, objetivamos explicitar, mesmo que sinteticamente, a proposta de marxismo crítico-revolucionário de Korsch e como tal compreensão atravessou o conjunto de sua militância política e de sua obra teórica. Como veremos adiante, a sua concepção de marxismo e as consequências retiradas da mesma geram dificuldades para aqueles que não levam até as últimas consequências o projeto político radical e revolucionário do qual o próprio marxismo é uma manifestação. Antes, no entanto, façamos alguns breves apontamentos biográficos situando sua trajetória intelectual e política.
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Karl Korsch nasceu em 1986, em Tostedt, distrito de Hamburgo, na Alemanha. Oriundo das classes privilegiadas alemãs, estudou direito, sociologia e filosofia, doutorando-se em direito em 1911, pela Universidade de Jena.
Enquanto se preparava para as provas exigidas para seguir carreira jurídica no Estado Alemão, Korsch é convidado a trabalhar, em 1912, na Inglaterra. O seu trabalho consistiria na tradução do inglês para o alemão de um novo livro do famoso jurista inglês Sir. Simon Shuster. Do período estabelecido em Londres, o fundamental será o rápido desenvolvimento político de Korsch e sua adesão à primeira organização política após sua experiência no movimento estudantil: a Sociedade Fabiana.2
Em meio à eclosão da I Guerra Mundial, retorna à Alemanha e participa do conflito enquanto oficial. Nos últimos anos de guerra, com o aumento da miséria entre as classes subalternas (operárias, camponeses, etc.) e o cansaço dos soldados no front, inicia-se uma imensa onda de insatisfação, estourando greves selvagens, revoltas e insubordinações coletivas de soldados em quase todas as nações participantes da Guerra. O ano de 1917 representou uma importante guinada na Primeira Guerra Mundial com o impacto da Revolução Russa e as massivas greves em Berlim e Leipzig, além de uma inicial radicalização operária na Itália, Hungria, França, dentre outros países. Todo esse processo impactou Korsch, que cada vez mais se radicalizava. Esses elementos se intensificaram ainda mais com a experiência da Revolução Alemã de 1918 e a criação e generalização de conselhos operários. A companhia de Korsch também criou seus conselhos operários e, graças ao seu prestígio e crescente radicalidade, ele foi eleito como um de seus representantes. No final da guerra, a sua companhia ficara conhecida como a “Companhia Vermelha”, pois todos eram a favor da revolução e do fim imediato da guerra.
Ao voltar da guerra, em janeiro de 1919, após participar da criação dos primeiros conselhos de soldados alemães, Korsch se filia ao USPD (Partido Social-Democrata Independente da Alemanha), especialmente em suas fileiras “esquerdistas”, que estavam mais ligados ao movimento dos conselhos em sua base, do que os “centristas” do partido, que se ligavam nas suas articulações com o SPD na nova república alemã. Além disso, simultaneamente, regressa para a sua antiga cidade universitária e inicia carreira como professor de direito na Universidade de Jena.
É também no início de 1919 que Korsch é convidado por Robert Wilbrandt a participar como seu “assistente científico” na Comissão de Socialização das indústrias alemãs, presidida por Karl Kautsky (representante do SPD) e Ernst Francke (do Instituto de Reforma Social). Korsch ficara encarregado de preparar recomendações para a socialização da indústria de carvão. Desta sua experiência, surgiu um dos trabalhos mais conhecidos de Korsch, a brochura O que é Socialização?, escrita em março de 1919.
Korsch, desiludido com a socialdemocracia e seu pseudoplano de socialização, inicia um intenso e profundo estudo da obra de Marx nos primeiros anos da década de 1920 em busca de maior concreticidade aos seus posicionamentos políticos. Em pouco tempo, assimila os fundamentos da teoria de Marx, especialmente sua teoria do capitalismo, contido em O capital, e inicia uma prática que fará por toda a sua vida militante: confrontar os supostos epígonos de Marx, evidenciando o caráter não marxista de seus escritos e prática política. Com esse espírito, irá desenvolver uma polêmica com a socialdemocracia e, posteriormente, também com o leninismo.
Frustrado tanto com o SPD quanto com o USPD, participa do famoso congresso deste último no final de 1920, quando o partido racha e a maioria opta por integrar o KPD (Partido Comunista da Alemanha). Korsch, buscando novos ares políticos, também se junta ao KPD, em que pesem suas profundas reservas quanto aos 21 pontos formulados pela Internacional Comunista, que evidenciava, entre outras determinações, a disciplina centralizada por Moscou e o grau de dependência em relação ao partido russo. Korsch, impulsionado por seu “socialismo prático”, se une ao KPD por acreditar que os trabalhadores revolucionários estavam migrando para esse partido e que, eventualmente, esse processo poderia dar alguma sobrevida ao já inicial declínio dos conselhos operários.
