No fundo da gaveta
Por Roniwalter Jatobá.
Tempos atrás, uma exposição reuniu, no Rio de Janeiro, vários projetos de arquitetura engavetados nos últimos setenta anos. Entre os planos surpreendentes, que foram relegados ao fundo da gaveta, estava a ponte Rio – Niterói, que deveria ter sido construída na década de 1930, ou seja, anos antes da erguida a peso de ouro durante a ditadura militar.
Projetada pelo arquiteto francês Leon D’Escoffier, seria de uma sofisticação só: pistas de rolamento exclusivas para carros de passeio, carros pesados, metrô e até garagem. Sobraria espaço ainda para 946 apartamentos, 996 lojas e dois cine-teatros. O ousado projeto previa a instalação de 102 elevadores. Um deles, por sinal, desceria alguns metros abaixo das águas da Baía de Guanabara.
Também o símbolo máximo do Rio de Janeiro, o Cristo Redentor, poderia ter ficado diferente. Se dependesse só do autor, o arquiteto Heitor da Silva, ao invés de abraçando a cidade, como registram inúmeros cartões postais, teria a mão esquerda segurando um globo terrestre e a direita apoiando uma cruz sobre os ombros.
São Paulo também poderia ter realizado semelhante exposição. Acervos não faltam. Quem passa pela atual ponte das Bandeiras, sobre o rio Tietê, não imagina como aquilo poderia ter sido.
Num projeto dos anos 1920, toda a área estava destinada a interligar duas imensas praças. A primeira, fechando a Avenida Tiradentes, seria totalmente remodelada para ter 97 metros de largura. Já a segunda, ao lado direito do Tietê, abrigaria uma estação terminal de transportes integrados (linhas férreas, rodoviárias, fluviais e também aéreas, devido à construção, no Campo de Marte, do principal aeroporto paulistano).
Um projeto que deveria marcar presença na mostra paulistana seria o do metrô da Light, de 1929. Naquela época, engenheiros desenharam como seria um transporte moderno. Linhas subterrâneas passariam por debaixo do então largo da Sé, seguiriam em faixas intermediárias, dividindo com automóveis, sob o viaduto do Chá, rasgando as entranhas da cidade.
Outro plano que iria abrilhantar a exposição paulistana seria o de um engenheiro canadense que, em 1940, imaginou resolver o problema do transporte urbano entre a Capital e a Baixada Santista.
Seu projeto envolvia a área compreendida pelos rios paulistanos num eficiente transporte fluvial. Era mais ou menos assim: barcos de passageiros fariam viagens programadas a partir das proximidades do bairro da Penha,via Tietê, e depois seguiriam pelo rio Pinheiros e reservatório Billings afora. Vencendo estrategicamente a descida na Serra do Mar, chegariam a Cubatão e, depois, à beira do Atlântico.
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Roniwalter Jatobá nasceu em Campanário, Minas Gerais, em 1949. Vive em São Paulo desde 1970. Entre outros livros, publicou Sabor de química (Prêmio Escrita de Literatura 1976); Crônicas da vida operária (finalista do Prêmio Casa das Américas 1978); O pavão misterioso (finalista do Prêmio Jabuti 2000);Paragens (edidado pela Boitempo, finalista do Prêmio Jabuti 2005); O jovem Che Guevara (2004), O jovem JK (2005), O jovem Fidel Castro (2008) e Contos Antológicos (2009). Colabora para o Blog da Boitempo mensalmente, às sextas-feiras.
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