O sapo Gonzalo em: Bem distante da folia

13.02.08_Luiz Bernardo Pericás_O sapo Gonzalo em bem distante da foliaPor Luiz Bernardo Pericás.

O ano apenas começou e o sapo Gonzalo já está exausto! Como o caríssimo leitor está careca de saber, o saltitante argentino detesta o Carnaval. Por isso, resolveu sumir das vistas do público enquanto durar o reinado de Momo. Mas esse não foi o único motivo. Quando soube que o tal Renan foi eleito para a presidência do Senado, ficou com o estômago embrulhado. E na Câmara dos Deputados… outro ladrão profissional. Miséria! Os mesmos bandidos e salafrários de sempre…

Nosso Gonzalucho, de saco cheio de tanta falcatrua e sem paciência para aturar os foliões, decidiu ir para bem longe. Pelo que dizem os boatos, cochichados (ou coaxados) por aí, ele foi se esconder em alguma caverna, lagoa ou pântano, onde ninguém poderá encontrá-lo por alguns dias. Mas, como no ano passado, o batráquio entediado deixou uma seleção musical de primeira para você, que passa o olho neste texto. Como antídoto às batucadas infernais que poluem nossos ouvidos periodicamente, ele escolheu desta vez seis canções, que vão do folk ao mais puro rock’n’roll. Se é que isso é possível!

A lista começa como um clássico de Sammy Walker, “Catcher in the Rye”. Não, caro colega, não se trata de Bob Dylan, ainda que o estilo e a voz sejam parecidíssimos. Walker, um folkie tardio nascido em Atlanta, Georgia, lançou em 1975 seu álbum Song for Patty (no qual contava a história de Patty Hearst, que se tornou guerrilheira urbana e assaltante de bancos após ser sequestrada pelo Exército Simbionês de Libertação), mas não obteve grande sucesso. Foi produzido inicialmente por Phil Ochs, e depois, por Nick Venet. Alguns poucos LPs se sucederam, também sem maior êxito, e em seguida, períodos longos de ausência dos estúdios. Em 2008, retornou ao mundo musical e gravou um novo disco, Misfit Scarecrow, que tem recebido críticas favoráveis da imprensa. E continua se parecendo com Dylan!

A próxima faixa é “For What It’s Worth”, da legendária banda californiana Buffalo Springfield. Formada em Los Angeles, em 1966, lançou seu primeiro Long-Play no ano seguinte. Mesmo tendo durado apenas dois anos, causou enorme impacto na história do rock, e seus mais conhecidos integrantes, Stephen Stills e Neil Young, teriam enorme destaque em suas carreiras solo. Recomendamos também “On The Way Home”, “Bluebird”, “Go and Say Goodbye” e “Rock and Roll Woman”.

Em seguida, os Animals aparecem, com a melhor versão ever recorded de “House of the Rising Sun”, segundo single da banda, que chegou ao número um das paradas dos Estados Unidos no verão de 1964. O conjunto mais influente da British Invasion contava com um dos maiores vocalistas de R&B, blues e soul que se tem notícia, o carismático e inigualável Eric Burdon! “Don’t Let Me Be Misunderstood”, “We Gotta Get Out of This Place”, “See See Rider” e “It’s My Life” são outros hits memoráveis do grupo.

Bruce Springsteen também está incluído, com “The River”. Desde a juventude influenciado por Pete Seeger e Woody Guthrie, o roqueiro de Nova Jersey foi sempre um trovador blue-collar, preocupado em descrever a vida, os problemas e as desilusões da classe trabalhadora norte-americana. Aqui, a performance de Springsteen é registrada no documentário No Nukes, de 1980, filme sobre o célebre show realizado em setembro de 1979 no Madison Square Garden, organizado pela Musicians United Front for Safe Energy, grupo encabeçado por Jackson Browne, Graham Nash, Bonnie Raitt e John Hall. O concerto era parte de uma série de protestos anti-nucleares, como as manifestações ocorridas no Battery Park, em Nova Iorque, na mesma época. E foi nele que “the boss” cantou pela primeira vez nos palcos sua “The River”, uma música emblemática, gravada em julho ou agosto daquele ano.

A seguir, uma das maiores bandas de todos os tempos! Estamos falando do Clash. Mick Jones, Paul Simonon, Tory Chimes (e depois, Nicky “Topper” Headon) e o sensacional Joe Strummer, começaram a tocar em Londres, em 1976, e deram um novo status ao punk rock, com letras politizadas e incisivas contra o racismo, a brutalidade policial e o conservadorismo da Inglaterra de sua época. The Clash (1977), London Calling (1979), Sandinista! (1980) e Combat Rock (1982) são todos clássicos modernos. Que falta faz Strummer nos dias de hoje! E também o Clash! Aqui, eles cantam “Tommy Gun”.

E finalmente, para completar o elenco, o trio Stray Cats, com “Bring It Back Again”, retirada de Blast Off, de 1989. O grupo se juntou originalmente em Massapequa, Nova Iorque, em 1979, mas se destacou na cena musical de Long Island, no início da década de oitenta. Brian Setzer, Slim Jim Phantom e Lee Rocker conquistaram o público jovem com um estilo de rockabilly mais pesado, tocando alguns sucessos dos anos cinquenta e composições próprias. O visual chamativo, os topetes exagerados e as roupas estilizadas davam uma imagem rétro ao conjunto, mas a sonoridade era certamente mais agressiva, podendo-se encontrar nela certamente alguma influência do punk. O Stray Cats foi extremamente popular na Inglaterra, e em pouco tempo “Rock This Town” chegaria ao Top Ten naquele país. Já seu álbum Built for Speed venderia mais de dois milhões de cópias nos Estados Unidos. Após a separação da banda, Setzer fez breve carreira solo e em seguida, montou uma big band, a Brian Setzer Orchestra. Mas nunca conseguiu igualar o êxito do Stray Cats. E é com eles que Gonzalo encerra a lista musical. Para todo mundo dançar!

1. Sammy Walker, “Catcher in the Rye”.

2. Buffalo Springfield, “For What It’s Worth”.

3. The Animals, “House of the Rising Sun”.

4. Bruce Springsteen, “The River”.

5. The Clash, “Tommy Gun”.

6. Stray Cats, “Bring It Back Again”.

***

Luiz Bernardo Pericás é formado em História pela George Washington University, doutor em História Econômica pela USP e pós-doutor em Ciência Política pela FLACSO (México). Foi Visiting Scholar na Universidade do Texas. É autor, pela Boitempo, de Os Cangaceiros – Ensaio de interpretação histórica (2010) e do lançamento ficcional Cansaço, a longa estação (2012). Também publicou Che Guevara: a luta revolucionária na Bolívia (Xamã, 1997), Um andarilho das Américas (Elevação, 2000), Che Guevara and the Economic Debate in Cuba (Atropos, 2009) e Mystery Train (Brasiliense, 2007). Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às sextas-feiras.

1 comentário em O sapo Gonzalo em: Bem distante da folia

  1. Ricardo Leite brugni // 10/12/2013 às 12:23 am // Responder

    Profundo, engraçado, magistral, e pedagógico… de Ricardo Leite Brugni

    Curtir

1 Trackback / Pingback

  1. O sapo Gonzalo em: Outro carnaval | Blog da Boitempo

Deixe um comentário