Padura e a realidade cubana em todas as dimensões
Sylvia Colombo comenta “Como poeira ao vento”, o novo romance de Leonardo Padura, destacando como uma boa história de ficção pode nos levar a mirar de frente a realidade e compreendê-la em todas as suas dimensões.
Por Sylvia Colombo
Uma fotografia captura o momento em que amigos aparentemente inseparáveis aparecem juntos. Estão alegres e sorriem. Parece que continuarão unidos pelo resto da vida. A partir de então, porém, tudo começa a mudar. As trajetórias pessoais, marcadas pelos tropeços da história cubana recente, se transformam em meio a despedidas, paixões, traições e reencontros. Perguntas que ficaram no ar ou sonhos que não se realizaram. Feridas que vieram com as decepções e por surpresas que encontraram no caminho. Todas, no fundo, remetendo de modo dramático e nostálgico àquela imagem.
Como poeira ao vento é uma novela escrita em forma de coro. Aos poucos, vamos conhecendo cada um dos integrantes do chamado Clã. Cada amigo encarna, de certa forma, as diferentes reações humanas à diáspora cubana, numa cadeia temporal que se inicia nos anos 1990 e viaja até nossos dias.
Por meio de uma narrativa envolvente, Leonardo Padura nos leva a um país complexo, em que as coisas são muito mais que o preto e branco que a polarização política dos últimos anos nos faz crer.
Há personagens que saem da ilha, outras que nascem fora de lá, as que desejam voltar, as que retornam e não se reencontram de nenhuma maneira e as que permanecem e resistem. Ao mesmo tempo que são pessoas diferentes, todas parecem refletir parte das emoções do próprio autor.
Embora a trama nos leve também aos Estados Unidos, à Europa e à América do Sul, todos os lugares surgem desenhados pelas linhas que a citada diáspora neles contorna, assim como hoje o fenômeno da imigração vem transformando tantos cantos do mundo, consolidando-se como tema tão urgente.
Escritor cubano que vive até hoje na casa em que nasceu e cresceu, Padura reafirma sua posição de observador atento a cada característica do caráter cubano: a sensualidade, a música, o amor, a gastronomia, as paixões políticas.
Fazendo referência à canção “Dust in the Wind” (Kansas), o autor convida a refletir sobre a vida e a amizade. De forma incisiva, também questiona os comportamentos geracionais dos cubanos: tanto o discurso muitas vezes duplo da geração que fez a Revolução como o dos que saíram da ilha.
Uma boa história de ficção é aquela que nos faz mirar de frente a realidade e compreendê-la em todas as suas dimensões. É justamente a esse gênero literário que pertence Como poeira ao vento.
***
O dia começa mal para Adela, jovem nova-iorquina de ascendência cubana, quando ela recebe uma ligação de sua mãe, que não está contente com as escolhas que a filha fez de se mudar para Miami e viver com Marcos, um jovem cubano recém-chegado aos Estados Unidos. Marcos conta a Adela histórias de sua infância na ilha, em meio ao Clã de amigos de seus pais, e lhe mostra uma foto da última refeição que o grupo teve 25 anos antes, quando ele era criança. Surpreendentemente, Adela descobre alguém familiar entre os rostos. E perde o chão.
Como poeira ao vento é a história desse Clã que sobreviveu ao exílio e à dispersão. O que aconteceu aos que partiram e aos que decidiram ficar? Como o tempo os transformou? O magnetismo do sentimento de pertencer e a força do afeto os aproximará novamente? Ou a vida deles agora é apenas poeira ao vento? Num enredo cheio de suspense, encontros, desencontros e reencontros, Padura acompanha a trajetória de seus personagens, todos e cada um buscando soluções para as difíceis circunstâncias que se abateram sobre o povo cubano no fim do século XX e no início do século XXI. É a história de uma Cuba e de muitos destinos.
O livro já foi lançado na Espanha e na França, onde tem sido muito bem recebido. Na França, foi um dos indicados ao Prix Médicis Étranger, conceituado prêmio de romances estrangeiros. Uma leitura deslumbrante, um retrato humano comovente, outra obra-prima de Leonardo Padura.
***
O livro de Leonardo Padura tem tradução de Monica Stahel, texto de orelha de Sylvia Colombo, capa de Ronaldo Alves e apoio do Ministerio de Cultura y Deporte da Espanha.
***
Disponível em nossa loja virtual e e-book à venda nas principais lojas do ramo:
Dia 15 de dezembro, às 20h30, teremos o debate Cultura e revolução em Cuba, que marca o lançamento de Como poeira ao vento. Participação de Sylvia Colombo, Juliane Furno, Vanessa Oliveira e mediação de Vinicius Barbosa (Latina Leitura), na TV Boitempo:
***
Saiba mais:
Jornal Rascunho: Novo romance de Leonardo Padura discute exílio e dispersão em Cuba
O Globo: Dê um livro de presente: Juca Kfouri sugere o novo livro do cubano Leonardo Padura
O Globo: Leonardo Padura: ‘O que está em jogo é a necessidade de liberdade’, diz autor cubano sobre protestos em seu país
Estado de Minas: Leonardo Padura aborda a diáspora cubana em Como poeira ao vento
Terra: Exílio inspira novo romance do escritor cubano Leonardo Padura
Rádio Brasil de Fato: Padura: “Existem forças fora de Cuba interessadas em desestabilizar o sistema cubano”
Carta Maior: Uma só Cuba e vários destinos
Istoé: Exílio inspira Como poeira ao vento, novo romance de Padura
Veja: “Precisamos ser livres”, diz escritor cubano Leonardo Padura
***
Sylvia Colombo é jornalista da Folha de São Paulo, correspondente para a América Latina, baseada em Buenos Aires. Já foi repórter e editora de cultura e correspondente em Londres e em Bogotá. Historiadora formada pela USP, é coautora de Utopias Latino-Americanas (Contexto) e A Democracia na América Latina (Senac).
Quero ler!
CurtirCurtir