Cultura inútil: Prazer (masoquistas devem estar amando estes tempos…)
De William Shakespeare a Clarice Lispector, passando por Albert Einstein e o Marquês de Maricá, Mouzar Benedito reúne as melhores frases e ditados sobre prazer, pra nos ajudar a atravessar estes tempos difíceis com alguma leveza.
Por Mouzar Benedito.
Eu tinha escrito este texto com o título “Prazer: tem quem não goste”. Mas antes de mandar pro blog, surgiu essa quarentena maldita e muitas proibições. E recebo mensagens e mensagens de gente que parece vibrar com a prisão domiciliar a que estamos todos submetidos. Alguns parecem dar uma volta na rua só para ver se encontram algum velho (como eu) e encher o saco: “Tem que ficar em casa!”. E que casa! Que apartamento – uns devem morar em quitinetes que agora chamam de “estúdios”, com 20 metros quadrados.
Lembro-me de um juiz do Ceará condenado à prisão domiciliar. A casa dele era enorme e ficava num terreno de meio quarteirão, com piscina, quadra, churrasqueira, jardim etc. Aí sim, dá pra aguentar. Mas em muquifos!?
Bom, quem sobreviver pode daqui alguns meses ter um prazer enorme fazendo coisas bem simples: tomando umas e outras num boteco e brindando com os amigos, por exemplo.
O texto que tinha escrito antes é esse que segue abaixo…
Assim disse Machado de Assis: “Botas… as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de as descalçar”.
É verdade. Mas além dos pés há outras partes do corpo que se refastelam com o fim de um “sofrimento”. Eu sempre cito os programas de rádio em que religiosos gritam contra o diabo ou pedem grana aos seus crédulos fiéis. Quando a gente desliga, os ouvidos agradecem. Desligar o rádio é um prazer nesses casos.
E já que falei em religioso esbravejando, acho incrível que certos fanáticos religiosos desprezem tudo o que dá prazer, até consideram pecado qualquer coisa prazerosa. Tudo em nome da “vida eterna”, a conquista do paraíso. Mas o que farão no paraíso, eternamente? Bom… Eu já falei disso aqui: “Há pessoas que passam a vida cantando ‘Hosanas ao Senhor’, para poder ir para o céu, onde passarão a eternidade cantando ‘Hosanas ao Senhor’”.
E vivemos num tempo em que as pessoas que não gostam de certos prazeres dos outros, em vez de viverem os seus, ficam pentelhando, tentando acabar com os prazeres alheios. Por exemplo: tratam fumantes como pessoas que merecem ser condenadas à morte. Eu, que parei de fumar há mais de vinte anos, de vez em quando tenho vontade de voltar ao vício só para peitar certos militantes antitabagistas. Ficaria fumando e cantando: “Fumar é um prazer, sensual, genial…”, ou então “Se eu quiser fumar eu fumo / se eu quiser beber eu bebo…”.
Se pudessem proibiriam mais um monte de coisas. Millôr Fernandes já disse: “Se é gostoso faz logo, amanhã pode ser proibido”. Ah, me lembrei da música de Roberto e Erasmo Carlos: “Tudo que eu gosto é ilegal, é imoral ou engorda”.
Muitas pessoas, inclusive “pensadores”, associam o prazer com alguma desgraça posterior. Não se pode ter prazer impunemente. Como disse Augusto dos Anjos, “O beijo, amigo, é a véspera do escarro”.
Selecionei frases de gente que gosta do prazer e também de gente que vê o prazer com ressalvas ou críticas. Antes, porém, quero lembrar de uma coisa: a união entre uma pessoa sádica e uma masoquista poderia formar um par perfeito, já que uma tem prazer em causar dor e a outra gosta de sentir dor. Mas o sádico pode ter aí outra forma de sadismo. Uma mulher masoquista pede ao parceiro sádico: “Me bate! Me bate!”. Ele, com cara de enorme prazer, responde: “Não”.
Pois bem, vamos às frases e a alguns ditados populares.
Shakespeare: “O que não dá prazer não dá proveito. Em resumo, senhor, estude apenas o que lhe agradar”
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Madame Pompadour: “Há no coração duas medidas: uma para o prazer e outra para a dor, e ambas se despejam e enchem alternadamente”.
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Marguerite Yourcenar: “Prazer e sofrimento. Toda minha vida, defini o prazer e a dor como duas sensações vizinhas”.
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Ditado popular: “Por um prazer, mil dores”.
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Provérbio escocês: “Prazer e perigo andam de mãos dadas”.
