Leituras marxistas do governo Bolsonaro
Novo número da Margem Esquerda, revista semestral da Boitempo, se debruça sobre o governo Bolsonaro.
Acabou de chegar o novo número da Margem Esquerda – edição quentíssima dedicada a destrinchar os rumos do governo Bolsonaro. Para marcar o lançamento da revista, promovemos uma conferência com o filósofo do direito Alysson Mascaro, autor do texto de abertura do dossiê de capa da edição, sobre a “#VazaJato e a crise brasileira“; e um debate entre Leda Paulani e João Quartim de Moraes, mediada por Eleonora de Lucena. Confira a gravação integral das duas atividades ao final do texto de apresentação do número assinado pelos editores da revista.
Por Ivana Jinkings e Artur Renzo.
O Brasil vive o governo mais obscurantista, regressivo, autoritário e antinacional desde a ditadura militar implantada em 1964, na qual se inspira. No quinto mês desde que o candidato de extrema direita Jair Bolsonaro assumiu a presidência do país, a Margem Esquerda avalia esse curto momento de crises, contradições e tensões acirradas.
O dossiê ora publicado, sob coordenação do especialista em direito político e econômico Luiz Felipe Osório, dissipa as brumas dos engodos e das incertezas que turvam o olhar imediato do contexto nacional, evidenciando o cerne da conjuntura brasileira, fundamentalmente imersa na dinâmica internacional.
Para Osório, “esse é o fio que atravessa as interpretações que, apesar de inicialmente setoriais, se entrelaçam, conferindo a síntese necessária para a compreensão de nosso tempo. Esta edição brinda-nos com ensaios voltados à crítica do momento atual em quatro atos. Pela visão da política, com Alysson Leandro Mascaro e a leitura das formas sociais, a partir da crise brasileira e (também) mundial determinada pela forma-valor e pela forma política, além de sobredeterminada pela forma jurídica. Pelo foco da economia, com Leda Maria Paulani e a concepção da sobreacumulação, explicando as fases da economia brasileira interfaceada à mundial, bem como as razões e intenções da política econômica ultraneoliberal do governo. Pela lente das relações internacionais, com Celso Amorim e a percepção do estadista e estrategista, pontando para as particularidades do Brasil e da América Latina enquanto periferia sistêmica perante os Estados Unidos e para a marcha da insensatez que nos leva a uma política externa eivada de um idealismo multilateral e subserviente. Pelo prisma militar, com João Quartim de Moraes e a investigação minuciosa da racionalidade fardada, do caráter militar do poder ditatorial no Brasil e no Cone Sul e do atual arranjo entre farda e toga, muito menos excepcional do que se pensa”.
A revista traz ainda uma entrevista com a economista portuguesa naturalizada brasileira Maria da Conceição Tavares. Em longa conversa com Luiz Felipe Osório e Maurício Metri, professor de economia política internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ela fala de sua trajetória, das parcerias intelectuais, das suas leituras e de como, apesar do atual cenário, continua apostando na democracia e no socialismo.
Em diálogo com o dossiê, os artigos dos cientistas políticos marxistas Joachim Hirsch e Victor Wallis situam em perspectiva global e histórica a assim chamada crise atual da democracia, colocando em xeque as reações liberais à ascensão do populismo de direita na atualidade, ao passo que o filósofo do direito Carlos Rivera-Lugo se dedica a mapear as diversas manifestações do fenômeno na difícil conjuntura latino-americana. A seção de artigos traz ainda uma extensa contribuição da socióloga estadunidense Patricia Hill Collins, que reflete, em diálogo com a filósofa brasileira Sueli Carneiro, sobre a relação entre conhecimento e empoderamento no feminismo negro; um tocante ensaio do sociólogo Fabio Mascaro Querido sobre as trajetórias cruzadas de dois grandes intelectuais de nosso tempo – Michael Löwy e Roberto Schwarz; e um inspirado relato do sociólogo britânico Michael Burawoy – amigo e executor literário de Erik Olin Wright –, sobre o legado desse importante marxista norte-americano recentemente falecido. Para a seção de homenagem, Miguel Vedda oferece uma comovente recordação de Carlos Eduardo Jordão Machado, o Cadu, que nos deixou em agosto de 2018. Ainda no rol dos tributos, Luiz Bernardo Pericás seleciona e traduz as palavras de Julio Antonio Mella, cujo assassinato completou noventa anos em janeiro.
O artista da vez é o pintor, desenhista, escultor, cenógrafo, ensaísta e videomaker Nuno Ramos. A obra escolhida pelo nosso editor de imagens Sergio Romagnolo foi a série de performances “Aos vivos”, três peças que foram apresentadas simultaneamente aos debates eleitorais de 2018 para a presidência e que aconteceram no Galpão do Folias (04/10), na Casa do Povo (21/10) e no IMS/São Paulo (26/10).*
A questão do engajamento no debate sobre arte e política é o tema que atravessa a resenha de Lindberg S. Campos Filho sobre a primeira edição brasileira dos Ensaios sobre Brecht, de Walter Benjamin. As demais notas de leitura são assinadas por Deni Alfaro Rubbo, Gabriel Brito e Ana Garcia.
