Perry Anderson e o marxismo ocidental

Munido de extrema erudição na matéria – que o leva, paradoxalmente, a ser quase didático –, Perry Anderson busca, como um detetive, rastrear efeitos e causalidades do rico legado do marxismo ocidental, apontando vantagens e insuficiências nessa dissensão histórica e intelectual.

Por Gilberto Maringoni.

A Boitempo reuniu em uma única publicação dois ensaios já consagrados de Perry Anderson: Considerações sobre o marxismo ocidental e Nas trilhas do materialismo histórico. São referenciais porque, apesar de escritos há mais de trinta anos, mantêm espantosa atualidade neste conturbado período da história contemporânea.

Anderson examina aqui uma das mais fecundas vertentes do marxismo do século XX, aquela que ganhou o qualificativo de “ocidental”, a partir de um célebre ensaio de Maurice Merleau-Ponty, em 1955. Trata-se de uma contraposição ao “marxismo soviético”, caudatário da leitura staliniana, que se convencionou chamar de “marxismo-leninismo”.

Apesar da crítica, não há uma oposição frontal a Lênin, ele próprio já classificado como um “bolchevique ocidental” por Stephen Cohen, em Bukharin, uma biografia política. O que vários pensadores comunistas buscaram, a partir do início dos anos 1920, foi delimitar águas com uma possível interpretação mecanicista e positivista do legado de Marx. Essa tradição se inicia com Antonio Gramsci, na Itália, György Lukács, na Hungria, e Karl Korsch, na Alemanha, entre outros. Ganharia, tempos depois, a adesão de Jean-Paul Sartre, Herbert Marcuse, Louis Althusser, Lucio Colletti, Walter Benjamin e Jürgen Habermas, para nos fixarmos em alguns. Tal balizamento entre as duas vertentes, no entanto, cria outros problemas. Sob o manto do “marxismo ocidental” abrigam-se tantas tendências e realidades sociais e políticas que se pode utilizar essa terminologia mais pelo contraste que por suas confluências internas.

De maneira geral, vale apontar algumas das preocupações partilhadas por esses filósofos e pensadores, de certa maneira deixadas de lado pelos intelectuais dos países onde os comunistas alcançaram o poder. Havia nesse conjunto maior ênfase nos estudos da subjetividade, no terreno da cultura, da arte e da filosofia, enquanto no Leste Europeu e na Ásia as questões diretamente vinculadas à política e aos negócios de Estado e da economia davam o tom. Em outras palavras e de modo um tanto arriscado, pode-se dizer que houve uma separação entre a prática política e a investigação intelectual, embora em muitos casos esses veios confluam.

O que faz Perry Anderson, ele mesmo um dos pensadores decisivos do marxismo europeu? Munido de extrema erudição na matéria – que o leva, paradoxalmente, a ser quase didático –, busca, como um detetive, rastrear efeitos e causalidades nesse rico legado. E apontar vantagens e insuficiências nessa dissensão histórica e intelectual.

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CONSIDERAÇÕES SOBRE O MARXISMO OCIDENTAL/
NAS TRILHAS DO MATERIALISMO HISTÓRICO
Segunda edição.
Tradução: Fabio Fernandes.
Apresentação: Emir Sader.

Perry Anderson examina nos ensaios deste livro o rico percurso político e intelectual de uma das vertentes do pensamento de esquerda do século XX, o chamado marxismo ocidental. Enquanto a herança stalinista no Leste Europeu e na União Soviética orientava os esforços para o estudo da organização do Estado e do Partido, intelectuais marxistas da Europa Ocidental e das Américas desbravavam terrenos até então pouco tocados pelos seguidores de Marx, como os da cultura, da subjetividade e da filosofia.

O historiador britânico mostra que, no entanto, as dificuldades de articulação com os movimentos de massa impediram que esses pensadores construíssem uma alternativa política à altura de suas inquietações teóricas. A partir do fim dos anos 1960, a difusão do marxismo no mundo anglo-americano e as mudanças nos contextos político-econômico e intelectual da Europa Ocidental trouxeram novos desafios, mas também novas possibilidades para essa tradição se renovar e ampliar seu campo de interesse.

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