Cultura inútil: Megans e Daianes: e se ser caolho virar moda?

De Einstein a Clarice, Mouzar Benedito reúne as melhores frases e ditados sobre moda e estilo!

Por Mouzar Benedito.

(Quantas meninas brasileiras receberão o nome de Meghan este ano? Não entendo bem esse fascínio pela realeza britânica. O casamento de Diane, mãe do príncipe que casou agora, rendeu um monte de Daianes brasileiras. Nomes entram e saem de moda por diversos motivos. Maíra foi um nome que explodiu na época do lançamento do romance de Darcy Ribeiro. E tem os nomes de personagens de telenovelas…)

De vez em quando eu penso: e se algum dia for moda as pessoas enxergarem de um olho só? Acho muito provável que um monte de gente vai mandar cegar um olho, para ficar na moda. O problema vai ser se, uns tempos depois, voltar a moda de enxergar com os dois olhos.

As modas vão e voltam. Agora tem isso de calça rasgada e há anos tatuagens enfeitam ou enfeiam moças e rapazes. Se alguém ler meu romance “Pobres, porém perversos”, escrito no início dos anos 1990 vai estranhar: um rapaz conhece num bar um sujeito cheio de tatuagens e tem a ingenuidade de achar que era um sujeito honesto.

Sim, era um estigma: quem usava tatuagem na época, se não fosse marinheiro, era presidiário. Não eram tatuagens artísticas, bonitas, como muitas que a gente vê hoje. Eram mais toscas.

No tempo da ditadura, procurávamos não ter nada no corpo que pudesse ser usado por um policial como uma prova de que “eu era eu mesmo”, pois corríamos o risco de ser pegos pela polícia política e quanto mais ela tivesse dificuldade para nos identificar, melhor. Agora, vejo pessoas que correm o risco de serem presas (e são) por roubos ou assassinatos exibindo tatuagens. Até se exibem nas redes sociais. Acho burrice. Lembro: não tem nada a ver como os motivos para nossas prisões ideológicas, mas continuo com a ideia de não adotar nunca essa moda. Tatuagem, jamais. Mas parece que somos poucos que pensamos assim. Moda é moda, e tatuagem está na moda.

Moda é uma coisa gozada. Roupas, cabelos, cores, palavras, ações, pensamentos, profissões, lugares, hábitos, nomes, ideologias… É uma coisa ampla. E vem desde a antiguidade.

Em tempos mais recentes, vejamos a barba. Em boa parte do século XX, a moda era raspar bem. Podia-se ter bigode, alguns usavam costeletas grandes, depois começaram a aparecer cavanhaque e, inspiradas na Revolução Cubana, barbas grandes. Homens cabeludos, que abandonaram os cabelos curtos e cheios de brilhantina, são mais ou menos da mesma época, mas por motivações diferentes. Vejo pessoas falando dos “cabeludos” da Jovem Guarda como se tivessem sido contestadoras, mas lembro-me bem que quando um pai conservador via o filho com aqueles cabelos estilo Roberto Carlos não ligava1 muito, podia até achar bom: o rapaz não era “de esquerda”, cabelos longos era uma moda que não incomodava. O que incomodava era ser barbudo: coisa de “comunista”!

Se antes eram cantores da Jovem Guarda que ditavam a moda dos cabelos de adolescentes alienados, e guerrilheiros que ditavam as barbas para rapazes de esquerda, depois passou a ser uma era dos jogadores de futebol, com cabelos descoloridos, moicano como Neymar e outras invencionices seguidas por um monte de gente.

Meu pai ficava incomodado por eu a aparecer barbudo quando ia visitar a família, no interior mineiro, mas o caso dele era outro. Barbeiro, dizia que eu servia de propaganda contra a profissão dele, pois na época fazia-se barba no barbeiro. Não me preocupava com a moda, eu tinha era preguiça de fazer barba (e tenho ainda). E brincava: feio por feio, sendo barbudo podiam pensar que sem barba eu não seria tão feio.

