Cultura inútil: Algumas curiosidades sobre eleições

Em coluna especial, Mouzar Benedito elenca, em ordem cronológica, uma série de curiosidades "inúteis" sobre "eleições"!

Por Mouzar Benedito.

A primeira eleição direta para presidente do Brasil foi em 1o de março de 1894. O eleito foi Prudente de Morais, com 270 mil votos – o que representava 2% da população brasileira.

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Rui Barbosa candidatou-se a presidente do Brasil, em 1919. Foi derrotado por Epitácio Pessoa.

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Em 9 de agosto de 1922, Berta Lutz fundou a Federação Brasileiro pelo Progresso Feminino, para lutar pelo direito de voto.

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Em 24 de fevereiro de 1932, foi publicado o novo Código Eleitoral, do governo Getúlio Vargas, instituindo o voto secreto e o direito de voto às mulheres.

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Em 1933, teve uma eleição da Constituinte, e Carlota Queirós foi a primeira mulher deputada.

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Em 1937 três candidatos se apresentaram para as eleições presidenciais: o paraibano José Américo de Almeida e os paulistas Armando Salles de Oliveira e Plínio Salgado. Mas Getúlio Vargas, com base num documento chamado “Plano Cohen”, segundo o qual o PCB e organizações comunistas internacionais preparavam a tomada do poder, cancelou as eleições, outorgou uma nova Constituição apelidada “A Polaca”, e instaurou o “Estado Novo”, que radicalizou a ditadura. O “Plano Cohen” era uma farsa, feita oito anos antes para, se preciso, ser usado para manutenção de Getúlio no poder. Seu autor foi o então capitão Olímpio Mourão Filho que, já como general, foi um dos executores do golpe de 1964.

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Em 1947, o jornalista e humorista Aparicio Torelly, que usava o pseudônimo Barão de Itararé, foi eleito vereador do Rio de Janeiro pelo PCB. Sua campanha tinha como lema – numa época em que faltava leite e água na cidade – “Mais água e mais leite, mas menos água no leite”. Seus discursos faziam não só a Câmara rir, mas também lavadeiras e os trabalhadores. Ouviam as sessões da Câmara que eram transmitidas pelo rádio. O registro do PCB foi cancelado em 1947, pelo presidente Dutra, submisso aos EUA. Em janeiro de 1948, o Congresso aprovou o projeto de Lei Ivo d’Aquino, que cassava os políticos eleitos pelo PCB. E os parlamentares do PCB foram todos cassados. Entre eles, o Barão, que discursou pela última vez na tribuna da Câmara: “Neste momento, saio da vida pública para entrar na privada”. Segundo consta, ele entrou mesmo na privada.

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Em 1955, Carlos Lacerda, querendo impedir a realização das eleições, leu num programa de TV a “Carta Brandi”, um documento falso criado para incriminar João Goulart, candidato a vice-presidente na chapa de Juscelino. A carta forjada acusa Jango de querer instalar uma república sindicalista

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Em 3 de outubro de 1959, o rinoceronte Cacareco teve cem mil votos de paulistanos decepcionados com seus políticos e foi o mais votado para vereador, para a Câmara Municipal de São Paulo.

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Em 27 de outubro de 1965, depois que os candidatos apoiados pelo ditador Castelo Branco perderam as eleições para governador em Minas e na Guanabara (a cidade do Rio de Janeiro, que era um estado), baixou-se o Ato Institucional número 2, extinguindo os 13 partidos existentes e criando a Arena – Aliança Renovadora Nacional (partido da ditadura) e o MDB – Movimento Democrático Brasileiro (de oposição “consentida”).

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Em 1966 haveria eleições para governador, deputados e senadores em vários estados, mas com a derrota do governo ditatorial em Minas e na Guanabara no ano anterior, Castello Branco editou o AI-3 acabando com o “sufrágio universal” para escolha dos governadores, que passaram a ser escolhidos pelo presidente-ditador, e referendados pelas Assembleias Legislativas – mas se nelas houvesse oposição ao escolhido, cassava-se mandatos de deputados oposicionistas até garantir o número de votos a favor. Deixaram de ser eleitos prefeitos de capitais e de municípios considerados estratégicos, como portuários, e estâncias hidrominerais.

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Em 1974, prevendo a derrota ampla da Arena, Ernesto Geisel criou a figura do “senador biônico” – nomeado pelo governo. Nesse ano, deveriam ser eleitos dois senadores por estado, mas as eleições foram só para um (com ampla vitória da oposição) e os outros 22 (eram 22 estados) foram escolhidos pelo governo. O apelido “senador biônico” foi inspirado numa série de TV, chamada “O homem de 6 milhões de dólares” em que um homem é salvo da morte com implantes cibernéticos (tornou-se “homem biônico”) que lhe deram superpoderes, e ele tornou-se agente do governo dos EUA.

