Não é a Copa, imbecil, são as eleições!

Por Emir Sader.

A imagem do Brasil foi projetada internacionalmente nas ultimas décadas de três maneiras distintas: o Brasil da ditadura militar, o Brasil do neoliberalismo e o Brasil do Lula. O da ditadura tinha a cara do “milagre econômico” e a da repressão. Cada campo político exaltava um lado. No neoliberalismo, da mesma forma, o Brasil foi retratado de modelo que parecia se consagrar a fracasso.

O Brasil do Lula foi a imagem mais difundida do país em muito tempo. Depois de estar apagado na mídia internacional por um bom tempo, de repente, para surpresa geral, no meio da era neoliberal, o pais mais desigual do mundo passou a ser a referencia na luta contra a fome e o modelo de sucesso no combate à desigualdade. É uma imagem que incomoda muito. Antes de tudo, às hostes neoliberais, cujos princípios são negados abertamente pelo Brasil, que faz residir nessa negação exatamente o seu sucesso. E incomoda aos setores da ultra-esquerda, que já tinham cantado a “traição” do Lula e do PT, no começo do governo e tiveram que engolir a seco o sucesso popular interno e internacional do Brasil.

Desde o ano passado, foi se desatando uma gigantesca campanha internacional contra o Brasil, que busca desconstruir esse Brasil que incomoda a esses setores. Tratou-se de dizer que, com as manifestações de junho do ano passado, ruía todo o castelo construído no Brasil. Não poucos – da direita à ultra-esquerda, aqui e lá fora – se valeram da palavra “farsa”, como se tudo o que acontece no Brasil desde 2003 fosse uma montagem, que finalmente se desmontava. Houve até quem prognosticasse que o país entrava numa “fase de rebeliões”, fazendo dos seus desejos realidade. Coisas presas na garganta vieram pra fora sem nenhuma auto-censura, acreditando que a realidade era redutível às suas palavras.

A persa de apoio do governo incentivou a oposição a acreditar que “o ciclo do PT havia terminado”, levando forças da própria base de apoio do governo a acreditarem que sua hora havia chegado. Puseram seus melhores ternos e foram para a janela a ver passar o féretro do governo.

Contam esses com a formidável maquinaria neoliberal global, que tem no The Economist, no Financial Times, no The Wall Street Journal, no El Pais, suas vozes cantantes. Junto com a anunciada – e nunca cumprida – desaceleração da economia chinesa, agregaram uma suposta recessão dos Brics a uma também imaginária recuperação dos países do centro do capitalismo. Tudo contra todas as evidencias, que os desmentem em números, todos os meses.

Faz parte dessa contra-ofensiva da direita a campanha orquestrada contra o Brasil. Para não citar a cascata de calúnias e mentiras – que incluíam desde o assassinato de crianças em Fortaleza e uma greve geral de todas as polícias estaduais –, basta recordar que o Ministério de Relações Exteriores da Alemanha classificou o Brasil como “pais de alto risco”, categoria usada para países com conflagração armada, com insegurança total, como Nigéria, Sudão, Ucrânia.

Nada fez com que diminuísse a procura de pacotes para a vinda ao Brasil, nem na Alemanha, nem na França como atestou o Veríssimo de Paris, depois de alinhar algumas das barbaridades que falam do Brasil por lá.

É uma ofensiva intencionada, pelo que o Brasil do Lula os incomoda. Aqui dentro, com a Copa coincidindo com as eleições, a mídia – mais do que nunca assumida direção partidária da oposição – se joga inteiramente nas denuncias sobre a Copa e no eco desmesurado de qualquer mobilização que, de alguma forma, possa aparecer ligada à Copa, na expectativa de que possam desgastar a candidatura da Dilma.

Se valem de manifestações de distintos setores, algumas deles em que alguns, de forma oportunista, buscam os holofotes da mídia nacional e internacional, para gerar uma imagem de descontrole social. Contam com a mídia internacional afoita de notícias sensacionais e com a operação política global da direita contra o Brasil.

Não fosse ano eleitoral e a circunstancia de que a direita deve ter sua quarta derrota consecutiva, a mídia não estaria tão assanhada assim. Não estaria – até as eleições, claro – dando cobertura e sobredimensionando qualquer manifestação existente ou por haver. Afinal, no marco geral de diminuição sistemática das tiragens e da audiência, a Copa seria um bom tema para diminuir esse ritmo de queda.

Mas, não é a Copa, imbecil! É a eleição presidencial. É a perspectiva provável de reeleição da Dilma, ainda mais com a possibilidade de um retorno do Lula em 2018. Isto é o que produz o desespero da direita nacional e dos seus aliados internacionais. Não olhem para o dedo que aponta a lua, olhem para a lua. A questão política central este ano não é a Copa, são as eleições.

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Confira o dossiê especial sobre a Copa e legado dos megaeventos, no Blog da Boitempo, com artigos de Christian Dunker, Mike Davis, Mauro Iasi, Flávio Aguiar, Edson Teles, Jorge Luiz Souto Maior, entre outros!

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Emir Sader nasceu em São Paulo, em 1943. Formado em Filosofia pela Universidade de São Paulo, é cientista político e professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). É secretário-executivo do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Clacso) e coordenador-geral do Laboratório de Políticas Públicas da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Coordena a coleção Pauliceia, publicada pela Boitempo, e organizou ao lado de Ivana Jinkings, Carlos Eduardo Martins e Rodrigo Nobile a Latinoamericana – enciclopédia contemporânea da América Latina e do Caribe (São Paulo, Boitempo, 2006), vencedora do 49º Prêmio Jabuti, na categoria Livro de não-ficção do ano. Colabora para o Blog da Boitempo quinzenalmente, às quartas.