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Torquato Tasso: “É instintivo da mente humana que um homem mais deseje os prazeres que lhe são proibidos”.
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Walter Bagehot: “Um dos maiores prazeres da vida consiste em fazer o que os outros lhe dizem que não pode”.
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Mae West: “Só se vive uma vez, mas se você fizer tudo certinho, uma vez é o bastante”.
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Virgílio: “Cada qual tem o seu prazer que o arrasta”.
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Ditado popular: “Cada um procura o prazer onde o acha”.
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Clarice Lispector: “Afinal nessa busca de prazer está resumida à vida animal. A vida humana é mais complexa: resume-se na busca do prazer, no seu temor, e sobretudo na insatisfação dos intervalos”
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Clarice Lispector, de novo: “Eu não aguento a resignação. Ah, como devoro com fome e prazer a revolta”.
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Clarice Lispector mais uma vez: “Todo prazer intenso toca no limiar da dor”.
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Voltaire: “Sempre prazer não é prazer”.
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Ditado popular: “O prazer torna-se monótono; a felicidade, nunca”.
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Apolinaire: “Meu desejo maior é ter em casa uma mulher razoável, um gato a passear entre meus livros e, a todo tempo, amigos. Sem tais prazeres eu não viveria”.
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George Bernard Shaw: “Não há satisfação em enforcar um homem que não faz objeção a isso”.
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Clarence Darrow: “Eu nunca matei um homem, mas já li muitos obituários com muito prazer”.
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Bhagavad Gita: “Conhece a paz quem esqueceu o desejo de sentir prazer”.
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Ditado popular: “Não podemos gozar sem sofrer; o mal é ocasião de inumeráveis bens”.
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Camilo Castello Branco: “O extremo de um grande prazer é um desgosto”.
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Marcel Proust: “Os homens podem ter várias espécies de prazer. O verdadeiro é aquele pelo qual eles deixam outro”
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Proust, de novo: “Tudo que foi prazer torna-se um fardo quando não mais o desejamos”.
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Medeiros de Albuquerque: “Tudo que é prazer é divino”.
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Ditado popular: “Os prazeres são como os alimentos: os mais simples são os que menos enfastiam”.
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Nabuco de Araújo: “A libidinagem e o gozo em demasia, geram a saciedade e trazem o embrutecimento da razão e o tédio da vida”.
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Rainha Margarida, de Navarra: “A liberdade me ensinou, e muito bem, que nela se concentra todo o prazer possível”.
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Marquês de Maricá: “Gozamos sonhando com bens e prazeres que nunca poderíamos esperar conseguir acordados”.
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Benjamin Franklin: “Se um homem pudesse ter metade dos seus desejos realizados, teria mais aflições que prazeres”.
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Epicuro: “Nenhum prazer é em si um mal, porém certas coisas capazes de engendrar prazeres trazem consigo maior número de males que de prazeres”.
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Thomas Jefferson: “Não mordas um prazer antes de ver se não há um anzol escondido nele”.
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Provérbio português: “Visitas sempre nos dão prazer. Se não quando chegam, pelo menos quando partem”.
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Guilherme Massien: “O desejo é uma árvore com folhas; a esperança, uma árvore com flores; o prazer, árvore com frutos”.
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Traventino: “A natureza não reservou para o homem outra enfermidade tão mortal quanto a dos prazeres do corpo”.
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Paul Valéry: “Sei que há um prazer violento que se chama gozar. Adivinhei-o noutros tempos, num momento de embriaguez… é quando a alma se conhece a si própria”.
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Marques Rebelo: “Só queremos o prazer, o descuidado prazer, como se as leis da natureza não existissem ou nos poupassem”.
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Horácio: “Despreza os prazeres: é prejudicial o prazer comparado ao preço da dor”.
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Ditado popular: “A natureza criou os prazeres, o homem criou os excessos”.
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Jane Austen: “Metade do mundo não consegue compreender os prazeres da outra metade”.
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Albert Camus: “Nenhum homem é hipócrita nos seus prazeres”.
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Oscar Wilde: “Por detrás da alegria e do riso, pode haver uma natureza vultar, dura e insensível. Mas por detrás do sofrimento, há sempre sofrimento. Ao contrário do prazer, a dor não tem máscara”.
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Wilde, de novo: “Adoro os prazeres simples. São o último refúgio das pessoas complicadas”.
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Wilde, mais uma vez: “O prazer é a prova da natureza, o seu sinal de aprovação. Quando somos felizes, somos sempre bons, mas quando somos bons nem sempre somos felizes”.