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Em 13 de novembro de 1980, o Congresso aprovou a volta do voto secreto para governadores e acabou com os senadores biônicos (nomeados pelo presidente).

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Em 25 de abril de 1984, votação da emenda das Diretas, no Congresso, que deu 298 votos a favor, 65 contra e 113 parlamentares ausentes, mas quem ganhou foi o contra: os votos a favor das diretas não atingiram o necessário, dois terços do total de parlamentares. Alguns políticos famosos participaram dos comícios pró-diretas, mas por baixo do pano trabalharam contra a sua aprovação, porque achavam que se houvesse eleição direta Leonel Brizola seria eleito.

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Em 21 de abril de 1997, o governo FHC conseguiu a aprovação da emenda da reeleição, com acusações de compra de votos de parlamentares. O próprio Fernando Henrique Cardoso foi o maior beneficiário… Pela tradição republicana decisões como essa não valiam para as eleições próximas, só as seguintes… Bom, alguns deputados confessaram ter recebido R$ 200 mil (quanto seria em valores atualizados?) para votar com o governo.

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Os primeiros países do mundo em que as mulheres adquiriram o direito de votar foram a Nova Zelândia (1893), a Austrália (1902) e a Finlândia (1906). Na Dinamarca e na Islândia, o voto feminino foi conquistado em 1915. Na Alemanha e no Reino Unido em 1918, nos Estados Unidos em 1920 e na Suécia em 1921. Na França, as mulheres só conquistaram o direito de votar e serem votadas no pós-guerra, em 1945.

Bêbado de comício, uma instituição!

Apreciador de comícios (muitos eram divertidos), coisa que praticamente deixou de existir durante a ditadura e voltaram depois, vi perderem a força com as campanhas televisivas, a não ser nas eleições municipais em cidades sem emissoras de TV. Passou-se a ignorar programas partidários, ideologias, ética, tudo, para ganhar uns minutos televisivos.

Agora, continua a briga por “minutos de TV”, e continua-se também a colocar no mesmo saco todo tipo de gente. Continuam não valendo questões éticas, programáticas ou ideológicas.

Mas tudo isso deve ser superado pelas campanhas em “mídias sociais” cheias de notícias falsas.

Acantonados em seus mocós, os políticos não precisarão mais mostrar a cara nas praças, fazer comícios, ter que encarar o eleitorado. Escapam, por exemplo, do bêbado de comício.

Já escrevi sobre bêbado de comício: ele fala alto durante os discursos, faz piada sobre as falas dos candidatos, desmente informações que eles dão, duvida da honestidade deles e das promessas que eles fazem.

Ulysses Guimarães dizia que o mais chato dos chatos era o bêbado de comício. Já Miguel Arrais, media a popularidade dos candidatos pela presença de bêbados e malucos em comícios. “Para ganhar”, dizia ele, “tem que ter bêbado e maluco no comício”.

Muitos mineiros concordavam com ele. Diziam: “Se o seu comício não tiver bêbado nem maluco, demonstra que você não tem prestígio”. Existe até um ditado sobre isso: “Não tem campanha sem comício nem comício sem bêbado”.

Isso parece ter se esgotado. Nas próximas eleições teremos provavelmente campanhas sem comícios. E daí já não vale também a ideia de que não tem comício sem bêbado.

Bem… A direita parece ter muito mais competência que a esquerda para manipular informações via mídias sociais, generalizar opiniões imbecis em cima dessas informações, influenciar ideias, movimentos e eleições.

Pode ser que meu pessimismo seja superado, não sei. Nossas esperanças podem variar conforme os acontecimentos. Eu mesmo já escrevi frases mais ou menos “positivas” e outras muito “negativas” sobre eleições. Lá pelo fim do século passado, escrevi algo talvez possa repetir agora: “Chega de intermediários: Satanás para presidente.

E já brinquei com certos candidatos: “Urna funerária, para o político perdedor, é aquela em que ele não tem nenhum voto (ou quase nenhum). Cada urna dessas representa a morte para ele”.

Boitempo nas eleições // Na nossa cobertura das eleições 2018 realizamos uma série de ações que buscam contribuir com a reflexão coletiva durante o período, entre as quais a publicação de textos inédito no Blog da Boitempo, vídeos na TV Boitempo e um serviço gratuito de indicações de leituras pelo WhatsApp, com curadoria da equipe editorial. Clique aqui para conferir.

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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2017, e-book). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças. 

