De bar em bar XVIII: Bar das Putas

Por Mouzar Benedito.

Mais uma história do tempo de estudante, quando bebíamos na entrada da Cidade Universitária. Nesta época, depois da aula sempre dávamos uma parada no Rei das Batidas, bebíamos até sobrar só o dinheiro da condução, pois o Crusp (Conjunto Residencial da USP) havia sido fechado pelo exército e pela polícia, depois do AI-5, e todos morávamos na região central de São Paulo.

Quando chegava a este ponto, geralmente era uma hora da manhã ou pouco mais. Íamos então para o ponto de ônibus e, chegando lá, sempre alguém propunha:

— E se a gente fosse a pé, conversando, e usasse o dinheiro do ônibus pra tomar uma pinga no meio do caminho?

A sugestão era aceita imediatamente.

Atravessávamos a ponte sobre o rio Pinheiros e subíamos pela avenida Eusébio Matoso, depois a Rebouças e depois a Consolação… Ah, como tínhamos assunto (e disposição). Depois de uma hora e meia de caminhada vagarosa pelas avenidas vazias na madrugada, chegávamos ao único bar que ficava aberto no caminho, antes de chegar ao centro.

A calçada em frente ao cemitério da Consolação era ocupada nesse horário por prostitutas à espera de clientes, que as pegavam de carro. Mas não era só em frente ao cemitério. Elas ficavam até um pouco acima, mais perto da avenida Paulista.

A repressão contra essas prostitutas era quase permanente. De vez em quando, aparecia um camburão prendendo as moças. Elas passavam um ou dois dias presas e eram soltas.

Quando aparecia o camburão na avenida, era uma baita correria. Muitas prostitutas entravam no único bar aberto, conhecido como Sujinho na esquina da Consolação com a rua Maceió, e fingiam fazer companhia aos homens que estavam lá dentro. Muitas vezes passaram por nossas acompanhantes.

A partir de uma época, quando alguém propunha que a gente usasse o dinheiro da passagem de ônibus para tomar “a última” no caminho entre a Cidade Universitária e o centro, o Zé Américo complementava:

— A gente para no Bar das Putas…

Pode ser que outras pessoas tenham tido a mesma ideia, também nomeando o bar assim, mas acredito que é essa a origem do nome Bar das Putas, lugar que até hoje tem carnes deliciosas e fartas, e uma placa com o nome aceito pelas gerações mais novas: “Sujinho”. 

***

Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996) e Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças. 

5 comentários em De bar em bar XVIII: Bar das Putas

  1. Estudante pobre que lê // 25/07/2012 às 1:30 pm // Responder

    Essas mulheres – as prostitutas – são muito mais dignas que as dondocas da classe média paulistana, e também mais dignas que as dondocas proprietárias de editoras, que esfolam o estudante jovem brasileiro ao praticar preços exorbitantes. E piores que essas digníssimas damas-putas da classe média paulistana, são os seus comensais: jornalistas sem objetividade, intelectuais indigentes, professores semi-letrados et caterva, todos auto-nominados “de esquerda”, mas que na verdade tem nojo do povo. A revolução virá, mas será levada a cabo pelos “de baixo”. Aguardem, ela já está sendo gestada, há tempos.

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  2. Helio Gomes // 28/07/2012 às 3:48 am // Responder

    Meu caro, as vezes me pergunto: será que a repressão de antes continua presente, com uma fase diferente, e mais perigosa?
    O mundo foi melhor, ou era ruim e ficou pior?
    Podíamos usar ônibus ou escolher caminhar pela madrugada, beber e escolher um bar, a chance de tudo terminar bem era enorme.
    Ousar estas oportunidades hoje, é escolher ser reprimido pelo ladrão ou pela forma armada do Estado (PM).

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  3. Mouzar Benedito // 30/07/2012 às 2:09 pm // Responder

    Não digo que o mundo era melhor, mas uma coisa é verdade: eu andava de madrugada por ruas vazias do centro de São Paulo, sem o menor medo. Quando aparecia alguem vindo no sentido contrário, eu pensava: “Oba, alguém pra conversar…”. Bem diferente de hoje, né?

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  4. Sanchez Godoi // 18/11/2016 às 3:55 pm // Responder

    No Final dos anos 1970 em 1979 com 19 anos até um ano antes de Casar-me em 2003 já com 41 anos eu fui um Notívago de Carteirinha saia todas as Quartas e Sextas pela Madrugada adora frequentar as Boates de Strip da rua Augusta ,a Casa Kilt na Nestor Pestana alguns Bares para fumar um Cigarro beber um Bom Whisky acompanhado de uma Cerveja e uma Porção de Salame com Batatinhas adorava O Tempo passou Casei-me tornei Pai e abandonei Definitivamente a Velha Vida . E nos dias de Hoje (Diferente dos Meus) andar pela Noite se transformou em uma Gincana de Sobrevivência O Povo Ficou muito Cruel muito Maldoso Extremamente Perverso um Homem honesto andando pelas noites é praticamente um Alvo Vivo para Marginais Pois nem o Direito a Portar uma Arma para se Defender de tantos Covardes como existem hoje (Como eu fazia em minha época ) o Cidadão tem mais Eu ainda Bem que meus filhos foram Orientados bem por minha Esposa São Evangélicos e avesso aos Costumes Meus e que de alguma forma até tenho saudade mais quando era em outros tempos como 40 e 30 anos atrás

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  5. carlos roberto santos araujo // 08/05/2018 às 6:57 pm // Responder

    Boas lembranças. Vivi tudo isto.

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