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Ditado popular: “Nesta vida os prazeres são por quilos e os pesares por toneladas”.
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Nietzsche: “Para a maioria, quão pequena é a porção de prazer que basta para fazer a vida agradável”.
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George Lord Byron: “O ódio é o prazer mais duradouro. Os homens amam com pressa, mas odeiam com calma”.
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Miguel Couto: “O fim do homem é o prazer, tantas vezes no mesmo bem reside o mal”.
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Ditado popular: “Não há prazer sem amargura”.
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Stendhal: “O que é um amante? É um instrumento no qual nos esfregamos para ter prazer”.
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Sidonie Colette: “À força de prazeres a nossa felicidade cai no abismo”.
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Leonardo da Vinci: “Prazer e dor são representados com os traços gêmeos, formando como que uma unidade, pois um não vem nunca sem o outro; e se colocam um de costas para o outro porque se opõem um ao outro”.
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Jean Baptiste Massilon: “A saúde e o prazer são para o homem o que o sol e o ar são para as plantas”.
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Schopenhauer: “Em geral, nove décimos da nossa felicidade baseiam-se exclusivamente na saúde. Com ela, tudo se transforma em fonte de prazer”.
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Ditado popular: “Sem comer não há prazer”.
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Albert Einstein: “Detesto, de saída quem é capaz de marchar em formação com prazer ao som de uma banda. Nasceu com cérebro por engano; bastava-lhe a medula espinhal”.
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Einstein, de novo: “Jamais considerei o prazer e a felicidade como um fim em si, e deixo este tipo de satisfação aos indivíduos reduzidos a instintos de grupo”.
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Cervantes: “O pesar e o prazer andam tão emparelhados que tanto se desnorteia o triste que se desespera quanto o alegre que confia”.
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José C. Alves Neves: “O homem deve convencer-se de que o mundo não foi criado para seu gozo, e que ele é terra como todos os seres”.
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Augusto dos Anjos: “Ah! Dentro de toda a alma existe prova de que a dor como um dardo se renova quando o prazer barbaramente a ataca”.
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Ditado popular: “O que é de gosto regala a vida”.
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Samuel Butler: “Nossas penas são coisas reais, enquanto nossos prazeres não passam de fantasias”.
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Marquês de Sade: “A primeira lei que a natureza me impõe é gozar à custa seja de quem for”.
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Sêneca: “É válido procurarmos conhecer a que má e penosa servidão nos sujeitamos quando nos abandoamos ao poder alternado dos prazeres e das dores, esses dois amos tão caprichosos quanto tirânicos”.
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Alexandre Herculano: “Gozo é sempre o desengano mais ou menos insosso das fascinações do desejo”.
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Ditado popular: “O prazer corre atrás dos que dele fogem”.
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Provérbio persa: “Descrever o prazer que tivemos é metade do prazer”.
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Blaise Pascal: “Não é vergonhoso ao homem sucumbir à dor, mas sim sucumbir ao prazer”.
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Carlos Drummond de Andrade: “A leitura é uma fonte inesgotável de prazer, mas, por incrível que pareça, a quase totalidade não sente esta sede”.
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Cícero: “As invenções da necessidade são mais antigas que as do prazer”.
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Paladas: “Nisto se resume a vida: um instante de prazer. Para longe com as mágoas. Se assim curta é a existência, venha Baco com as danças, as coroas florais, as mulheres. Que eu prove a felicidade, não sei como será meu amanhã”.
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John Dryden: “Há na loucura um prazer que só os loucos conhecem”.
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Goethe: “Se tomardes a vida com excessiva severidade, que atração tem? Se a manhã não vos convidar a novas alegrias e se à noite não esperardes nenhum prazer, valerá a pena vestir-se e despir-se?”
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Marilyn Monroe: “Quem disse que as noites são para o sono?”.
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Eu:
“Não beba, não fume.
Para a vida ser ‘decente’
Tem que ter azedume!”
Para quem quiser falar mais pomposamente sobre estar tendo (desculpem-me o gerúndio) prazer, aí vão algumas sugestões: estar em mar de rosas, estar como peixe na água, estar com o ânimo desafogado, ficar preso pelos beiços, fremir de alegria, banhar-se em água de rosas, estar como pinto no lixo, ter o céu na terra, sonhar sonhos encantados, viver num reino encantado, estar vivendo dias ditosos…
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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2017, e-book). Colabora com o Blog da Boitempo mensalmente, às terças.
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