Almas indomadas
Por Roniwalter Jatobá.
Os fantasmas estão cada vez mais ousados. Vaivém eles aparecem em notícias pelo mundo afora. A mansão Akasava, em Tóquio, Japão, é um lugar assombrado. Moradores relatam ter visto espectros em pé ao lado de suas camas e sentido mudanças bruscas de temperatura em seus quartos. Puckley, uma pequena vila em Kent, Inglaterra, não fica atrás. Ali vários fantasmas aparecem à luz do dia, com destaque para um ladrão de carruagens, uma cigana que morreu queimada viva e dois enforcados.
São Paulo também tem suas almas penadas. Em geral, surgem em prédios antigos, pois ninguém nunca soube que procurem abrigo em construções modernas, com cheiro de novas e sem história de vida e de morte.
A Câmara Municipal, no Viaduto Jacareí, já foi palco de frequentes aparições. Em seus corredores, funcionários da Casa já cruzaram com fantasmas. Numa manhã de maio de 1991, a chefe da faxina chegou à biblioteca, que estava trancada. Pela divisória de vidro avistou uma senhora sentada e lendo, tranqüilamente, um jornal. Logo, chamou um segurança. Ao abrirem a porta, a leitora desapareceu como num passe de mágica.
Já em março de 1996, um encanador foi chamado para consertar um vazamento no oitavo andar. Era quase dez horas da noite. De repente, surgiu uma mulher vestida de noiva, que caminhou em sua direção. O funcionário não esperou o gélido beijo nupcial.
Há outros retiros para as assombrações paulistanas. O Teatro Municipal, inaugurado há mais de um século, em 1911, é um deles. Em suas galerias subterrâneas acumulavam-se velhos cenários – e fantasmas de óperas passadas. Outro é a antiga sede da Light, construída em 1929, na Rua Xavier de Toledo. Um falecido chefe da empresa canadense já foi visto altas horas da noite rondando nos andares do prédio. Depois que virou Shopping Light, pode ser que os fantasmas tenham procurado outro abrigo.
Nunca vi almas de outro mundo. Sei que na São Paulo dos anos 1920 eles marcavam presença até mesmo em logradouros públicos. Certa vez, já tarde da noite, o condutor e o cobrador de um bonde da Light faziam sozinhos a última viagem de volta do bairro da Casa Verde. De súbito, à luz do farol, avistaram um vulto atravessado na linha. Rapidamente, pararam para prestar socorro. Ao descerem, a surpresa: não havia ninguém ali.
Apavorados, pediram a proteção de são Benedito e, à toda, apressaram o bonde rumo ao centro. Depois desse dia, em toda última viagem, eles não cobravam mais a passagem de negros – uma promessa feita ao santo de devoção – exceto, é claro, quando o fiscal da Light estivesse por perto.
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Roniwalter Jatobá nasceu em Campanário, Minas Gerais, em 1949. Vive em São Paulo desde 1970. Entre outros livros, publicou Sabor de química (Prêmio Escrita de Literatura 1976); Crônicas da vida operária (finalista do Prêmio Casa das Américas 1978); O pavão misterioso (finalista do Prêmio Jabuti 2000); Paragens (edidado pela Boitempo, finalista do Prêmio Jabuti 2005); O jovem Che Guevara (2004), O jovem JK (2005), O jovem Fidel Castro (2008) e Contos Antológicos (2009). Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às sextas-feiras.
Curto histórias de fantasmas, e, aliás, acredito que existam sim. Porque eu vi (e com a testemunha de minha irmã) um parente falecido aparecendo pra nós. Pra mim, há muita poesia nas histórias de fantasmas. Provam que a vida não é tão irremediavelmente banal. Gostei da crônica. Parabéns, Jatobá.
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Roni….assombração mesmo e em BSB KKKKKKK.ABRACO.
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