9 comentários em Cultura inútil: Algumas curiosidades sobre eleições

  1. Rosimar Gonçalves // 11/09/2018 às 1:12 pm // Responder

    Aprendo muito com seus artigos… Valeu!!!

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  2. claudio reis vieira // 11/09/2018 às 1:50 pm // Responder

    Na lista do voto feminino faltou mencionar que, na Suíça – ora veja! – só em 1971 ele foi aprovado.

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  3. João Damah // 11/09/2018 às 4:38 pm // Responder

    Esta é do tempo do Adhemar de Barros num comício na Zona Leste, reduto do Jânio Quadros. Tentando rebater a sua famosa pecha de “político ladrão”, em cada auto defesa ele batia a mão nos bolsos do terno e dizia: “_ Me acusam disto, me acusam daquilo mas neste bolso nunca entrou dinheiro público!” A cada defesa de alguma acusação, sempre o retrucar com a batida da mão e a menção de que naqueles bolsos nunca tinha entrado dinheiro público. Lá pelas tantas do comício, um bêbado já enfesado…sempre o bêbado, grita em alto e bom som: “_ ´Tá de terno novo, hein Dr. Adhemar!”

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  4. Boa tarde amigo! Passou o filme na minha cabeça… infelizmente para q já sei o final…
    contava com seu otimismo para me reanimar! Abçs!

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  5. Beatriz Galvão // 11/09/2018 às 11:16 pm // Responder

    Muito bom!
    Teve também o Sarney comprando mais 1 ano de mandato depois da manobra para ele assumir sendo vice de um presidente que não assumiu (Tancredo).

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    • Beatriz Galvão // 11/09/2018 às 11:17 pm // Responder

      Muito bom!
      Teve também o Sarney “aprovando” mais 1 ano do seu mandato, depois da manobra para ele assumir sendo vice de um presidente que não assumiu (Tancredo).

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  6. Manzan Fausto // 13/09/2018 às 6:40 am // Responder

    Molto interessante questa retrospettiva nello scenario politico della Storia del Brasile. Documento fatto molto bene, il quale dovrebbe essere letto da tutti i cittadini brasiliani, per haver una presa di coscienza della realtà della politica e dei partiti e, soprattutto dei propri politico. Complimenti all’autore di questo bellissimo lavoro.

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  7. Nelson Machado // 14/09/2018 às 4:11 pm // Responder

    Olá Mouzar, é o Nélson, from Blog Alex Periscinoto. Ótimo artigo, arquivei pois tem infs que a gente apanha pra encontrar no Google. Só acho que, na minha discutível opinião, a referência, em pleno século 21, da Revolução Francesa, situando pensamentos de hoje como atrelados ao evento de 1789, estão ligeiramente caducos. O Lula e o PT esquerda? Caráio, rapaz! Mas o Lula se pendurou no saco do Maluf, do Collor, do Jader Barbalho, enfiou o Temer de vice que foi eleito legitimamente com a Dilma e, internacionalmente, fez boquetes no Fidel (quer direitista mais radical que o governo de Cuba que prende jornalistas, fez da ilha uma prisão proibindo a população de sair pro exterior, paga U$ 10,00 mensais de salário a médicos, enfim, não tem mais como pensar preguiçoamente em “direita” e “esquerda”. Isso é cacoete de teóricos europeus que, elegantemente, nos cafés de Paris ficam vomitando teorias falidas aqui (mês passado eu fui ao Vietnã, fiz a rota da guerra passando por Laos, Camboja e naveguei por 7 dias pelo Mekong parando em vilarejos miseráveis, mas hoje Ho-Chi-Min é uma Miami, com bancos americanos e europeus e Ferraris rodando pelas ruas. O Ho-Chi-Min tem um mausoléu mais cerimonioso que o Vaticano pra ver o defunto embalsamado, transformaram o vencedor da guerra num deus morto porque basta ver que o capitalismo americano venceu por lá. Todos “esquerdistas” do alto poder vietnamita estão milionários. São esquerda?). Super abraço Apesar do arcaísmo “direita X esquerda” , fruto dos anos 60, vc é muito bom. Curto sempre seus textos. Releio sempre o “Sta. Rita Velha Safada” .

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  8. Mouzar Benedito // 15/09/2018 às 12:19 pm // Responder

    Oi,Nelson,
    Obrigado pelos seus comentários. Eu também acho que muita gente de esquerda tem agido como direita. E muitos que se dizem de esquerda, na verdade não são ou são corrompidos pelo poder e pela grana. Com isso, fica um tanto diluída, em muitos casos, a “fronteira” entre a direita e a esquerda. Mas acho (ingenuidade) que ainda haverá um dia em que não estarei aqui) em que haverá uma esquerda autêntica, sem desvios… Sem utopias a vida fica muito besta.

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