Durante seus anos no interior do KPD, Korsch se destacará e se tornará um dos grandes intelectuais desse partido, ministrando diversas palestras e sendo muito ativo em seus jornais e revistas. Será eleito deputado pelo Landtag (Parlamento Provincial) de Turíngia entre os anos 1920 e 1923.
Korsch torna-se, a partir daí, uma grande referência nos debates sobre o marxismo. Ele foi uma das peças-chave para a constituição do famoso Erste marxistische Arbeitswoche (Primeira Semana de Trabalho Marxista), ocorrido nas proximidades de Ilmenau (Turíngia) em 20 de maio de 1923, por iniciativa de Félix J. A ideia da Semana foi proposta e sugerida pelo próprio Korsch a Félix, que tornou-se o principal apoiador financeiro e patrono do evento (Cf. ALEXANDER, 1985; BUCKMILLER, 1988).
Korsch, nesse momento, vivia em Jena e morava no edifício que abrigava o jornal Die Neue Zeitung, editado pelo partido. A sua vida estava imersa em sua militância política, ora como um importante integrante do KPD e deputado na Landtag, ora como intelectual estudioso e teórico do marxismo. Mas, em 1923, ocorrem dois eventos importantes na vida de Korsch que encerram esta fase de sua trajetória.
O primeiro deles é a publicação de seu livro Marxismo e Filosofia, reunião de um conjunto de textos de Korsch que objetivava reconstituir o marxismo em sua base revolucionária. O segundo evento é a sua atuação como Ministro da Justiça de Turíngia durante seis meses, onde foi formado um governo de coalização entre comunistas (KPD) e socialdemocratas independentes (ala esquerdista do USPD). A pretensão dos dirigentes do partido era que esse governo se tornasse uma base central e regional para a insurreição revolucionária que estava se desenhando desde então na Alemanha.
O fracasso do que ficou conhecido como o “Levante de Outubro” criou uma profunda discussão no interior do KPD, criando diversas divisões internas e disputas sobre os rumos que o partido tomaria. A bolchevização dos partidos torna-se um imperativo com as diretrizes da III Internacional e esse processo repercute diretamente no KPD após o seu fracasso em 1923. Korsch, que sempre se posicionou em defesa da autonomia do proletariado, absorve atentamente essa discussão e inicia um processo de autoesclarecimento sobre a sua militância política e as determinações da derrota proletária na Alemanha. Como resultado, torna-se ferrenho crítico da ala hegemônica de seu próprio partido e se vincula a organizações críticas à experiência soviética, culminando na sua expulsão do KPD em 1926, livrando-se do fardo de estar num partido que não acreditava mais ser revolucionário, mas no qual se mantinha na esperança de igualmente radicalizar seus outros membros ou o conjunto dos trabalhadores ainda ligados a ele.
A partir de 1926, com sua expulsão do KPD, continua vinculado ao movimento operário em suas publicações teóricas e políticas. Até 1932, publica importantes ensaios que tratam de diversos assuntos: marxismo, materialismo histórico, sociologia, ascensão fascista, União Soviética, etc.
Com a ascensão do nazismo na Alemanha, em 1933, é expulso da Universidade de Jena e migra para a Dinamarca, Suécia, Inglaterra e, finalmente, se instala de maneira definitiva nos Estados Unidos. Em 1937, publica outra importante obra, em inglês, Karl Marx, para uma coleção de sociologia da London School of Economics (Cf. LANGKAU, 1981). Sem nenhum vínculo organizativo, após romper com diversos partidos políticos e ser expulso do KPD, Korsch encontra-se parcialmente isolado nos Estados Unidos.
É a partir deste momento que ele se une aos comunistas de conselhos que também se exilaram nos EUA, especialmente Paul Mattick, Anton Pannekoek, Canne Meijer, entre outros. O comunismo de conselhos foi uma tendência marxista que se desenvolveu no bojo do processo revolucionário alemão, com representantes tanto da Alemanha quanto da Holanda (muito deles derivados da chamada “esquerda germano-holandesa”), caracterizado pela defesa dos conselhos operários, o combate à socialdemocracia, ao bolchevismo, ao sindicalismo e ao resgate da teoria revolucionária de Marx, especialmente a sua defesa da autoemancipação proletária (sintetizada na frase “a emancipação da classe operária é obra da própria classe operária”).