14 comentários em Não é a Copa, imbecil, são as eleições!

  1. Nossa, Emir Sader. Nenhum apologista do ex-partido dos trabalhadores faria uma defesa tão alucinada da situação brasileira como você. Sinceramente, às vezes é difícil entender em que país você vive. Será que o problema é a direita? Ou é a saúde pública em frangalhos, o subsídio crescente para o agronegócio, a quase extinção dos assentamentos, as reformas da previdência pública (2003 e a criação do FUNPRESP), a montanha de transferência de recursos PÚBLICOS para a farra dos bancos, a educação agonizante com a escolha de financiamento PÚBLICO de instituições privadas de deseducação, o colapso de mobilidade urbana fomentado pelos excessivos subsídios às montadoras brasileiras e a opção descarada pelo estímulo em transporte individual ao invés de melhoria de serviço público de transporte coletivo?
    Ou talvez seja a redução do padrão de vida da classe média às custas de grandes incentivos para o grande capital, com uma ínfima diminuta parcela de destinação de recursos para as classes miseráveis (cerca de 2%)? Discordo completamente de sua opinião, e acho que o partido dos trabalhadores, POR SER DOS TRABALHADORES APENAS NO NOME E NÃO NA PRÁTICA, vai sofrer uma terrível derrota em 2014 e vai tornar a vida de uma esquerda fragmentada ainda mais difícil. O legado do PT – a DESTRUIÇÃO DA ESPERANÇA POPULAR NA ESQUERDA – será um fardo histórico pesado para todos os militantes.

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  2. Falou e disse, Professor! Parabéns!

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  3. Piragibe Silva Borges // 06/06/2014 às 12:10 am // Responder

    Perfeito, professor Emir. O ufanismo do The Economist é hilário, dado o seu conceito de jornal sério e conservador.

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  4. maria lucia // 06/06/2014 às 9:53 am // Responder

    é uma ofensiva intencionada contra o que o Brasil de Lula e Dilma os incomoda, não?

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  5. Mariza Bertoli // 06/06/2014 às 4:34 pm // Responder

    Meu caro Emir. Parabéns por essa declaração corajosa e necessária!

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  6. Carlos J. R. Araújo // 06/06/2014 às 5:58 pm // Responder

    Parabéns, Prof. Emir, principalmente pela ênfase do seu raciocínio. Para os “surdos”, às vezes é preciso “gritar”.

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  7. Flavio botelho junior // 06/06/2014 às 10:29 pm // Responder

    Querido EMIR SADER, para ter mais dados sobre sua competente matéria recomendo a todos ler no site pravad.ru ,com quem o principal assessor do candidato do psdb, eu me recuso escrever seu nome, o sr arminio fraga conversa com o mega especulador gorge soros, que publicamente declarou que ajudou com dinheiro para os nazista darem o golpe na Ucrânia, e agora elegeram um oligarca indicado pelo EUA, e os judeus e Israel em um silencio absoluto, Vergonha!!. não tenho duvidas que as mesma ongs que distribuíram dólar para os nazifascistas na Ucrânia também fazem o mesmo no BRASIL,e esse tal Armínio fraga não era empregado do gorge soros, hummmm?,e depois de trabalhar no governo de FHC do psdb, agora vejam só ele é dono de banco aqui no Brasil, hummmmmm!!!!!!!!.

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  8. inez santos // 07/06/2014 às 4:34 am // Responder

    BRILHANTE ! Pena que alguns sejam contra nosso país em prol do Império que nos ataca!!!!

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  9. Chorei de alegria quando o PT finalmente ganhou as eleições. Agora choro de tristeza por ter acreditado e votado nele! Jj Aristo definiu bem o Brasil atual!!

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  10. E o que dizer para o pessoal do MTST e da ocupação copa do povo?

    Em recente entrevista para o site Outras Palavras um dos líderes do movimento esboça uma clareza fantástica do momento político que vivemos hoje…
    Com muita cautela Boulos formula seu discurso contra o governo federal, muito claramente um leitor de Gramsci ele também sabe que a direita tende a se apropriar das insatisfações que o povo põe nas ruas (como foi em junho após a vitória do MPL)…. não podemos negar o que foi feito pelo PT nesse país, não se trata de acusar o Lula de traição… todos os setores mais à esquerda reconhecem o papel fundamental que o PT teve, mas as pessoas querem mais e o ‘reformismo fraco’ do PT já deu o que tinha que dar… não podemos ficar imobilizados pelo medo dos conservadores historicamente organizados, organizemo-nos…temos que criar um novo ciclo na esquerda…
    “nenhuma sociedade se coloca problemas sem que existam condições necessárias e suficientes para sua solução, ou sem que essas condições estejam ao menos em via de aparecer ou de se desenvolver”

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    • Exatamente Lucas, o desenvolvimento socio-economico do PT deu que tinha que dar. Reduziu a miséria e a pobreza como nunca se fez em 500 anos de história do Brasil. Mas isso não é suficiente.
      Precisamos entrar num NOVO CICLO HISTÓRICO!
      E infelizmente para uns e felizmente para outros, o Partido dos Trabalhadores é o único movimento nacional capaz de proporcionar esse novo ciclo. Mas claro, não de uma forma sectária, mas com diálogo e participação popular.
      REFORMA POLÍTICA JÁ! REFORMAS DE BASE JÁ!

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  11. Como o neoliberalismo não existe, bem como a direita no Brasil todo a artigo cai por terra ao perder seu suposto embasamento. Em tempo: o Brasil não é do Lula é dos BRASILEIROS

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  12. O véio tá com pobreminha…

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