E comecei a usar botinas do estilo de tirar leite, que virou moda depois.

Em 1968, estava moda para homens e mulheres a calça Lee. Eu usava uma “calça rancheira” de um brim mais fino, não gostava daquele brim grosso, incômodo, e que não deixava passar ar. Brincava: “Calça Lee engarrafa peido”, quer dizer, o sujeito que usava, se peidasse, o cheiro não saía. À noite, quando tirava a calça vinha aquele cheiro rançoso.

Nessa época começou algo precursor das calças rasgadas de hoje: calça Lee desbotada. Vi muitas moças esfregando tijolo com sabão para desbotar e previ: logo vão vender calça já desbotada. E mais cara. E não deu outra. Assim como vendem calças rasgadas hoje em dia.

Usei gravata, mas não porque queria. Trabalhador de escritórios de grandes empresas quase sempre era obrigado a usar gravata, assim como os bancários. Entrei numa empresa que exigia, trabalhei lá durante dois anos e meio, depois fui ser técnico em contabilidade na Prefeitura de São Paulo, e lá também exigiam. Durei três anos e meio lá. Somando com os dois e meio anteriores, usei gravata durante seis anos. A mesma gravata. Nem o nó eu desfiz. Um ano me diziam: “Nossa, que gravata larga, fora de moda!”. Depois: “Legal sua gravata, está na moda”. Revezava-se a moda de gravata estreita e gravata larga. Ela entrou e saiu de moda várias vezes.

Bom… Outra coisa que de certa forma foi moda, e nisso entrei voluntariamente: fumar cachimbo. Fumei durante vários anos. Gostava.

E o vocabulário? No meio universitário, chamar alguém de revisionista podia ser considerado xingamento. Alienado também. Já nos meios “alienados” dos seguidores da Jovem Guarda, imitavam cantores, especialmente Roberto Carlos, falando que alguém era papo firme, usava a expressão “é uma brasa, mora”… Moças dessa turma, para falar que um rapaz era bonito, diziam que ele era “um pão”. Quem não gostava dessa expressão da moda (ou não era considerado “um pão”), rebatia: “Verdade. Pão, pra ser bom, tem que ser fresco”.

Um pessoal que puxava fumo gostava de falar devagar, e reduziam bastante o vocabulário. Se alguém fazia grandes considerações para alguns deles, a resposta podia ser “sssóóó”, falado lentamente. Sinal de aprovação. Conheci uma moça que quase só falava isso, pegou o apelido de Soninha Só.

Ah, quando estávamos bem, gostando de alguma situação, estávamos “numa boa”. Eu achava normal, mas meus ouvidos doem com a adaptação atual dessa expressão: “de boa”.

Remédios também têm moda. Numa época, o ipê roxo quase sumiu das matas brasileiras, porque sua casca era remédio pra tudo, especialmente câncer. Confrei foi uma planta usada para várias coisas, até bronzeamento do corpo.

Cachaça eu sempre gostei. Agora é moda. Pena que com isso ficou caríssima. Pinga boa custa uma grana tão alta que pobre não pode beber. E era bebida de pobre!

Na literatura, lembro-me que, como não tinha dinheiro, fui comprar livros numa “ponta de estoque” e levei, entre outros, um romance chamado “A hora dos ruminantes”, do goiano José J. Veiga. Paguei o equivalente a R$ 2,00 atuais por ele, li e fiquei admirado porque estava sendo vendido como encalhe.

Passaram-se uns anos, o “realismo fantástico” da literatura latino-americana virou moda e o mesmo romance teve reedições grandes, fez sucesso.

O realismo fantástico foi uma moda… Mas acho bem melhor do que modas posteriores da literatura, como o esoterismo e a autoajuda.

Enfim, usei calça boca de sino (não gostava, mas a moda era tão forte que não encontrava calça que não fosse desse modelo), mas calça apertada nunca gostei. Foi moda também usar calças sem bolso. Eu odiava e tinha muita dificuldade para achar modelos com bolsos.