Os trabalhos de Korsch com os comunistas de conselhos se tornaram a sua principal atividade política realizada após a migração, especialmente na revista que Mattick fundara, Living Marxism. A reflexão korschiana agora inclina-se para explicar as determinações da derrota proletária e a ascensão da contrarrevolução, seja ela de lastro fascista ou de lastro soviético. Além disso, também fez diversos estudos sobre o marxismo, anarquismo, as lutas anticoloniais nos países periféricos, etc.
Até sua morte, em 1961, continua ministrando aulas em diversas universidades estadunidenses e publica dezenas de ensaios políticos em várias revistas ligadas ao restrito bloco revolucionário estadunidense, tais como Living Marxism, Modern Quaterly, New Essays e Partisan Review Politics.
A partir da década de 1950, a atividade política e intelectual de Korsch refluiu de maneira drástica e sua saúde deteriorou-se rapidamente. Em 1957, entra em colapso acometido pelos últimos estágios de incapacidade de uma esclerose múltipla. Devido a essa condição, morre em 21 de outubro de 1961, em Belmont, Massachusetts. Encerra-se, enfim, a trajetória de um grande intelectual marxista que, assim como o movimento revolucionário do proletariado, teve seu fim trágico golpeado pela contrarrevolução.
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A turbulenta, mas coerente trajetória política e intelectual de Korsch3 aponta para uma preocupação fundamental: fincar o terreno da crítica teórica, as armas da crítica, no movimento revolucionário do proletariado. Nessa perspectiva, Korsch buscou ao longo de toda a sua militância, mesmo que isso custasse o seu isolamento em momentos de refluxo da luta de classes, fundamentar o marxismo em sua base concreta, que é aquela classe social que possui a potencialidade de transformar radicalmente o conjunto da sociedade: o proletariado. Para tanto, não se esquivou de uma pergunta decisiva, com a qual a tradição comunista marxista estava lidando nas primeiras décadas do século XX, após a degeneração da II Internacional: o que é o marxismo?
Essa pergunta que, em sua aparência, apresenta-se de maneira trivial ou até mesmo acessória para as tarefas políticas de um início do século XX em ebulição – especialmente com a intensificação dos conflitos sociais –, na verdade ocuparia uma posição fundamental na relação entre teoria e prática dentro das organizações revolucionárias e reformistas. O pano de fundo dessa indagação se dava a partir da seguinte questão: se indivíduos tão diversos como Bernstein, Kautsky, Rosa Luxemburgo, Lênin, Anton Pannekoek, Otto Ruhle, Plekhanov (que expressavam posições políticas até mesmo antagônicas) advogavam para si o título de marxistas, o que poderia explicar tal diversidade? Como definir marxismo sem cair num relativismo simplório ou num moralismo idealista ou, ainda, num oportunismo preocupado com interesses outros?
Karl Korsch viveu em um tempo propício para refletir sobre essas questões: de um lado, tinham-se as transformações no conjunto da sociedade capitalista, que apontavam para uma profunda crise de acumulação de capital e, por consequência, para o acirramento dos conflitos sociais (sendo a I Guerra Mundial e a Revolução Russa os eventos históricos mais dramáticos desse processo); do outro, a maturação do movimento operário e das organizações derivadas de sua dinâmica, com suas derrotas, vitórias, desilusões e desenvolvimento. Munido com as armas da crítica (seu profundo conhecimento da obra de Marx, Hegel e da tradição socialista) e a crítica das armas (participou ativa e diretamente na Revolução Alemã e na constituição dos conselhos operários daquela região), Korsch enveredou em busca de uma concepção adequada e coerente de marxismo que expressasse autenticamente o seu projeto emancipador.
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O primeiro elemento que Korsch aponta é a limitação de todas as outras definições de marxismo feitas até o início do século XX pelos autointitulados marxistas. Assim, o marxismo não poderia ser uma “ciência neutra e objetiva”, apartada das relações sociais concretas e principalmente da perspectiva do proletariado, como defendida por alguns revisionistas, tal como na discussão de Bernstein. O marxismo, igualmente, não poderia ser fundamentado tão somente em seus elementos formais, como colocado por Kaustky (e retomado por Lênin) na sua reflexão sobre as três “fontes constitutivas do marxismo”: a filosofia clássica alemã, a economia clássica inglesa e o socialismo utópico francês. O marxismo, ainda, por fim, não seria “um sistema de ideias e da doutrina de Marx”, tal como na fórmula popular, porém incorreta, de Lênin. Korsch rejeita todas essas reflexões com lastros cientificistas, objetivistas, positivistas, formalistas, idealistas, etc. Todas elas, enfim, deixam de lado questões vitais e a raison d’être do marxismo.
