Rosa Luxemburgo e as mães mineiras
"Desde 15 de janeiro, aniversário de 100 anos do assassinato de Rosa Luxemburgo, venho me lembrando de uma história que aparentemente nada tem a ver com a história da revolucionária polonesa. Mas tem."
Por Mouzar Benedito.
Desde 15 de janeiro deste ano, aniversário de 100 anos do assassinato de Rosa Luxemburgo, venho me lembrando de uma história que já contei por aí (pode ser que até aqui no Blog da Boitempo), que aparentemente nada tem a ver com a história da revolucionária polonesa.
É uma historinha sobre o hábito de mães mineiras fazerem promessas para os filhos cumprirem. Não são só as mães que fazem isso, um avô meu, por exemplo, fazia promessas para filhos, filhas e até netos cumprirem. Mas as mães usam (ou usavam) esse expediente com mais frequência.
Então, o que lembro, repito, parece não ter nada a ver com Rosa Luxemburgo. Mas tem. Então, vamos lá.
Marcos nunca perdoou a mãe, que tinha essa mania de fazer promessas para os filhos cumprirem e fez uma para ele, quando era um menino de 7 anos de idade.
Um horror, segundo suas lembranças.
Por causa de uma “graça alcançada” qualquer, ele teve que passar um ano assistindo todos os dias uma missa na igreja da santa de devoção dela, Santa Rita.
O problema era que a igreja ficava a uma légua de distância e a missa era às 7 horas da manhã. Não era levado de carro — não tinha essa moleza. — Ia a pé. E um menino dessa idade, para chegar à igreja a tempo de assistir à missa, tinha que sair de casa às 5h e pouco da manhã, com sol ou com chuva. Um ano de sofrimento, no conceito dele.
Isso ficou na sua memória, para sempre. Em alguns momentos, pensava em se vingar.
Militante do movimento estudantil, em 1968, ele foi preso no Congresso da União Nacional dos Estudantes, em Ibiúna (SP). Como muitos outros estudantes, ficou preso no Dops, incomunicável, sem poder receber visitas. Durante esses dias, ficou remoendo, sem saber porque, a história de um ano de missas — de 1º de janeiro a 31 de dezembro — na igreja distante. Foi ficando com raiva.
Só depois de alguns dias, permitiram a visita de sua mãe. Ele falou baixinho, consigo mesmo:
— Chegou a hora da vingança!
A mãe, toda emocionada, falava que já tinha providenciado advogado, que estava todo mundo preocupado, mas que ele ficasse calmo, que ninguém ia torturá-lo etc. e tal. Ele interrompeu seu discurso:
— Olha, eu fiz uma promessa para sair daqui…
Ela espantou-se um pouco pois achava que o filho tinha virado materialista e não acreditava nessas coisas.
— … E é a senhora que vai ter que cumprir — continuou.
— É? O que eu tenho que fazer?
— Todos os dias, sem falar nenhum, seja domingo ou feriado, durante um ano, às 6 horas da tarde, em ponto, a senhora deve parar seja o que for que estiver fazendo, e rezar um terço para Santa Rosa Luxemburgo, se quiser que eu saia da cadeia. E tem que ser um ano, não pode parar quando eu sair.
Ela não conhecia essa santa, mas já que era a devoção do filho, rezou certinho, cumpriu a promessa.
Poucos dias depois de ela iniciar a reza, às 6h da tarde, justo o horário das conversas com as vizinhas, ele saiu da cadeia. Só ficaram presos os líderes estudantis mais conhecidos.
Um ano sem as fofocas do final de tarde, mas valeu, achou a mãe, ao ver concluiu que a promessa fez efeito. Essa santa era forte e poderosa, gostou dela. Passou a ser uma das suas devoções. Até morrer, uns trinta anos depois, em momentos difíceis ela ainda rezava para Santa Rosa Luxemburgo.
* * *
Por sinal, a Boitempo e a edições Iskra acabaram de lançar a clássica biografia Rosa Luxemburgo: pensamento e ação, de Paul Frölich.
“Esta biografia foi publicada em Paris às vésperas da Segunda Guerra Mundial, quando a esquerda tentava sobreviver ao nazifascismo. Contra a onda extremista, Paul Frölich ergue a bandeira do socialismo humanista de Rosa Luxemburgo. Hoje, quando novamente o pêndulo da história oscila para a direita, a advertência que encerra o livro traz algum ânimo: “O cortejo triunfal da barbárie chegará ao seu limite. O Aqueronte voltará a fluir. Do espírito de Rosa Luxemburgo se erguerão os vencedores”. — Isabel Loureiro
“Rosa Luxemburgo: pensamento e ação é um instrumento de combate contra toda forma de exploração e opressão que fortalece a luta pelas ideias revolucionárias e socialistas também no Brasil.” — Diana Assunção
***
Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2017, e-book). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças.
toda pessoa que quer uma mudança de regime padece
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Aqui jaz
Mariele Franco,
Negra da Maré,
vanguarda dos deserdados de canudos,
morta por ordem
das milícias opressoras.
Oprimidos, das vielas
enterrai as vossas desavenças!
E renovai as vossas esperanças.
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Muito bom.
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Vou começar a seguir essa Santa Rosa Luxemburgo, kkk!
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