E cores das roupas? Um cara que foi preso nos anos 1950 e saiu da cadeia em 1979 me contou que ima das coisas que ele mais estranhava eram as cores das camisas dos homens. Homens usavam camisas brancas ou de poucas outras cores não chamativas, a exceção era camisa preta, mas só para luto. De repente, lá por 1960, surgiu um tecido novo, o banlon, usado para fazer camisas. E a cor preferida era grená. E o Brasil ficou cheio de homens usando camisas com essa cor próxima do vermelho. Inacreditável

Uma moda feminina que eu achava horrorosa foi a de calças que não chegavam na cintura, ficavam no meio da bunda. E apertadas, faziam uma “cintura” na bunda. Mulheres gordinhas, em vez de ter “duas bundas” (quer dizer, uma bunda com dois lados), ficavam com quatro bundas.

Falando em bunda, teve a chegada do biquíni “fio-dental”, com uma tira mal cobrindo o fiofó. No Nordeste, ironizavam chamando isso de “cordão cheiroso”. Eu brincava dizendo que lutadores de sumô já usavam essa moda antes, só que, com um bundão daqueles, o “fio-dental” era bem mais grosso.

Fio dental ficava bem em mocinhas, novinhas, com bundinhas bonitinhas, mas vi no interior mulheres cinquentonas usando. Conversando, soube que elas achavam que em São Paulo todas as mulheres usavam aquilo. Davam a impressão que acreditavam que mulheres andavam pelas ruas paulistanas, pegavam ônibus, faziam compras e iam a bancos usando fio-dental.

Bom, tem moda para tudo, como já disse. Lembro da excitação que provocava a minissaia em seu início, a adoção de tecidos sintéticos que não enrugavam, então não era preciso passar, a chegada das sandálias havaianas… Roupas masculinas de casimira azul marinho, preta e às vezes marrom, e de linho branco também, sendo trocados por tecidos sintéticos e pela já citada calça Lee.

Nas fotos antigas de São Paulo os chapéus pareciam ser obrigatórios para homens, depois foram desprezados, agora voltando – gosto deles.

Na música, aí não dá. Pagode cantado em tom choroso, axé… Meus ouvidos não suportam especialmente o que chamam de sertanejo universitário. Mas quando falo que meu gosto musical diverge do pessoal que gosta disso, sou ameaçado. Aliás, esse comportamento fascista agora é moda também, e vale para tudo. É uma ideologia que avança. O Brasil está cheio de “liberais” que querem matar quem discorda deles. Tomara que não dure.

Enfim… As modas estão aí, indo e voltando. Espero não ver a que profetizei, de enxergar por um olho só. Mas tudo é possível.

Selecionei frases sobre moda. Quem louva a moda certamente selecionaria outras. Aí vão elas.

Oscar Wilde: “A moda é uma variação tão intolerável do horror que tem de ser mudada de seis em seis meses”.

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Oscar Wilde, de novo: “A moda é o que a gente traz, o que está fora de moda é o que trazem os outros”.

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Millôr Fernandes: “Quando, afinal, nos acostumamos com uma moda é porque ela já está completamente em decadência”.

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Balzac: “A moda é um ridículo sem objeção”.

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Ditado popular: “Os doidos inventam a moda e o povo a segue”

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Lauren Hutton: “A moda é o que os estilistas te oferecem quatro vezes ao ano. Estilo é o que tu escolhes”.

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Orson Welles: “Estilo é saber quem você é, o que quer, e não se importar com a opinião dos outros”.

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Luis Buñuel: “A moda é a manada; o interessante é fazer o que nos dá vontade”.

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Coco Chanel: “Sou contra a moda que não dure. É o meu lado masculino. Não consigo imaginar que se jogue uma roupa fora só porque é primavera”.

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Júlio Dantas: “Na sua fúria de masculinização, a mulher começou por nos encantar, e (estejamos certos) há de acabar por nos bater”.

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Júlio Dantas, de novo: “Só permanecem na mulher as modas que agradam aos homens”.