O segundo elemento, e o mais decisivo de todos, é a maneira como Korsch estrutura o fundamento do marxismo. Em contraste com as limitações das definições anteriores, o nosso autor irá fundamentar a sua definição nas próprias ferramentas teóricas e metodológicas do marxismo. Ou seja, trata-se de uma análise materialista histórica do próprio materialismo histórico, uma análise dialética do próprio método dialético. É a partir desse princípio que ele explica o conceito, aponta o seu desenvolvimento histórico e o seu vínculo com as relações sociais concretas. Assim, tornam-se teoricamente explicáveis e compreensíveis as várias interpretações do marxismo que muitas vezes entram em contradição, já que se substitui “a usual condenação moral e voluntarista por uma explicação teórica e histórica” (MUSSE, 2011, p. 23). Em suas próprias palavras:
O único método verdadeiramente ‘materialista e, portanto, científico’ (Marx) para uma investigação desse tipo consiste antes em aplicar a perspectiva dialética introduzida por Hegel e Marx no estudo da história, e que, até agora, só aplicávamos à filosofia do idealismo alemão e à teoria marxista dela nascida, também à evolução ulterior desta até aos nossos dias. Quer dizer, temos que procurar compreender todas as transformações, desenvolvimento e regressões, na teoria e na prática, dessa teoria marxista, desde a sua formação a partir da filosofia do idealismo alemão, como produtos necessários do seu tempo (Hegel), ou, mais precisamente, compreendê-las no seu condicionamento pela totalidade do processo histórico e social de que são a expressão geral (KORSCH, 1977, p. 90, grifos do autor).
A ideia de aplicação do materialismo histórico a ele mesmo não foi, evidentemente, exclusiva de Korsch. Ela inicialmente foi indicada e esboçada por Antonio Labriola em La Concepción Materialista de la História, de 1896, Rosa Luxemburgo em Paralisia e progresso no marxismo, de 1903 e, finalmente, György Lukács em História e Consciência de Classe, de 1923. No entanto, sem dúvidas, foi Korsch que levou essa perspectiva às últimas consequências e a realizou plenamente, mesmo com as limitações que apontaremos adiante.
Essa estruturação é derivada diretamente de um dos princípios primordiais do materialismo histórico: a tese da unidade entre ser e consciência. Tal princípio nos leva a uma das reflexões mais importantes dessa teoria: não é a consciência que determina a vida, mas o contrário, a vida que determina a consciência.
É em A ideologia alemã que Marx e Engels desenvolvem tais questões, evidenciando que as ideias em geral, bem como os produtos da consciência humana, não podem ser consideradas criações independentes e autônomas dos seres humanos reais e concretos. Essa obra consiste em manuscritos dos dois autores que nunca foram publicados em vida e só foram lançados postumamente, em 1926 (Cf. VIANA, 2012). Já a obra em que Korsch discute essas mesmas questões (Marxismo e Filosofia) foi publicada em 1923, ou seja, três anos antes da primeira publicação de A ideologia alemã. Isso demonstra que Korsch captou bem a discussão, mesmo antes da publicação dos manuscritos de Marx e Engels.
A partir dessas premissas, Korsch fundamenta o marxismo nas relações sociais concretas, relacionando intrinsecamente essa teoria ao proletariado, classe revolucionária de nossos tempos. E aqui reside exatamente a especificidade dessa teoria: o marxismo é expressão teórica do movimento revolucionário do proletariado.4 Assim, o marxismo não é uma mera doutrina firmada nos textos de Marx e Engels; não é apenas na leitura de seus escritos que ele se apresenta, mas, fundamentalmente, no entendimento de seu conteúdo. Korsch elabora essa definição considerando a abordagem realizada no Manifesto comunista por Marx e Engels, sobretudo quando estes autores colocam a relação entre os comunistas e o movimento operário.
As proposições teóricas dos comunistas não se baseiam, de modo algum, em ideias ou princípios inventados ou descobertos por este ou aquele reformador do mundo. São apenas a expressão geral das condições efetivas de uma luta de classes que existe, de um movimento histórico que se desenvolve diante dos olhos (MARX, ENGELS, 2010, p.51).
