Lançamento Boitempo: “A Bíblia segundo Beliel”, de Flávio Aguiar
Em tom de paródia, mas solidamente ancorada nas tradições bíblicas – que Flávio Aguiar, pesquisador e professor de literatura da USP (e colunista deste Blog), conhece como poucos –, A Bíblia segundo Beliel, lançamento da Boitempo Editorial, combina a leveza da chanchada com reflexões profundas e ousadas sobre temas como a religião, o fanatismo, a crença e a descrença, a opressão e a liberdade, a desigualdade e a justiça e, last but not least, o amor, como objetivo e possibilidade de redenção da humanidade.
O livro conta com belas ilustrações de Ricardo Bezerra.
O livro já está à venda em versão eletrônica (ebook) por apenas R$15 na Gato Sabido.
Confira abaixo o texto de orelha escrito por José Roberto Torero:
Em verdade, em verdade vos digo: todo escritor quer ser Deus.
E não é exagero. Pode comparar, fiel leitor: primeiro eles criam um ambiente, depois sopram vida aos personagens e por fim causam conflito entre eles. Iguaizinhos ao Todo Poderoso. Sem falar que há alguns que até se dizem imortais.
Sim, todo escritor quer ser um pequeno deus. Mas esse tal de Flávio Aguiar foi mais longe. Além de criar paisagens, personagens e conflitos, ele decidiu reescrever o próprio livro do Senhor.
Porém, se a Bíblia original foi escrita sob inspiração divina, esta foi feita sob transpiração humana. Vê-se que o autor domina profundamente o assunto, que estudou até os pontos e vírgulas das santas escrituras. Só conhecendo bem um livro se pode recontá-lo, invertê-lo, mostrar o seu avesso. E uma das graças desta Rebíblia (e ela é cheia de graças) é justamente contar as coisas a partir de um ângulo diferente, novo, inesperado.
Finalmente o leitor poderá ver personagens secundários contando a sua versão dos fatos. Por exemplo, verá a história do ponto de vista de Caim, o filho (ou neto) desprezado, a versão da pomba de Noé (e assim talvez pela primeira vez possamos saber como era o cheiro no porão da arca), os bastidores do incêndio de Sodoma e Gomorra e como foi a fuga do Egito capitaneada por Moisés (curiosamente o patriarca gosta de citar Camões, e eles realmente têm algo em comum, pois ambos atravessaram mares). Aliás, nesta Bíblia do B há uma turma
inesperada atravessando o deserto, formada pelo jovem Marx, Rosa Luxemburgo, Maiakovski, Luiz Carlos Prestes e outros canhotos ilustres. Um bando que, em vez de hinos religiosos, avança sobre as dunas cantando: “Avanti popolo, alla riscossa, bandiera rossa, bandiera rossa!”.
Falando em classes oprimidas, temos aqui o testemunho de um dos escravos de Jó (que jogavam caxangá), as memórias de um dos pobres mercadores que tiveram suas barracas derrubadas por Jesus e, ainda, os inesperados depoimentos de um diabo e de um anjo secundários, talvez (que Deus me perdoe) os dois personagens mais interessantes de todo o livro.
E por fim (ele não poderia estar em outro lugar) há um surpreendente Apocalipse, do qual não falarei nada para não estragar a surpresa, mas que tem a
ver com mulheres, muitas mulheres.
Irmão leitor, tens diante de ti um livro inspirado. Segure em sua mão, ou em suas orelhas, e vá em frente.
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