Os poemas que encerram este número, escolhidos a dedo pelo nosso editor de poesia Flávio Aguiar, revelam uma faceta ainda pouco apreciada de um dos maiores líderes revolucionários do século XX. Transparecem nos poemas do cárcere de Ho Chi Minh, que em setembro completa cinquenta anos de morte, ao mesmo tempo “a dura situação dos prisioneiros, imersos na solidão e na infestação de doenças e piolhos, e o estro poético que, apesar dela, não esmorece”.
* Na primeira peça, oito atores em palco reproduziram os pronunciamentos, discursos e enfrentamentos do debate de 1º turno realizado pela Globo, transmitidos a eles ao vivo via audiofones. No centro do círculo formado pelos atores em cena, uma performer gravitou ininterruptamente durante as 3 horas do debate ao modo de um dervixe e ao som de flauta e percussão sufi. Na segunda, os atores receberam emissões sonoras que lhes chegaram aos ouvidos por dois canais distintos: 1) um audiofone emitindo em tempo real o que a Rede Record transmitiu no lugar do debate presidencial cancelado; 2) atores sussurrando em seus ouvidos, por meio de tubos de vidro, trechos da peça Antígona, de Sófocles, adaptada por Angélica Freitas e Nuno Ramos. Na terceira e última, os atores reproduziram, em tempo real, a programação que a Globo exibiu no lugar do último debate presidencial, também cancelado por conta da recusa do então candidato Jair Bolsonaro. Ao longo do espetáculo, as falas foram invadidas por menções às principais hashtags envolvendo os presidenciáveis e o Ministério Público. Simultaneamente, outros intérpretes declamaram diálogos do filme Terra em transe (1967), de Glauber Rocha, acompanhados de parte da trilha sonora e da sonoplastia do longa-metragem. Para mais informações, sugerimos acesso às gravações das apresentações na página de YouTube da trilogia, que também transmitiu as performances ao vivo, via streaming: “Aos Vivos (Dervixe) – Debate nº 1”, “Aos Vivos (Antígona) – Debate nº 2” e “Aos Vivos (Terra em transe) – Debate nº 3”.
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#VazaJato e a crise brasileira, com Alysson Mascaro — debate Margem Esquerda
Com Alysson Leandro Mascaro
Em meio às explosivas reportagens feitas pelo The Intercept Brasil que atingem em cheio o chamado “lavajatismo”, a Boitempo, a Margem Esquerda e a Tapera Taperá convidam para uma palestra de Alysson Mascaro analisando os aspectos jurídicos e as determinações econômicas mais profundas dos atuais desdobramentos da crise política brasileira sob uma perspectiva marxista. Com mediação de Daniela Haj Mussi, o evento ocorreu na noite do dia 25 de junho de 2019, na Tapera Taperá.
Leituras marxistas do governo Bolsonaro — debate Margem Esquerda
Com Leda Paulani e João Quartim de Moraes
O primeiro debate de lançamento da Margem Esquerda ocorreu na casa Plana na semana passada, e contou com a presença de dois outros autores do dossiê de capa da revista: Leda Paulani e João Quartim de Moraes. Com mediação da jornalista Eleonora de Lucena (Tutaméia), a atividade ocorreu na noite do dia 13 de junho de 2019, na casa Plana.
Sobre a edição
Em uma conjuntura política marcada por profundas incertezas e muita coisa em jogo, a edição n. 32 da revista da Boitempo se debruça sobre os rumos do Governo Bolsonaro através de um dossiê especial, mais robusto que o comum, que traz análises de fôlego assinadas por Alysson Mascaro, Celso Amorim, Leda Paulani e João Quartim de Moraes.
O número, que abre com uma preciosa entrevista com a economista Maria da Conceição Tavares, traz ainda entre seus destaques um artigo do jurista alemão Joaquim Hirsch, que oferece uma refinada leitura marxista sobre a propalada “crise da democracia” que estaríamos vivendo no Brasil e no mundo; e um artigo da socióloga estadunidense Patricia Hill Collins, que parte de uma reflexão de Sueli Carneiro para desenvolver uma análise sobre a relação entre conhecimento e empoderamento no feminismo negro. Pra fechar o número, Flávio Aguiar, editor de poesia da revista, seleciona, traduz e comenta poemas do cárcere de Ho Chi Minh.
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Ivana Jinkings nasceu em Belém (PA), em 1961. Fundou e dirige a editora Boitempo, de São Paulo, e a revista Margem Esquerda. Filha de Maria Isa Tavares e Raimundo Jinkings, intelectual e dirigente comunista que criou a primeira Boitempo, em Belém, nos anos 1960, coordenou, com Emir Sader, Carlos Eduardo Martins e Rodrigo Nobile, a Latinoamericana: enciclopédia contemporânea da América Latina e Caribe, obra vencedora do prêmio Jabuti de Melhor Livro de Ciências Humanas e o Melhor Livro de Não-Ficção em 2007. Organizou, entre outros, o livro A verdade vencerá: o povo sabe por que me condenam, de Luiz Inácio Lula da Silva (Boitempo, 2018).
Artur Renzo é editor do Blog da Boitempo, da TV Boitempo e da revista Margem Esquerda. Formado em Filosofia e em Comunicação Social com habilitação em Cinema, traduziu, entre outros, A loucura da razão econômica: Marx e o capital no século XXI (Boitempo, 2018), de David Harvey.
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