Dessa forma, Korsch, partindo do materialismo histórico, retoma a prerrogativa da luta de classes e do movimento operário para compreender e analisar a teoria marxista. Por conseguinte, essa teoria é apresentada por ele não como “as doutrinas de Marx e Engels”, mas sim como uma perspectiva cujo conteúdo deve ser compreendido a partir de sua formação histórica concreta. Em síntese, é decisivo também que o marxismo se submeta permanentemente ao mesmo escrutínio crítico-revolucionário que ele exerce sobre a realidade concreta e todas as ideologias que buscam ofuscar a compreensão correta dessa mesma realidade. Essa é, para Korsch, a garantia fundamental contra todo tipo de petrificação, dogmatização e recuo do marxismo que foram praticadas inicialmente pela II Internacional e posteriormente pela III Internacional. Daí o caráter não-dogmático e antidogmático de sua concepção, reinserido numa percepção que resgata a historicidade5 e a totalidade – categorias fundamentais do materialismo histórico.
Korsch, no entanto, não apenas se limitou a definir o marxismo, mas também buscou fazer uma análise marxista de sua própria história. Ele analisou essa história focando nos avanços e recuos do movimento operário. Se esse movimento recuava, a sua expressão teórica (marxismo), igualmente tendia a recuar e eventualmente se transformar em ideologia (no sentido que Marx atribuía à palavra, ou seja, falsa consciência sistematizada). Por outro lado, se o proletariado se apresentava na arena da luta de classes de maneira autodeterminada, ou seja, em seu aspecto revolucionário, o marxismo tendia a avançar e aprofundar. É por isso que Korsch afirma que “[…] o aparecimento da teoria marxista não é senão o ‘outro aspecto’ do aparecimento do movimento proletário real; os dois aspectos juntos constituem a totalidade concreta do processo histórico” (KORSCH, 1977, p.79).
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A discussão anterior nos leva ao que Paul Mattick (2020) afirmou certa vez sobre o conteúdo do marxismo de Korsch: a compreensão de que a teoria marxista deve ser vista como parte constitutiva da luta do proletariado pela abolição da sociedade capitalista. Logo, ela só tem significado como parte indivisível e essencial dessa transformação social. Ou seja, o marxismo é, em essência, uma teoria da revolução social proletária. E aqui entramos em dois aspectos que gostaria de explorar agora na reflexão de Korsch: o caráter crítico e revolucionário do marxismo e suas implicações tanto para essa teoria quanto para a luta de classes no geral.
O marxismo é crítico pois efetua uma crítica desapiedada do conjunto das relações sociais que sustentam a totalidade da sociedade capitalista bem como as suas ideologias legitimadoras. Nesse sentido, Korsch vai demonstrar como Marx, fundador dessa teoria revolucionária, buscou efetuar a crítica a todas as ideologias de sua época: da filosofia, do socialismo utópico, da economia política. Não é mero penduricalho, portanto, o subtítulo de sua principal obra, O capital: crítica da economia política. Tal crítica, no entanto, não se confunde com uma crítica “pura”, desinteressada e alheia às relações sociais concretas. A teoria marxista, portanto:
[…] não pretende ser uma ciência ou uma filosofia “puras”; antes, deve criticar impiedosamente a “impureza” de toda ciência ou filosofia burguesas conhecidas, desmascarando sem complacência os seus “pressupostos” implícitos. E esta crítica, por seu turno, nunca quer ser uma “pura” crítica no sentido burguês da palavra. Ela não é realizada de modo “objetivo”; ao contrário, mantém a mais estreita relação com a luta prática que a classe operária trava pela sua emancipação, luta de que essa crítica não é mais que a expressão teórica. Ela se distingue, em consequência, de toda ciência ou filosofia burguesas não crítica (dogmáticas, metafísicas ou especulativas), assim como, também radicalmente, de tudo aquilo que se designa por “crítica” na ciência e na filosofia burguesas tradicionais e cuja forma teórica mais acabada se encontra na filosofia crítica de Kant (MATTICK, 2020, p.92).
Korsch insiste sobre essa questão em quase todos os textos e livros que trata do marxismo, tal como podemos ver, também, em seu texto Por que sou marxista, escrito, em 1935: “A teoria marxiana não se constitui em uma filosofia materialista positiva nem em uma ciência positiva. Do princípio ao final, é uma crítica, tanto teórica como prática, da sociedade existente”.
