Edson Teles: Eu voto Dilma!
[Márcia Belarmina da Paixão, na ocupação Copa do Povo]
Por Edson Teles.
No dia 26 de outubro, mais de 130 milhões de brasileiros terão a obrigação de escolher o próximo governo do país. Ainda que seja obrigatório o voto no sistema político brasileiro, cerca de 40 milhões dos que são lançados neste passo formal da democracia simplesmente não escolheram nenhuma das opções em jogo no primeiro turno. Muitos desses votos são considerados inválidos, apesar de registrarem, no mínimo, um descompasso entre boa parte dos brasileiros e o sistema político partidário.
Dentre eles, foram quase 6% dos eleitores brasileiros que anularam seus votos. Estive neste grupo no primeiro turno. Não localizei entre as candidaturas programa partidário com proposição de transformação radical da desigualdade social e da posse fraudulenta das riquezas do país, de discussão das formas de decisão política e da lógica de governo reinante no Estado de Direito brasileiro e nenhuma contestação contundente da militarização da política e da construção de uma democracia de segurança, violenta e repressiva, como vista nos últimos dois anos.
Votei nulo não para me colocar fora da luta política enfrentada dentro das instituições do Estado e do âmbito da democracia representativa. Foi a tentativa de registrar um protesto não ao jogo político que está sendo disputado, mas à ausência de um projeto de transformação profunda da realidade brasileira. Se este jogo está em aberto é necessário agir também dentro de sua lógica de conflito. O governo do sofrimento social e a abertura de possibilidades outras de ação política são questões fundamentais das atuais eleições.
E hoje, às vésperas da votação do segundo turno, o jogo em andamento apresenta-se com outras regras, nas quais se coloca a opção entre dois campos de forças da luta política institucional extremamente opostos.
É por esta razão que declaro meu voto em Dilma Rousseff.
Deixar de tomar uma posição frente ao candidato da direita brasileira, simulacro de uma política liberal e de mudança, significaria para esta minha leitura do jogo em disputa deixar vencer a opção do completo bloqueio de qualquer possibilidade criativa ao agir político, via a institucionalização de um governo fascista.
Para ser breve nesta declaração, atentemos para suas proposições sobre a reforma do Código Penal e de defesa do aprofundamento da política de encarceramento em massa, já vigentes desde anos 70 e cujo alvo é a juventude negra e pobre das periferias, indicando um modelo violento e racista da candidatura tucana.
Esta forma de governo das populações pobres não é projeto exclusivo deste candidato, nem mesmo pertence a um partido ou outro, mas à uma lógica de governo da elite econômica e política cujo projeto é o de uma democracia de roupagem liberal, mas de ação de controle da política e das formas de vida que resistem ao modelo capitalista de sociedade. Contudo, a candidatura tucana seria a estratégia mais aberta de repressão aos movimentos sociais e de controle dos processos de produção de subjetividades, como registrados nas manifestações de junho de 2013, ou nas ocupações de espaços e imóveis abandonados ou sem uso social.
Só para ficar em um exemplo, quando o MTST ocupou o terreno batizado de Copa do Povo em São Paulo, no primeiro semestre de 2014, iniciou-se o processo político que terminaria com uma grande vitória dos movimentos sociais, por meio da negociação entre governo federal e ocupantes concordando com a construção de moradias populares naquele espaço. O modelo tucano, visto poucos anos antes, foi o da desocupação de Pinheirinho, com a violência desmedida da Polícia Militar mesmo diante de liminares da Justiça adiando a operação de despejo.
A aliança heterogênea da candidata Dilma apresenta contradições que abrem maiores campos e possibilidades de conflitos políticos dentro de uma lógica menos agressiva aos movimentos sociais e às reivindicações das minorias. Para combater o projeto autoritário de democracia que ganha terreno em nosso país, a candidatura do PT à presidência apresenta aos movimentos sociais e em luta uma brecha maior de construção de ações criativas de resistência e combate à militarização da política.
Voto em Dilma Rousseff não por acreditar que seu segundo governo resolverá os principais problemas nacionais. Voto em Dilma por uma estratégia de resistência em favor de uma democracia efetiva e radical. Derrotar o projeto fascista tucano é saber que o dia seguinte às urnas será mais um dia de luta.
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Especial Eleições: Artigos, entrevistas, indicações de leitura e vídeos para aprofundar as questões levantadas em torno do debate eleitoral de 2014, no Blog da Boitempo. Colaborações de Slavoj Žižek, Mauro Iasi, Emir Sader, Carlos Eduardo Martins, Renato Janine Ribeiro, Edson Teles, Urariano Mota e Edson Teles, entre outros. Confira aqui.
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Edson Teles é autor de um dos artigos que compõe a coletânea Occupy: movimentos de protesto que tomaram as ruas, que tem sua versão impressa vendida por R$10 e a versão eletrônica por apenas R$5 (disponível na Gato Sabido, Livraria da Travessa e outras).
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Edson Teles é doutor em filosofia pela Universidade de São Paulo (USP), é professor de filosofia política na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Pela Boitempo, organizou com Vladimir Safatle a coletânea de ensaios O que resta da ditadura: a exceção brasileira (2010), além de contar com um artigo na coletânea Occupy: movimentos de protesto que tomaram as ruas (2012). Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às quartas.
Nossa, muitíssimo obrigado, eu estava em uma dúvida tremenda, sobretudo após o artigo do Mauro Iasi, e então surge este texto brilhante e me cura de todas minhas pequenas e desprezíveis incertezas. “A aliança heterogênea da candidata Dilma apresenta contradições que abrem maiores campos e possibilidades de conflitos políticos dentro de uma lógica menos agressiva aos movimentos sociais e às reivindicações das minorias.” Quanta profundidade! Estou irreversivelmente convencido, domingo é voto na Dilma sem a menor hesitação.
É isso o que desejam ouvir? É para isso que a esquerda de hoje está em em luta? Quanta preguiça intelectual…Estou convicto que em quatro ou oito anos alcançaremos uma Suécia,estou certo disso… PT rumo ao futuro!
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