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Godofredo de Alencar: “A moda foi feita para as pessoas que prescindem de ser olhadas com atenção”.

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Godofredo de Alencar, de novo: “Deus é sempre representado com grandes barbas. O excesso capilar é afinal o auge visível da vaidade de quantos têm a pretensão de melhorar o mundo”.

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Molière: “Todos os vícios, quando estão na moda, passam por virtudes”.

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Einstein: “Quando se aceita que o universo é algo que se expande rumo a um infinito a partir do nada, usar listrado com xadrez fica fácil”.

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Marlene Dietrich: “Rimos da moda de ontem, mas nos emocionamos com a de anteontem, quando está em vias de se converter na de amanhã”.

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Marquês de Maricá: “A opinião pública é sujeita à moda, e tem ordinariamente a mesma consistência e duração que as modas”.

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George Orwell: “Quando se diz que um escritor está na moda, isso quer dizer que ele é admirado por menores de trinta anos”.

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Jules Renard: “Para ser original, basta imitar os autores que já estão na moda”.

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François La Rochefoucauld: “Louvam-se ou criticam-se muitas coisas porque está na moda louvá-las ou criticá-las”.

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Eugène Ionesco: “Queremos ser do nosso tempo é estarmos ultrapassados”.

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George Santayana: “Para uma ideia, é de péssimo agouro estar na moda, pois significa que em seguida tornar-se-á antiquada para sempre”.

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Ernesto Sábato: “As modas são legítimas nas coisas menores, como o vestuário. No pensamento e na arte, são abomináveis”.

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Berilo Neves: “O decote é como a vigia dos navios: um pequeno orifício por onde se enxerga o oceano, inclusive as praias”.

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Ditado popular: “Segue a moda ou abandona o mundo”.

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Roquette Pinto: “A luta contra o clima, dando ao termo sua extensão maior, gerou o vestuário protetivo, que se não deve confundir com a ornamental, nascido de outras influências”.

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Karl Weber: “Um louco pode fazer mil loucos, mas um estilista pode fazer milhões”.

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Ditado popular: “A moda é o tormento dos sábios e o ídolo dos loucos”.

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Emílio de Meneses: “As mulheres andam de luvas para não pintar os cabelos da mão…”.

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Schiaparelli: “As mulheres se vestem igual em todo o mundo: vestem-se para molestar outras mulheres”.

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Alberto Ramos: “Que lindas cores tem! / soberba criatura. / Só lhe falta um letreiro: ‘Atelier de pintura’.”

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Medeiros e Albuquerque: “Toda a teoria do vestuário feminino é esta: uma senhora, honesta ou não, só se veste para nos dar a perceber como ficaria se se despisse”.

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Leon Eliachar: “Com a primeira folha de parreira surgiu o primeiro problema da moda feminina: “Onde colocá-la?”.

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Audrey Hepburn: “Algumas pessoas sonham com piscinas. Eu sonho com armários”.

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Clarice Lispector: “Um coração como poucos. Um coração à moda antiga”.

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George Bernard Shaw: “A moda, afinal, não passa de uma epidemia induzida”.

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Leonardo da Vinci: “A simplicidade é a maior sofisticação”.

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Iris Apfel: “Quando você não se veste como os demais, não tem que pensar como os demais”.

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Charles Bukowski: “Eu estou velho quando a moda é ser jovem. Eu choro quando sorrir está na moda”.

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Pitigrilli: “A moda é a luta entre o instinto natural de se vestir e o instinto natural de se desnudar”.

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Betsey Johnson: “As moças não se vestem para os rapazes. Elas se vestem para si mesmas e, claro, para as outras moças. Se elas se vestissem para os rapazes, andavam nuas o tempo todo.

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Anatole France: “Só os homens que não se interessam por mulheres interessam-se pelas suas roupas. Os homens que realmente gostam de mulheres nem percebem o que elas estão usando”.

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Eu: “Muito melhor que uma mulher vestida na moda é uma pelada na cama”.

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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2017, e-book). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças. 

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