O marxismo, no entanto, não é apenas crítico; é, também, revolucionário. Nesse sentido, temos um simultâneo movimento de negação e afirmação. Negação da sociedade existente e afirmação de uma nova sociedade, a aurora da humanidade inscrita no comunismo (como disseram Marx e Engels no Manifesto comunista), na livre associação dos produtores (como disse Marx em O capital). É a partir da negação (prática e teórica, que formam uma unidade) da primeira que se desabrocha a segunda. Korsch sintetiza essa relação em seu importante livro, Karl Marx, publicado originalmente em 1938, afirmando que o marxismo “[…] assume-se, ao mesmo tempo, como teoria [crítica] da sociedade burguesa e teoria da revolução proletária” (KORSCH, 2018, p.84).
Se o marxismo, como já vimos, é expressão teórica do movimento revolucionário do proletariado, então a sua essência é contribuir para o objetivo último desse movimento: a destruição da sociedade existente e a instauração da emancipação humana via revolução proletária. Nessa perspectiva, o marxismo não pode, por sua essência, recuar para uma análise contemplativa da realidade, acrítica aos processos sociais que produzem a manutenção da exploração, dominação, opressão e miséria psíquica. Muito menos se fechar numa análise descritiva, mesmo que crítica, da sociedade existente. O marxismo, por ser uma teoria da revolução, é também uma revolução teórica, rompendo com toda a filosofia anterior e as ciências burguesas parcelares, que fatiam a realidade diluindo a percepção da totalidade concreta, uma das categorias fundamentais da dialética marxista. Por esse ângulo, Korsch irá afirmar:
Para os eruditos burgueses dos nossos dias, o marxismo representa não só uma grave dificuldade teórica e prática de primeira ordem, mas, além disso, uma dificuldade teórica de segunda ordem, uma dificuldade “epistemológica’. Não é possível arrumá-lo em nenhuma das gavetas tradicionais do sistema das ciências burguesas e mesmo se quisesse abrir especialmente para ele e para os seus compadres mais chegados uma nova gaveta chamada sociologia, ele não ficaria sequer quieto lá dentro, iria constantemente passear para todas as outras. “Economia”, “filosofia’, “história”, “teoria do Direito e do Estado”, nenhuma destas rubricas pode contê-lo, mas nenhuma estaria a salvo dele se quisesse metê-lo noutra (KORSCH, 2018, p.139).
É por isso que a forma (expressão teórica) e o conteúdo (proletariado revolucionário) do marxismo apontam para um projeto que visa o futuro, a utopia concreta diria Ernst Bloch. A negação do presente em prol do futuro emancipador.
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Assim, podemos sintetizar a contribuição de Korsch como uma luta implacável para preservar a essência do marxismo em seu caráter crítico e revolucionário, combatendo todo tipo de dogmatismo, determinismo e recuos em suas proposições políticas radicais.
Sua compreensão do marxismo, sem dúvidas, levou a inúmeros embates dentro e fora desse meio. É a partir dessa visão que Korsch combateu o que ele chamou de pseudomarxismo, tanto na II Internacional quanto na III. Assim, Korsch criticou radicalmente tanto a socialdemocracia quanto o bolchevismo. Esse processo, no entanto, não se deu automaticamente. Korsch, ao longo de seu desenvolvimento intelectual e político, foi se radicalizando e rompendo com diversas organizações e perspectivas até se conformar em uma corrente do marxismo conhecida como comunismo de conselhos, que tinha como representantes Paul Mattick, Anton Pannekoek, Herman Gorter, Otto Rühle, entre outros.6
É fundamental acrescentar que Korsch não se limitou a fazer uma análise do marxismo, de suas ferramentas teórico-metodológicas e de seu desenvolvimento histórico.7 Além de intelectual engajado, foi um militante importante de diversas organizações, participou ativamente de várias lutas e escreveu sobre inúmeros assuntos candentes para a luta revolucionária de seu tempo.
