B de bassora ou de behaviorístico?

13.04.24_Mouzar Benedito_B de bassora ou de behaviorísticoPor Mouzar Benedito.

“Atenção pessoar… Já vai saí a jardineira pra Parmitar, Santa Rita de Carda, Carda e POÇOS DE CALDAS.”

Era assim mesmo a pronúncia do locutor da rodoviária de Pouso Alegre, garantem muitas pessoas que passaram por lá nos tempos das jardineiras. L nas palavras pessoal, Palmital e Caldas virava R… E o s do final das palavras sumia. Era Carda, mesmo. Mas enchia a boca para pronunciar corretamente POÇOS DE CALDAS.

Lembro-me disso toda vez que ouço aquela voz de aeroporto informando sobre voos. E também quando alguém vai ditar alguma coisa que tenha letras, algum código. Por exemplo: CMG… Antes se falava C de casa, M de mesa e G de Gato, numa situação dessas, mas agora falam direto: casa, mesa, gato…

Um dia, há tempos, fiquei imaginando um locutor como o da rodoviária de Pouso Alegre de antigamente soletrando siglas ou palavras. Vamos supor BDL. Provavelmente, diria B de bassora (vassoura), D de doçante e L de leição pra presidente.

Imaginei, então como ficaria o alfabeto inteiro:

A de Arnesto
B de bassôra
C de Sebastião
D de doçante
E de eta nóis
F de Chico
G de jerimum
H de agachado
I de iscola
J de lajota
K de cavalo
L de leição
M de mó di quê?
N de Nossinhora Parcida!
O de hômi
P de bereba
Q de Quelemente
R de arrevortado
S de é esse aí
T de tenção, gente, presta tenção…
U de u qui é, u qui é…
V de vrido
W de Uosto (Washington) e Várti
X de chispa daí
Y de psilone mesmo, ara, que letra besta!
Z de zoio, zunha, zoreia e zuvido

Mas e se fosse o contrário, um cara que gosta de mostrar erudição? Suponhamos, PNF… Ele poderia dizer P de pugnacíssimo, N de neuroipofisário e F de frenicectômico.

Vamos imaginar mais, com o mesmo erudito, deixando de lado essas letras já citadas. Suponhamos ABCD. Seria talvez A de antipoliorcética, B de behaviorístico, C de cnidosporídeo e D de dacriocistostomia.

Continuamos com EGHI. Sugeriria a ele E de exopterigoto, G de ginglimostomatídeo, H de hexilresorcinol e I de ixociflose.

Seguindo o alfabeto, para JKLM, poderia ser J de jargonografia, K de kerkegaardianismo, L de lepdopterologista e M de megaquiróptero.

E vamos em frente… OQRS ficaria bem com O de oftalmoxistro, Q de quilooersted, R de recurvirrostrídeo e S de septenvirado.

Para TUV, ele poderia ser bem didático: T de teopnêustico, U de uzbesquistanês e V de vasovasostomia.

Para terminar, restam WXYZ, letras que merecem ser esclarecidas assim: W de wycliffista, X de xi-tsungulo, Y de yeatsiano e Z de zwinglianismo.

O que acham? Bem, quando começo a pensar besteiras, é difícil parar. Continuei então, por falar em besteira, imaginando alguém que “só pensa naquilo”. Como soletraria? Aí tive uma dificuldade, pois nas gírias relacionadas a isso não encontrei palavras iniciadas por K, W e Y, reintroduzidas (epa!) no nosso alfabeto. Mas pulando essas, vejam como soletraria o safado:

ABCDE poderia ser A de afogar o ganso, B de balançar a roseira, C de chamuscar o bombril, D de dar um tapa no beiço da cabeluda, e E de esfolar a piaca.

FGHI certamente seria F de fazer neném, G de guardar o santíssimo, H de honrar o baita e I de invadir a Tchetchênia.

JLMN seria soletrada como J de jogar as pedrinhas, L de lustrar o jequitibá. M de molhar o biscoito e N de noite do iguana.

OPQR… bom, vamos lá: O de orelhar uma moça, P de pôr a escrita em dia, Q de queimar incenso no altar de Vênus, e R de rala e rola.

STU dá umas leituras interessantes: S de suar juntos, T de trocar o óleo, e U de usar o playground.

Encerrando, VXZ não é fácil, mas dá para soletrar também: V de vestir a peruca no careca, X de xuxar a borracha e Z de zurzir os crocos.

Bom, vou para por aqui. Chega de sem-vergonhice.

***

Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996) e Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças. 

Deixe um comentário