VERSÃO REVISADA

Sociedade do trabalho abstrato

Obra Os sentidos do trabalho, de Ricardo Antunes, ganha décima impressão revisada e ampliada, além de capa nova capa 

 

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Em Os sentidos do trabalho, Ricardo Antunes demonstra que a sociedade do trabalho abstrato possibilitou, por meio da constituição de uma massa de trabalhadores expulsos do processo produtivo, a aparência da sociedade fundada no descentramento da categoria trabalho e na perda de centralidade do ato laborativo no mundo contemporâneo.

O autor também alerta, porém, para o fato de que o entendimento das mutações em curso no mundo operário nos obriga a ir além das aparências. Ao fazer isso, lembra que o sentido dado ao trabalho pelo capital é completamente diverso do sentido atribuído pela humanidade.

Na décima reimpressão, que sairá este ano em versão ampliada e revisada, foram incluídos três novos apêndices que dão atualidade às teses originais do livro. “O primeiro, sintetizando algumas das teses centrais sobre o presente do trabalho, esboçando também uma hipótese sobre o seu futuro. O segundo trata da crise capitalista atual e o conseqüente processo de destruição e desmoronamento do trabalho, abrindo caminho para o início de uma nova fase de precarização estrutural do trabalho em escala global, se essa lógica não for obstada e confrontada. O terceiro, problematiza algumas formulações que, a partir da noção de trabalho imaterial, procuram desconstruir a teoria do valor-trabalho e o quarto explora elementos da economia política presente das lutas sociais, abordando em particular a decisiva contribuição da teoria da mais-valia elaborada por Marx”, explica Ricardo Antunes.

Além das diversas impressões do livro no Brasil, Os Sentidos do Trabalho vem encontrando acolhida positiva também no exterior. Há uma edição em espanhol (Los Sentidos del Trabajo, Herramienta Ediciones e TEL/Taller de Estúdios Laborales, Argentina, 2005) e outra na Itália, com o título Il Lavoro in Trappola: La Classe Che Vive di Lavoro (Jaca Book, 2006), e ainda uma versão em tradução para próxima edição franco-suiça pela Page2

Confira a nota de Ricardos Antunes para a nova impressão no Brasil:                                                      

Os Sentidos do Trabalho ganham uma nova reimpressão, a 10a., publicada dez anos depois de sua primeira edição, em 1999. Revista, ampliada e atualizada pela primeira vez, suas teses centrais ganharam ainda mais força: há uma nova morfologia do trabalho que repõe os sentidos e significados essenciais do trabalho, mostrando que o trabalho é, nestes inícios do século XXI, uma questão (ainda) decisivamente vital.

Mais do que nunca, bilhões de homens e mulheres dependem exclusivamente do seu trabalho para sobreviver e encontram, cada vez mais, situações instáveis, precárias quando não nexistentes de trabalho. Ou seja, enquanto se amplia o contingente de trabalhadores e trabalhadoras no mundo, há uma constrição monumental dos empregos, corroídos em seus direitos e erodido em suas conquistas.

Maquinaria perversa e engenharia satânica que vêm gerando um contingente monumental de desempregados que assim o são pela própria lógica destrutiva do capital – que, ao mesmo tempo em que expulsa centenas de milhões de homens e mulheres do mundo produtivo gerador do valor em seus trabalhos estáveis e formalizados, recria, nos mais distantes e longínquos espaços, novas modalidades informalizadas e precarizadas de geração do mais-valor – depauperando ainda mais, pela expansão da força sobrante de trabalho que não pára de crescer, os níveis de remuneração daqueles que se mantém trabalhando.

Mas, contra a simplória tese da finitude do trabalho, esta se mostra, em sua forma contraditória de ser, um espaço de sociabilidade, mesmo quando é marcado por traços dominantes de estranhamento e alienação – o que se constata pela desumanização presente nos contingentes de desempregados que, especialmente mas não só no Sul do mundo, nunca vivenciaram sequer coágulos de welfare state.

Contrariamente, portanto, à unilateralização presente tanto nas teses que desconstroem o trabalho, quanto naquelas que fazem seu culto acrítico, sabemos que, na longa história da atividade humana, em sua incessante luta pela sobrevivência e felicidade social (como estava presente já na reivindicação do Cartismo, na Inglaterra do século XIX, o trabalho é, em si e por si, uma atividade vital. Mas, ainda no contraponto, se a vida humana se resumisse exclusivamente ao trabalho – como muitas vezes ocorre com o mundo capitalista e sua sociedade do trabalho abstrato – ela seria também expressão de um mundo penoso, alienante, aprisionado e unilateralizado.

A constatação de Os Sentidos do Trabalho é clara: se, por um lado, necessitamos do trabalho humano e de seu potencial emancipador, devemos também recusar o trabalho que explora, aliena e infelicita o ser social. Isto porque, como está longamente desenvolvido nas páginas deste livro, o sentido do trabalho que estrutura o capital acaba sendo desestruturante para a humanidade; na contrapartida, o trabalho que tem sentido estruturante para a humanidade, é potencialmente desestruturante para o capital.

E essa contraditória processualidade, presente no processo de trabalho, que emancipa e aliena, humaniza e sujeita, libera e escraviza, converte o estudo do trabalho humano numa questão crucial de nosso mundo e de nossas vidas, neste conturbado século XXI, cujo desafio maior é dar sentido autoconstituinte ao trabalho humano e tornar a nossa vida fora do trabalho também  dotada de sentido.

RICARDO ANTUNES

                                                                                                                            Outubro de 2009 

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