Afora a reflexão no interior do marxismo, duas das grandes preocupações de Korsch foram os processos revolucionários e as contrarrevoluções. Temas que estão diretamente ligados à noção de marxismo e luta de classes de nosso autor. Por isso, analisou diversas experiências revolucionárias, tanto do passado (Comuna de Paris, Revolução de 1844, etc.) quanto de seu tempo (Revolução Russa, Revolução Alemã, Guerra Civil Espanhola, etc.), bem como processos contrarrevolucionários, tais como o nazismo, o fascismo, o bolchevismo e as democracias liberais dos países de capitalismo imperialista.8
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Por suas posições políticas e coerência de seu projeto revolucionário, Korsch viveu as últimas décadas de sua vida exilado e isolado nos Estados Unidos da América. Após romper, no final dos anos 1920, com o Partido Comunista Alemão (KPD), por sua subordinação à União Soviética via bolchevização dos partidos comunistas, Korsch passou a ser renegado por grande parte do dito movimento marxista, onde reinou o silêncio perante as suas obras e opiniões.
Com o refluxo da luta de classes, especialmente com a derrota da Revolução Alemã, a instauração de um capitalismo de estado na União Soviética e a transformação do marxismo em ideologia, Korsch, bem como todos aqueles que buscaram dar prosseguimento à chama crítica e revolucionária do marxismo, foi sumariamente “esquecido” e renegado. Não poderia ser diferente. Em épocas não-revolucionárias, torna-se difícil a manutenção de uma teoria que propõe, do início ao fim, um projeto radical e revolucionário. Daí a marginalização do marxismo, que só pode ser uma expressão teórica do movimento revolucionário do proletariado.
Antes de finalizar este ensaio, é importante destacar que Korsch possui contradições, lacunas e limites, como qualquer militante que está imerso na luta de classes de seu tempo. De maneira sumária, cito algumas: a) seu historicismo cabal, que não percebia a relação entre essência e existência no interior dos conceitos; b) suas críticas a Marx, especialmente sobre a questão do caráter e distinção entre revolução burguesa e revolução proletária, derivada de uma leitura imprecisa dos textos marxianos; c) uma oscilação quanto à sua avaliação da perspectiva de Lênin; d) imprecisões conceituais, especialmente com a noção de ciência.
Karl Korsch, como já mencionado, morreu em 21 de outubro de 1961, nos Estados Unidos, sem reconhecimento, marginalizado por suas posições políticas radicais e a sua recusa do “marxismo oficial” da União Soviética e seus satélites, os Partidos Comunistas de todo o mundo.
O interesse por sua obra tomou impulso, no entanto, com a desestabilização do capitalismo nos fins dos anos 1960 e início da década de 1970 e a intensificação da luta de classes, trazendo um novo fôlego e uma intensa republicação e tradução de seus textos e livros (Cf. BUCKMILLER, 2013). O mesmo ocorre, novamente, nos anos 2000, quando um novo ciclo de interesse pela obra de Korsch reaparece sob os ventos das lutas antiglobalização e autônomas, sedentas por referências teóricas que deem estrutura às suas ações. Sua obra, portanto, será sempre uma oportuna bússola política e teórica que almeja o processo de transformação radical da sociedade via revolução proletária e sua contribuição política será válida enquanto perdurar a sociedade capitalista.
Publicado originalmente em Boletim Maria Antônia/GMARX, v.2, n.33, 2021 (Edição Especial).
Notas
1 Carta de Marx a Arnold Ruge, setembro de 1843.
2 A Sociedade Fabiana era uma organização que almejava o socialismo a partir de reformas graduais e da educação das massas; era, portanto, uma organização reformista mais ligada a uma mescla entre tradição liberal e socialdemocrata, crítica ao marxismo e à teoria revolucionária no geral.
3 Em minha tese de doutoramento, Karl Korsch e a análise marxista do marxismo, em processo de conclusão, há um capítulo específico sobre a trajetória intelectual e uma biografia desenvolvida de Karl Korsch; em breve já estará disponível para um maior conhecimento de sua vida e um vislumbre global de sua produção. Até lá, remeto o leitor às memórias de sua companheira, Hedda Korsch, publicada a partir de uma entrevista feita com ela em 1972 (Cf. KORSCH, 2014).
4 Lukács (2012, p. 66) define marxismo de forma semelhante em História e Consciência de Classe: “A teoria que anuncia isso [i. e., que anuncia o proletariado como preconizador da dissolução do mundo existente] não se vincula à revolução de uma maneira mais ou menos contingente, por relações interligadas e ‘mal interpretadas’. Ela é essencialmente apenas a expressão pensada do próprio processo revolucionário”. Em outro trabalho, fizemos uma comparação das definições entre Korsch e Lukács do marxismo (Cf. FERREIRA; TELES, 2018).
5 A historicidade é um elemento fundamental no pensamento korschiano. Em toda a sua obra ressalta o que ele chama de “princípio da especificidade histórica”, categoria do método dialético que ele resgata de Marx e desenvolve em diversos textos. Para Korsch a análise de qualquer fenômeno social deve ser entendida em sua particularidade histórica. Além disso, tal princípio se “aplica” na política também: “O princípio reforça o debatedor na discussão política entre uma tendência apologética, isto é, defensora das circunstâncias existentes, e uma tendência crítico-social, revolucionária” (KORSCH, 1983, p. 35).
6 Lucas Maia, um dos principais pesquisadores do comunismo de conselhos no Brasil, fez uma ótima síntese das características dessa corrente: “a) a determinação fundamental para o surgimento do comunismo de conselhos foi naturalmente o surgimento dos conselhos operários como forma de organização e luta concreta dos trabalhadores; b) compõe este processo a crítica à ideologia, estratégia e prática política dos partidos socialdemocrata e bolchevique, bem como dos sindicatos. Enfim, a elaboração de uma crítica às burocracias partidárias e sindicais; c) um outro aspecto é o desenvolvimento do marxismo original. Os comunistas conselhistas eram autores vinculados ao marxismo, ou seja, tinham no materialismo histórico-dialético sua perspectiva teórica de análise da realidade. Sua elaboração teórica significou a adequação e aprofundamento do marxismo às condições da luta operária das primeiras décadas do século 20” (MAIA, 2016, p.26).
7 Descrever e analisar todo esse conjunto de contribuições korschianas, evidentemente, não é o nosso objetivo aqui, para além do espaço limitado.
8 Ainda há pouco material bibliográfico de Korsch publicado em língua portuguesa, especialmente sobre suas análises sobre revolução e contrarrevolução. Recentemente foi publicado, pela editora Enfrentamento, uma coletânea de seus ensaios que trata da Comuna de Paris. Este livro, junto com o famoso Marxismo e Filosofia, são os únicos livros de Korsch publicados no Brasil. Existem, no entanto, diversos textos dispersos em diversos portais digitais. O portal Crítica Desapiedada fez uma interessante compilação dos textos de Korsch publicados em língua portuguesa.
Referências bibliográficas
ALEXANDER, S. Marxistische Arbeitswoche 1923. Beiträge zur Geschichte der Arbeiterbewegung. v. 27, n. 1, p. 53–54, 1985.
BUCKMILLER, M. Die Marxistische Arbeitswoche 1923 und die Gründung des Instituts für Sozialforschung. In: NOERR, Gunzelin Schmid; REIJEN, Willem van (Org.): Grand Hotel Abgrund. Eine Photobiographie der Kritischen Theorie. Junius Verlag: Hamburg, 1988.
BUCKMILLER, Michael. Zur Aktualität von Karl Korsch und seine Bedeutung für die Entwicklung der sozialistischen Linken: Veröffentlichungen Sopos, 2013.
FERREIRA, Aline C.; TELES, Gabriel. A Definição Marxista de Marxismo em Georg Lukács e Karl Korsch. Revista Espaço Livre, Goiânia, v. 13, n. 25, p. 7-18, jan./jun. 2018.
KORSCH, Hedda. Memórias de Karl Korsch. Revista Marxismo e Autogestão, v.01, n. 01, p.56-74, jan./jun. 2014.
KORSCH, Karl. Karl Marx. Lisboa: Antígona, 2018.
KORSCH, Karl. Marxismo e filosofia. Porto: Afrontamento, 1977.
LANGKAU, Götz. Sobre el texto de esta edición. In: KORSCH, Karl. Karl Marx. Barcelona: Ariel, 1981. p. 5-16.
MAIA, Lucas. Comunismo de Conselhos e autogestão social. Rio de Janeiro: Achiamé, 2016.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto comunista. Trad. Álvaro Pina; Ivana Jinkings. São Paulo: Boitempo, 2010.
MATTICK, Paul. Karl Korsch e o Marxismo. Goiânia: Edições Enfrentamento, 2020.
MUSSE, Ricardo. Marxismo e Filosofia. Margem esquerda: ensaios marxistas, São Paulo, n.17, 2011.
VIANA, Nildo. Karl Korsch e a Concepção Materialista da História. Florianópolis: Bookess, 2012.
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Gabriel Teles é professor substituto de Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, doutorando em Sociologia pelo PPGS/USP, mestre em Sociologia pelo PPGS/UFG, graduado em Ciências Sociais/UFG. Pesquisador pelo Grupo de Pesquisa Dialética e Sociedade (GPDS) e Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Movimentos Sociais (NEMOS).
😀
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